terça-feira, 24 de julho de 2012

A Europa assusta de novo
O Estado de S.Paulo - Editorial
O medo espalhou-se de novo pelos mercados de todo o mundo, abalados pelos sinais de piora da quarta maior economia da zona do euro, a Espanha, e pelo risco crescente de um abalo mais grave da Itália, a terceira maior potência da união monetária. O socorro ao governo e aos bancos espanhóis poderá custar entre 400 bilhões e 500 bilhões em três anos, segundo estimativa do banco Barclay's. Se o governo italiano pedir ajuda, a conta do auxílio aos dois países poderá chegar a 1,3 trilhão, de acordo com a mesma fonte.
Não será pedido esse tipo de ajuda, insistem as autoridades dos dois países, mas a especulação cresce nos mercados, alimentada tanto pelas más notícias da Espanha quanto por avaliações de especialistas famosos, como Kenneth Rogoff, professor de Harvard e ex-economista-chefe do FMI. Segundo ele, dificilmente o governo espanhol deixará de pedir um resgate total, mesmo contra a sua vontade.
Se essa previsão se confirmar, a União Europeia, o FMI e o BCE terão de mobilizar recursos muito maiores que aqueles necessários, até agora, para o resgate da Grécia, da Irlanda e de Portugal. Além do mais, os mercados estão de novo em alerta em relação à Grécia. A crise agravou-se no país, o desemprego chegou à faixa de 22% e o governo, comprometido com um duríssimo plano de ajuste, continua apresentando resultados muito modestos. Nem é preciso pensar num desastre na Itália para compor um quadro assustador. Um agravamento da crise europeia custará muito a dezenas de países, por seus efeitos financeiros e comerciais. O Brasil será afetado tanto pela piora das condições de financiamento quanto pela deterioração das condições de comércio.
O governo espanhol conseguiu a promessa de 100 bilhões dos fundos europeus de resgate para ajuda aos bancos do país. Tentou isolar o Tesouro nacional da operação de socorro ao setor bancário, para evitar a supervisão dos funcionários da troica - a União Europeia, o BCE e o FMI. Na semana passada, as autoridades espanholas anunciaram um ajuste adicional de 65 bilhões nas contas públicas, em mais um lance para comprovar seu esforço de austeridade.
A tensão no mercado voltou a aumentar, no entanto, depois de duas péssimas notícias: 1) a recessão já durou três trimestres e deverá prolongar-se: 2) é grave a situação dos governos regionais e seis deles poderão pedir ajuda financeira. A cada dia o governo central parece mais próximo, portanto, de ter de negociar um programa completo de resgate.
Não se pode prever com segurança se isso ocorrerá, mas a especulação nos mercados tende a continuar e também isso limitará as escolhas das autoridades. Ontem, o Tesouro espanhol chegou a pagar 7,56% para rolar seus títulos. Taxas acima de 7% ao ano têm sido consideradas insustentáveis por muitos analistas. De acordo com esses profissionais, governos incapazes de conseguir financiamento a custos abaixo desse nível serão forçados, em pouco tempo, a pedir socorro.
Se a Espanha chegar a esse ponto, o próximo grande alvo da especulação será a Itália. O governo italiano já tem sido forçado a pagar juros elevados, ocasionalmente, para refinanciar a dívida pública. Mas tem conseguido vender os papéis oferecidos ao mercado, às vezes até com folga. Mas a pressão especulativa retorna, de tempos em tempos, e agências de classificação de risco já cortaram mais de uma vez a nota da dívida soberana da Itália. Se a Espanha cair, a economia italiana ficará imediatamente exposta ao efeito dominó.
O agravamento da situação espanhola comprova, mais uma vez, a insuficiência das políticas anticrise adotadas na Europa nos últimos anos. Grande parte do esforço de ajuste será perdido, se faltar um crescimento mínimo para reduzir o desemprego e alimentar as contas públicas.
Não há como evitar a correção dos enormes desajustes fiscais acumulados na maior parte dos países, mas é igualmente necessário criar algum dinamismo nas economias. Dificilmente algum país poderá seguir sozinho um rimo diferente daquele adotado até agora - e apontado pelas autoridades alemãs como o único possível. É necessária uma decisão conjunta. O desafio é muito mais político do que econômico.

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