sexta-feira, 31 de maio de 2013

ELIÂNICAS

Terrorismos eleitorais
Eliane Cantanhêde - FSP
BRASÍLIA - A semana do feriado está sendo de lascar para o governo, com pibinho, mais uma alta de juros e derrota da articulação política no Congresso. Nada, porém, pior que a lambança do Bolsa Família.
Na primeira versão, a Caixa mudou o calendário de liberações depois e por causa do corre-corre, dos saques e depredações. Confrontada com reportagem da Folha, a própria Caixa teve de voltar atrás e reconhecer que, primeiro, mudou o calendário e só depois (e por causa disso?) houve corre-corre, saques e depredações. Caso típico em que a ordem altera, sim, o produto.
O primeiro erro foi a mudança estapafúrdia do calendário. O segundo foi a dimensão do tumulto que Dilma Rousseff classificou de "desumano". O terceiro foi a mentira, a inversão do que ocorreu de fato. O quarto foi governo e PT tirando casquinha do episódio "desumano" para fazer política e acusar a oposição.
Ao dizer que houve "terrorismo eleitoral", o presidente nacional do PT, Rui Falcão, remeteu sem querer a um terrorismo eleitoral real, em 2006, quando a campanha de Lula difundiu a versão de que os tucanos, com quem disputavam o segundo turno, privatizariam a Petrobras.
A versão colou e até gente bem informada que oscilava entre uma e outra candidatura desceu do muro para Lula, diante da certeza de que o PSDB venderia a empresa-símbolo do Brasil --e a preços módicos.
Agora, se os repórteres Aguirre Talento e Daniel Carvalho não tivessem descoberto e publicado na Folha que a origem do tumulto tinha sido na própria Caixa, a versão de que havia uma conspiração oposicionista teria certamente se imposto, antes do resultado da PF. Até porque o PT, mais do que o governo, é excelente em massificar suas versões.
Ou seja: se não fossem repórteres atentos e um jornal independente, aí é que haveria "terrorismo eleitoral" de verdade. Deve ser por isso que se fala tanto em "controle social" e "regulamentação" da mídia.
Depois do ‘entrace’ na saída da Fonte Nova, prefeitura do Rio enriquece o inglês de Copa do Mundo com a invenção do ‘aiport’
Augusto Nunes - VEJA
Sempre que inaugura um estádio que não está pronto, Dilma Rousseff fica grávida de patriotismo mequetrefe ─ e recita o que o mestre lhe ensinou: só duvidam do governo (e seus comparsas) os eternos pessimistas, os céticos profissionais, os que torcem o tempo todo contra o progresso da nação reinventada pela seita lulopetista. Foi assim em 21 de dezembro de 2012, quando a presidente baixou em Belo Horizonte para dar por concluído o Mineirão ainda em obras.
“Nós, do Brasil, estamos dando uma demonstração para o mundo”, caprichou no dilmês de boleiro. “De que nós somos bons dentro do campo, mas somos bons fora do campo também”. Dilma tem tanta familiaridade com o que ocorre dentro do campo quanto Lula com o uso do plural. Para a Primeira Torcedora, trivela é o ministro da Pesca com erro de revisão. Se sabe o que anda acontecendo fora do campo, logo vai descobrir que ninguém perde tempo torcendo contra os organizadores da Copa. Time que só faz gol contra nem precisa de inimigos.
Confira o texto de Júlia Rodrigues na seção História em Imagens. Depois do “entrace” na saída da Fonte Nova, a prefeitura do Rio enriqueceu o inglês de Copa do Mundo com a invenção do “aiport”. Os turistas vão sofrer para encontrar o Maracanã. Se chegarem lá, podem colidir com portões fechados: no fim da tarde desta quinta-feira, a Justiça atendeu ao pedido do Ministério Público estadual e suspendeu a realização do jogo entre Brasil e Inglaterra, marcado para domingo.
Antes que o dia terminasse, previsivelmente, governantes e cartolas conseguiram contornar a interdição. Mas a pedra no caminho continua do mesmo tamanho. A decisão judicial amparou-se nas evidências de que o Maracanã não está pronto para acomodar sem riscos as multidões com que sonham os vigaristas gananciosas. Para esse bando, a Copa de 2014 é um grande negócio.

 

PIB, um fracasso anunciado
O Estado de S.Paulo
Mais que um tropeço, o fraco desempenho da economia brasileira no primeiro trimestre, com expansão de 0,6% em relação aos três meses anteriores, é um péssimo prenúncio. Se o ritmo for mantido, o Produto Interno Bruto (PIB) aumentará apenas 2,4% neste ano, menos que nos primeiros 12 meses de governo da presidente Dilma Rousseff.
A cúpula federal havia decidido, segundo informou o Estado na terça-feira, batalhar por um crescimento de pelo menos 2,7%, igual ao de 2011 - algo parecido com uma questão de honra. Pelos números divulgados na quarta-feira, a luta por esse objetivo será mais dura do que devem ter imaginado, poucos dias atrás, os formuladores da política econômica. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, referiu-se ao ritmo atual de atividade como equivalente a 2,2% ao ano, ao comentar os novos números das contas nacionais.
Pelo menos o investimento cresceu vigorosamente e isso aponta maior capacidade de produção nos próximos tempos, podem argumentar as autoridades. O volume de recursos destinado à compra de máquinas e equipamentos, à construção civil e a obras de infraestrutura foi 4,6% maior que o do trimestre final de 2012. Isso é consequência, segundo o ministro da Fazenda, dos estímulos proporcionados pela política oficial. Mas o aumento indicado pelos novos números nem sequer compensou a forte retração do ano anterior.
O total investido ficou 3% acima do contabilizado um ano antes, mas a comparação entre períodos de 12 meses ainda acusa uma redução de 2,8%. Além disso, o País investiu no primeiro trimestre apenas 18,4% do PIB. Nos primeiros três meses do ano passado essa taxa havia ficado em 18,7%. Qualquer das duas taxas é muito inferior àquela fixada pelo governo como objetivo para os próximos anos, algo em torno de 24%.
Vários países emergentes, incluídos alguns latino-americanos, investem a cada ano pelo menos o equivalente a 25% do PIB. Na Ásia são encontradas taxas acima de 30%. Além disso, o Brasil tornou-se mais dependente do capital externo para investir, porque a poupança interna caiu de 15,7% do PIB no primeiro trimestre de 2012 para 14,1% um ano depois. Todos conhecem a explicação: o governo continua gastando em custeio mais do que deve e dificultando a formação da poupança nacional.
O ministro procurou também enfeitar os números muito ruins do amplo setor industrial. A queda de 0,3% em relação ao trimestre final de 2012, afirmou, resultou basicamente do recuo de 2,1% da mineração. A indústria de transformação, acrescentou, produziu mais que nos três meses anteriores. As duas afirmações são verdadeiras, mas o trabalho de maquiagem foi inútil. De fato, o produto da indústria de transformação cresceu, mas apenas 0,3%, e ainda foi 1,4% inferior ao de um ano antes.
Um dia antes a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) havia divulgado suas novas projeções para o ano: o crescimento do PIB foi revisto de 3% para 2,5%; o da indústria de transformação, de 2,4% para 1,9%; o da construção civil, de 3,3% para 1,9%; o dos serviços, de 3% para 2,7%; e o da agropecuária, de 3,4% para 3,7%.
A fraqueza da economia brasileira é visível de longe. A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), formada por economias desenvolvidas e algumas emergentes com histórico de boas políticas, cortou para 2,9% em 2013 e 3,5% em 2014 o crescimento estimado para o Brasil. As projeções feitas no fim de 2012 eram de 4% e 4,1%.
Não há novos estímulos na agenda, disse o ministro Mantega. É uma boa notícia, diante do fracasso previsível das medidas já adotadas, um conjunto de incentivos improvisados. Beneficiaram alguns setores, pouco ajudaram o conjunto da produção e agravaram a situação das contas públicas. Sem mais estímulos desse tipo, o governo terá uma oportunidade para agir mais seriamente, controlando seus gastos, contribuindo para o combate à inflação e cuidando com mais eficiência dos problemas de competitividade. Mas é preciso ser muito otimista para apostar nessa mudança.

DÓRICAS

Arquivo morto
Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
Assim como anunciou no início do mandato que desistia de patrocinar reformas pendentes, a presidente Dilma Rousseff tende agora a abrir mão de enfrentar temas complexos no Congresso, a respeito dos quais existam divergências difíceis de serem contornadas pelo governo.
Nessa gaveta já dorme em berço esplêndido o novo marco regulatório da mídia. Devido a interesses divergentes dos meios de comunicação com os quais o Planalto não quer entrar em conflito e à insistência de setores do PT em aproveitar o ensejo para tentar instituir o tal do controle social sobre sagrado direito dos cidadãos ao livre acesso a informações.
Na direção do mesmo escaninho do esquecimento - ainda que temporário - caminham o código de mineração, a proposta de mudanças na cobrança do ICMS e quaisquer outras que representem conflitos de interesses a serem acomodados e, no limite, arbitrados pelo Palácio do Planalto.
Algo que poderia ser visto como tática de sobrevivência em governo de maioria parlamentar apertada, no caso de uma base partidária que em tese domina mais de 80% do Congresso o recuo no enfrentamento de temas importantes traz outras informações: revela incapacidade de construir consensos em torno de assuntos de interesse nacional, impossibilidade de conciliar discordâncias e inaptidão para arbitrar soluções.
Governos, notadamente aqueles com altos índices de aprovação popular, preferem navegar a bordo da segurança da convergência por gravidade. Mas nem sempre isso é possível.
A unanimidade é um conforto, quanto a isso estamos de acordo, não obstante o conhecido fundamento de Nelson Rodrigues a respeito da concordância geral e irrestrita.
Não deixa, entretanto, de render prejuízos: denota tibieza de propósitos, carência de convicções e, sobretudo, atravanca o progresso.
Conta e risco. Se confirmada a candidatura presidencial do senador Aécio Neves, em 2014 será a primeira vez em que o governador Geraldo Alckmin concorrerá (à reeleição) sem a presença de um candidato paulista na disputa para a Presidência. Fator importante - senão determinante - para "puxar" votos na eleição estadual.
Pedra no caminho. A recente explicitação das divergências entre o governador de São Paulo e Afif Domingos - dublê de vice do PSDB e ministro do PT - tem o aval, para não dizer o incentivo, do ex-prefeito Gilberto Kassab.
O pivô é um programa de desburocratização que Afif elaborou para o Estado e fracassou por falta de interesse do governador. O mesmo projeto foi apresentado na semana passada ao prefeito petista Fernando Haddad, que se disporia a tocar o plano.
A ideia é contrapor a ação de Haddad à omissão de Alckmin. Onde entra Kassab, comandante do PSD, partido de Afif? Na condição de sócio-atleta do clube dos inimigos do governador, empenhados em criar dificuldades à sua reeleição.
Direto ao ponto. Não há, como se sabe, consenso no Supremo Tribunal Federal sobre o cabimento dos embargos infringentes que visam a tentar alterar as penas dos condenados que receberam ao menos quatro votos pela absolvição.
Entre os que concordam que sejam aceitos, argumenta-se que não haverá na prática uma reabertura do julgamento, mas apenas a discussão sobre pontos específicos do dissenso. Ademais, não alterariam as condenações, mas o regime de cumprimento das penas.
O ambiente exige respeito
Carlos Alberto Sardenberg - O Globo
“Confiança, o senhor sabe, não se tira das coisas feitas ou perfeitas: ela rodeia, é o quente da pessoa” (Guimarães Rosa).
Quando estimam o crescimento da economia, os economistas estão, claro, imaginando o futuro. Mas com boa matemática. Vem tudo encadeado. Uma área plantada de tantos hectares, mais um determinado consumo de sementes, deve levar a uma safra de tantas toneladas de grãos. Acrescente-se aí um ganho de produtividade pelo uso de novos equipamentos já encomendados e uma previsão de bons preços internacionais, o que anima o produtor a plantar, e a safra pode acrescentar tantos pontos ao Produto Interno Bruto do próximo ano.
Do mesmo modo, com carros. Estímulos do governo, juros baixos, renda da população, capacidade instalada da indústria mais ganhos esperados com novas fábricas e máquinas — soma-se isso tudo, dá uma determinada produção e consumo de automóveis, o que equivale a tantos pontos do PIB.
Ou a Copa. Observa-se a lista de obras — incluindo estádios, aeroportos, transportes em geral, novos hotéis, telecomunicações etc. —, coloca-se no calendário e, pronto, mais um pedaço de PIB. Sabe-se que um avanço determinado na construção civil deve dar um ganho de tanto no PIB.
Mas por que, então, os erros são tão frequentes, para menos e para mais? Primeiro, porque são milhares de hipóteses a serem formuladas, um exercício passível de falhas mesmo com os melhores e maiores computadores.
Segundo, porque nem sempre é possível recolher todas as informações necessárias. E terceiro porque, bem, porque estamos lidando com pessoas.
Ok, os juros estão baratos, os preços estão melhorando, vai se colocar mais etanol na gasolina — de modo que está na hora de investir na reforma do canavial e da usina. Será mesmo? — vacila o agricultor lá na sua subjetividade. E se o governo, tocado por pessoas, como se sabe, mudar tudo de novo na política do álcool/açúcar?
O resultado é menos investimento. Segue-se toda a sequência, e dá menos PIB.
Considerem a Copa. Os investimentos em curso já são menores do que os estimados anteriormente porque muita coisa atrasou e muitas outras foram deixadas de lado.
Ou as telecomunicações. Para atender às necessidades da Copa — desde a transmissão dos jogos em HD, com dezenas de câmeras, até os torcedores nos estádios mandando milhares de fotos — é preciso instalar novos equipamentos, entre os quais mais de dez mil torres para celulares.
Mas, em muitas cidades do país, muita gente ainda acha que essas torres podem dar câncer. Vai daí, menos PIB.
Como se pode perceber, é difícil medir, mas o ambiente, o jeitão da coisa, o grau de confiança das pessoas, onde quer que estejam, determinam o crescimento de um país. Daí as falhas de previsão, que podem ser para mais ou para menos.
Para tomar um exemplo clássico: olhando pela matemática, pelos fundamentos econômicos e pela capacidade de gestão do governo brasileiro, a ideia de construir Brasília, tirar uma cidade do nada e colocá-la no meio do nada, parecia um completo delírio. Mas saiu, sabe-se lá como.
Sabe-se, porém, que a força motriz foi o clima de extrema confiança dos anos JK. Pode-se até dizer, hoje, que era uma confiança desmedida, fora de propósito. Mas foi assim que funcionou.
Hoje, parece ser o contrário. As pessoas do governo Dilma estão inconformadas. Com tanto estímulo ao consumo e ao investimento, presenteados pelo governo, como é que o país não cresce?
A presidente já chegou a dizer que não estaria satisfeita com crescimento menor que 4,5% anual. Hoje, tenta salvar dois e alguma coisa — e não está fácil.
É o ambiente, o jeitão da coisa, a falta de confiança. Por que o empresário da construção civil não constrói mais prédios se os juros estão baixos e há estímulo ao comprador? Ele até quer fazer mais, mas é tomado por uma ponta de dúvida: essas regras, essas circunstâncias valem até quando?
O investidor privado que precisa construir um porto gostou das novas regras do setor, que favorecem isso. Mas também fica com uma ponta de dúvida: as novas regras prejudicaram o investidor privado que já havia investido em portos públicos. Podem mudar de novo, não é mesmo? E reparem que estamos falando de investimentos de 30 anos.
E o dólar? O governo segurou, puxou até R$ 2,10, deixou cair, está subindo de novo. E os juros? Entraram na propaganda como em queda, mas estão subindo de novo.
Os economistas ressaltam sempre a importância de um ambiente regulatório consistente, claro e seguro. É tudo que não temos. Aí fica muito na dependência de decisões pessoais. E aí...
Carlos Alberto Sardenberg é jornalista.

ELIÂNICAS

Brasil, uma onda
Eliane Cantanhêde - FSP
BRASÍLIA - Este filme a gente já viu. No começo do ano, o ministro Guido Mantega estufa o peito e promete um pibão. No meio do ano, o mesmo Mantega diz que não é bem assim e revisa para baixo. No fim do ano, o mesmíssimo Mantega se conforma com um pibinho de dar dó.
O PIB deste ano seria de 4,5%, caiu para 3,5% e a nova previsão será abaixo disso, depois do banho de água fria de ontem, quando foi anunciado um crescimento de apenas 0,6% no primeiro trimestre em relação ao último trimestre de 2012. Planalto e mercado esperavam 0,9%.
Quem está segurando o crescimento positivo é justamente a agricultura, que aumentou 9,7% e compensou mais uma queda da indústria e o recuo no ritmo do consumo das famílias, muito provavelmente por causa da inflação. Preços mais altos, menos compras, certo?
É assim que a tão badalada economia brasileira vai perdendo o encanto, com PIB baixo, inflação no teto, juros em alta (apesar de toda a propaganda) e, agora, o dólar disparando, a balança comercial dando uma má notícia atrás da outra e nada de respostas na área fiscal.
Aquela onda de Brasil grande parece ir morrendo na praia, enquanto a imprensa internacional vê o país sob Dilma Rousseff como imprevisível, sem rumo, movido com um viés intervencionista. E continua sem avançar nas reformas estruturais.
Pode-se acrescentar a isso uma novidade de 2013: a toda hora o Planalto bate de frente com o Congresso, onde tem uma base aliada gigantesca, mas, pelo visto, nada fiel.
Aprovar a MP dos Portos já foi um inferno. Agora, o jeito foi incluir um "caco" na MP da Cesta Básica para cumprir a promessa de baixar a conta de luz. Uma promessa, lembre-se, feita em rede nacional de TV, com requinte de campanha eleitoral.
No caso do PIB, a culpa é do Mantega. No das MPs, da Ideli. No do Bolsa Família, da Caixa. Mas todos eles têm chefe. Ou seria "chefa"?

JOÃO BOSCO LEAL

Reatamento  
Como em uma rodovia, mesmo que repetindo um trecho já percorrido outras vezes, a viagem da vida é diferente cada dia, com retas, curvas mais ou menos acentuadas, subidas, descidas e paisagens distintas.
Cansados, distraídos ou olhando para algo do lado, não percebemos a chegada de uma curva e... Logo aparecem os comentários de alguém informando que se..., ou se..., isso não teria ocorrido, pelo menos não com tanta gravidade, o mesmo fim.
Acidentes podem ou não ocorrer na vida dos que vivem e, mesmo aqueles que se privam de tudo e de todos, tentando não correr qualquer risco estão, a qualquer momento, sujeitos a uma ocorrência inesperada seja onde estiverem.
Independentemente da situação, local, clima, velocidade ou meio de transporte, acidentes podem ocorrer. O que muda, dependendo dessas e de outras variáveis, é a gravidade do mesmo.
Assim é a vida. Passamos todos os dias pelo amanhecer, o entardecer e a nova noite, mas eles nunca foram e jamais serão iguais.
Em um deles podemos conhecer alguém que se tornará nosso maior parceiro, amigo, a maior paixão ou verdadeiro amor, com quem viveremos por muito tempo ou até a morte, mas em outro poderemos conhecer nosso maior adversário, rival, inimigo.
Entretanto, como jamais saberemos o que nos aguarda no futuro, não há como escolher o dia que não sairemos de casa para não conhecermos alguém pouco interessante, ou para não corrermos algum risco. Assim procedendo, poderíamos deixar de conhecer coisas ou alguém agradabilíssimo.
E esse alguém poderá ser o amigo que precisávamos ou se tornar o amor com o qual sempre sonhamos. Mesmo assim, por medo, alguns se recolhem e aí realmente diminuem bastante suas chances, inclusive de encontrar a pessoa com quem sonhava.
Provavelmente esse talvez seja o motivo pelo qual tenho ouvido pessoas dizerem que já erraram muito, sofreram, que estão cansadas e que dificilmente farão novas tentativas. Não é o que penso sobre os relacionamentos afetivos que por algum motivo foram rompidos.
Com eles sempre aprendemos algo, o que certamente facilitará um próximo que poderá ocorrer, ou melhorar muito o mesmo, se reatado for.
Surgem momentos, mesmo aqueles de superação dolorosas, em que precisaremos nos despedir de algo, algum lugar ou alguém que já não se encaixam mais em nossa vida, ou ficaremos, pelo resto da vida, nos lamentando pelo fato de não termos sido capazes de nos levantar e seguir bem frente, ou voltar a um relacionamento do qual jamais devíamos ter nos afastado.
Não importa quando ou onde, o fato é que durante a vida, só não acertam ou erram muito, os que não tentam. Isso, porém, não significa que devemos tentar de qualquer modo, com qualquer um, inconsequentemente, pois sabemos que, por motivos diversos, com muitos a possibilidade de dar errado é maior que a de dar certo. Além disso, todos nós possuímos famílias, filhos, netos, amigos, e nossa moral e ética precisa, sempre, ser levada em consideração.
Por outro lado, todos podem cometer erros, tomar atitudes impensadas, inconsequentes, de resultados normalmente desastrados, mas isso não deve impedir novas tentativas, até mesmo de retorno com aquele de quem nos separamos.
Tentar um reatamento quando o passado já foi muito bom, aumenta exponencialmente a chance de um futuro maravilhoso.
João Bosco Leal www.joaoboscoleal.com.br
* Jornalista e empresário
“Ya mi cuerpo aprendióel dolor de tu ausenciay a pesar de los golpesquiere seguir viviendo.
No te alejes amorencuéntrame en el sueñodefiende tu memoriami memoria de tique no quiero extraviar.”
Claribel Alegría
Ya mi cuerpo aprendió
el dolor de tu ausencia
y a pesar de los golpes
quiere seguir viviendo.

No te alejes
amor
encuéntrame en el sueño
defiende tu memoria
mi memoria de ti
que no quiero extraviar.

Claribel Alegría
Política do filho único força mães a cometerem brutalidades na China
Ma Jian * - NYT
Zhang Yimou, o famoso diretor de cinema e arranjador da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Verão de 2008 em Pequim, foi acusado na semana passada de ser o mais recente infrator da política do filho único da China. O Diário do Povo, o alto-falante do Partido Comunista, alegou que Zhang tem sete filhos com quatro mulheres diferentes.
A notícia despertou um irritado debate online, com internautas condenando a aplicação desigual da lei 1.979, que estipula que cada casal pode ter apenas um filho (ou dois no caso das minorias étnicas e de casais rurais cujo primeiro filho seja uma menina).
A verdade é que, para os ricos, a lei é como um tigre de papel, facilmente contornada mediante o pagamento de uma "taxa de compensação social" – uma multa de 3 a 10 vezes o rendimento anual do lar, definida pelo escritório de planejamento familiar de cada província – ou viajando para Hong Kong, Cingapura ou até para os EUA para dar à luz.
Para os pobres, no entanto, a política é um tigre de carne e osso, com garras e presas. No campo, onde a necessidade de mãos extras para ajudar nas plantações e o desejo patriarcal profundamente enraizado de ter um herdeiro do sexo masculino criaram uma forte resistência às medidas de controle populacional, o tigre tem sido implacável.
Oficiais de planejamento familiar dos vilarejos acompanham vigilantemente o ciclo menstrual e os exames ginecológicos de todas as mulheres em idade de ter filhos em sua área. Se uma mulher fica grávida sem permissão e não for capaz de pagar a multa exorbitante por violar a política, ela corre o risco de ser submetida a um aborto forçado.
De acordo com dados do Ministério da Saúde chinês divulgados em março, 336 milhões de abortos e 222 milhões de esterilizações foram realizadas desde 1971. (Embora a política do filho único tenha sido introduzida em 1979, outras políticas de planejamento familiar bem menos rigorosas já existiam antes dela.)
Estes números são fáceis de citar, mas eles não conseguem transmitir a magnitude do horror enfrentado pelas mulheres rurais na China. Durante uma longa viagem através do interior do sudoeste da China em 2009, tive a oportunidade de conhecer alguns dos rostos por trás desses números.

Retratos

Em barcas precárias ancoradas nas águas remotas de Hubei e Guangxi, conheci centenas de "fugitivos do planejamento familiar" – casais que tiveram de fugir de seus vilarejos para dar à luz ilegalmente a um segundo ou terceiro filho nas províncias vizinhas.
Quase todas as mulheres grávidas com quem conversei tinham passado por um aborto obrigatório. Uma mulher me contou que, quando ela estava grávida de oito meses de um segundo filho ilegal e não conseguiu pagar a multa de US$ 3.200, os oficiais de planejamento familiar a arrastaram para uma clínica local, amarraram-na a uma mesa cirúrgica e injetaram uma droga letal em seu abdômen.
Durante dois dias ela se contorceu sobre a mesa, com as mãos e os pés ainda amarrados com corda, esperando seu corpo expulsar o bebê assassinado. Na etapa final do trabalho de parto, um médico arrancou o feto morto pelo pé, jogando-o em seguida numa lata de lixo. Ela não tinha dinheiro para pegar um táxi. Ela teve que ir mancando para casa, com sangue escorrendo por suas pernas e manchando suas sandálias brancas de vermelho.
Não surpreende o fato de a China ter a maior taxa de suicídio de mulheres do mundo. A política do filho único reduziu as mulheres a números, objetos, a um meio de produção; negando a elas o controle sobre seus corpos e o direito humano básico de determinar de forma livre e responsável quantos filhos querem ter e quando.

Pressão

As meninas também são vítimas da política. Sob pressão da família para garantir que seu único filho seja menino, as mulheres normalmente optam por abortar bebês do sexo feminino ou descartá-las no nascimento, práticas que têm distorcido a proporção de sexo na China para 118 meninos para cada 100 meninas.
O Partido Comunista defende que os meios justificam os fins. Quando Deng Xiaoping e seus colegas reformadores da economia introduziram a política do filho único como uma medida "temporária" em 1979, após a morte de Mao e o fim da calamitosa Revolução Cultural, alegaram que, sem a política do filho único, a economia se enfraqueceria e a população explodiria.
Trinta e quatro anos mais tarde, apesar das críticas crescentes, o partido ainda se apega a ela. Mas seu argumento se baseia numa ciência sórdida: a taxa de natalidade, que já estava caindo antes de a política ser introduzida, está agora oficialmente em 1,8, ou mais próxima de 1,2, de acordo com especialistas em demografia independentes como Yi Fuxian – muito mais baixa do que o nível de 2,1 necessário para a reposição da população. Yi e outros alertaram sobre o iminente desastre demográfico da China: uma nação de rápido envelhecimento que não conseguirá ser sustentada por uma força de trabalho cada vez menor.
O aumento da renda e a urbanização geralmente levam à queda das taxas de natalidade. Se a política do filho único fosse abolida amanhã, a maioria dos chineses não teria pressa para produzir tantos descendentes como Zhang Yimou. E apesar dos sinais recentes de que o Partido pode estar considerando flexibilizar gradualmente as restrições ao nascimento, ainda há uma resistência considerável.

Sem mudança

Os linha-dura teimosos não vão abandonar voluntariamente as medidas de controle populacional que forneceram ao governo cerca de dois trilhões de yuans em multas, de acordo com o demógrafo Ele Yafu, e a possibilidade de manter um controle firme sobre as vidas das pessoas.
A indignação pública manifestada contra Zhang durante a última semana favorece o partido. Em vez de atacar a política bárbara do governo, as pessoas estão sendo incentivadas a criticar o rico por escapar de suas garras.
Acabar com este castigo é um imperativo moral. As atrocidades cometidas em nome da política do filho único ao longo das três últimas décadas estão entre os piores crimes contra a humanidade do século passado. As marcas que ela deixou na China talvez nunca sejam apagadas.
(*autor do romance "The Dark Road", lançado recentemente. O ensaio foi traduzido do chinês por Flora Drew.)
Cervejarias alemãs espumam de raiva com risco de contaminação da água
Esqueça as preocupações ambientais: quando se trata de fraturação hidráulica, a preocupação dos alemães é como isso pode afetar a qualidade da cerveja. Numa carta a vários ministérios em Berlim, os cervejeiros expressaram seus temores de que a exploração de gás de xisto possa contaminar suas fontes de água e, portanto, violar a lei da pureza da cerveja de 1516.
A luta contra a fraturação hidráulica na Alemanha tomou um rumo inesperado: cervejarias alemãs estão agora advertindo que o método controverso de extração de gás natural a partir de camadas de rochas profundas da terra iria afetar sua capacidade de produzir a melhor cerveja.
O processo ameaça contaminar a água potável, de acordo com uma carta escrita pela Federação de Cervejeiros Alemães para o governo federal, e citado pelo tablóide Bild.
As normas que controlam a produção de cerveja na Alemanha existem desde a lei da pureza da cerveja, ou Reinheitsgebot, de 1516 – a primeira lei de pureza dos alimentos do mundo. De acordo com a Federação de Cervejeiros, ainda hoje a cerveja alemã só pode ser feita a partir de malte, lúpulo, levedura e água.
A coalizão de governo da chanceler Angela Merkel esboçou regulações para a fraturação hidráulica, mas os cervejeiros dizem que as leis propostas não são suficientes.

Necessidade de água limpa

Na carta, que foi enviada a seis ministros federais, os cervejeiros disseram: "as mudanças legais previstas pelo governo federal até o momento não são suficientes para garantir a segurança da água potável e para cumprir com as exigências da Reinheitsgebot". Um porta-voz da federação confirmou o conteúdo da carta para a Spiegel Online.
A carta continua argumentando que a indústria cervejeira depende de água potável de alta qualidade, e que a fraturação hidráulica pode reduzir ou até eliminar completamente a segurança do fornecimento de água. A federação apela ao governo para continuar o debate sobre o assunto antes de chegar a uma decisão final.
As tentativas de introduzir uma legislação sobre o fraturamento hidráulico em Berlim foram adiadas várias vezes. Em meados de maio, o gabinete de Merkel concordou com uma proposta para proibir o fraturamento nas áreas de captação dos lagos, como o Lago de Constança no sul da Alemanha, que são fontes de água potável. Mas várias áreas ficariam isentas da proibição.
Berlim quer desenvolver uma lei para definir as condições sob as quais a tecnologia poderá ser usada na Alemanha. O procedimento de fraturamento hidráulico é usado para liberar o gás de xisto dos depósitos de pedra nas profundezas da terra. O processo é controverso porque, entre outras razões, envolve o uso de produtos químicos que poderiam contaminar o abastecimento de água.
Enquanto isso, numa reunião de cúpula em Bruxelas na última quarta-feira (22), os líderes europeus discutiram o futuro do gás de xisto e do fraturamento hidráulico no continente. O primeiro-ministro britânico David Cameron disse aos repórteres que a Europa "não deve ficar para trás na corrida global. A Europa tem 75% da quantidade de xisto que os Estados Unidos têm, mas nos EUA a perfuração é 100 vezes mais rápida do que na Europa."
Até o momento, não houve acordo na UE sobre a forma como o gás de xisto deve ser explorado. O presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, disse que a Europa deve investir em todos os recursos energéticos, mas cabe a cada país decidir como fazer isto.
"Sim, isso inclui o gás de xisto, que pode se tornar parte da matriz energética de alguns Estados-membro, talvez menos em outros", disse ele.
Tradutor: Eloise de Vylder
Imigração põe em cheque uma Europa sem fronteiras
Raphael Minder - IHT
Carolina Porta Nova, 19, sonhava em se tornar professora escolar em sua terra natal, Portugal. Mas a recessão, os cortes de verbas do governo para a educação e uma taxa de desemprego de cerca de 40% entre os jovens puseram fim a esses planos.
Então, em outubro passado Porta Nova mudou-se para a Suíça, onde rapidamente encontrou trabalho como faxineira, em um país cuja economia relativamente saudável tornou um ímã para os desempregados da União Europeia, particularmente do Sul em apuros. "Não vejo um futuro feliz para os professores em Portugal", disse ela.
Porta Nova foi uma das 79 mil pessoas que migraram para a Suíça no ano passado, ajudando a aumentar o número de estrangeiros que moram no país em 14% nos últimos cinco anos, um ritmo que começou a alarmar alguns suíços. Após pressão crescente, o governo reintroduziu neste mês quotas de autorização de trabalho para cidadãos da União Europeia. O Partido do Povo Suíço, de direita, agora está pressionando para que haja um referendo sobre a imigração, que poderia restabelecer os controles nas fronteiras da Suíça com países da UE pela primeira vez em cinco anos.
Os suíços não estão sozinhos em suas reservas em relação à imigração. Economias em declínio, a ascensão de partidos nacionalistas e a perspectiva da entrada de cidadãos dos dois membros mais novos e mais pobres da União, a Romênia e a Bulgária, ganharem acesso irrestrito aos mercados de trabalho da EU- tudo isso gerou o maior desafio às ambições de uma Europa sem fronteiras desde 1995, quando entrou em vigor o acordo que eliminou as fronteiras internas -o Acordo de Schengen.
O governo britânico propôs tornar mais fácil a deportação de alguns estrangeiros e exigir que os migrantes paguem por certos atendimentos médicos. A Dinamarca restabeleceu as verificações em suas fronteiras há dois anos, sob pressão do Partido do Povo Dinamarquês, de extrema-direita. A Espanha recentemente exigiu que os romenos tivessem contratos de trabalho, depois que o número de romenos chegando ao país aumentou em quatro vezes, e assim reverteu seu compromisso anterior de permitir-lhes o acesso livre garantido aos membros da UE.
Tais medidas têm destacado uma nova tendência dos membros em dificuldades econômicas da UE de retirarem-se para seus próprios cantos, após décadas partilhando suas fortunas. A decisão suíça, em particular, foi fortemente criticada por Catherine Ashton, diretora de política externa da União Europeia, que disse que as restrições "ignoram os grandes benefícios que a livre circulação de pessoas traz para os cidadãos tanto da Suíça quanto da UE".
Ainda assim, apesar da resistência crescente à migração no âmbito da União, para a grande maioria dos trabalhadores da Europa o mercado de trabalho comum não cumpriu sua promessa, menos ainda em um momento de dificuldades. Apenas um terço dos estrangeiros que residem na União vem de outros países da UE, o equivalente a 12,8 milhões de pessoas, de uma população total da UE de mais de 500 milhões, de acordo com dados de 2011 do Eurostat, escritório de estatísticas da UE.
Essa porcentagem relativamente baixa sugere que "a livre circulação de pessoas é uma liberdade fundamental da UE que, ironicamente, só funcionou na prática para aqueles que são economicamente ativos", disse José María de Areilza, professor de direito da União Europeia na Faculdade de Direito Esade, em Madrid. Os outros, acrescentou, "vêm enfrentando todos os tipos de limitações que os Estados membros vêm impondo de forma a evitar a migração em busca dos benefícios sociais".
Isso é verdade mesmo na Suíça, onde a economia se manteve praticamente incólume pela crise de dívida que assola a maior parte da União Europeia. Embora o país cumpra muitas das mesmas regras da UE, ela não faz parte da União e manteve sua própria moeda, o franco. A Suíça apresenta superávit orçamentário e sua economia evitou a recessão. O índice de desemprego é de cerca de 3%, em comparação com 27% na Espanha, 18% em Portugal e quase 11% na Itália.
"Acho que o resto da Europa está acostumado com a Suíça fazendo as coisas de forma diferente, mas, quando se trata de migração, a maior parte dos países europeus partilham as mesmas preocupações", disse Patricia von Falkenstein, ex-juíza que é presidente do Partido Liberal na Basileia.
Preocupado em manter a saúde econômica da Suíça -e defender-se dos questionamentos da extrema-direita- o governo invocou uma cláusula de "salvaguarda" em seus acordos europeus que lhe permite restringir a imigração de países da UE. No próximo ano, emitirá autorizações de trabalho de cinco anos para 53.700 cidadãos de 17 países do Oeste da UE e 2.180 para os cidadãos dos dez países do Leste que aderiram ao bloco após o colapso da União Soviética.
Alguns suíços afirmam que as medidas eram necessárias para aliviar a pressão da migração, que levou a população da Suíça a inchar para mais de oito milhões em um país formado por cantões equilibrados entre pessoas que falam alemão, francês e italiano. A proporção de estrangeiros na Suíça aumentou para cerca de 27% -uma das maiores do mundo ocidental- a partir de 6% em 1950.
Dos 1,8 milhões de estrangeiros registrados oficialmente na Suíça, 1,2 milhões têm cidadania da UE, de acordo com dados do governo de 2012, os mais recentes disponíveis.
Simonetta Sommaruga, ministra da Justiça suíça, insistiu que a decisão de impor quotas "não foi um ato hostil contra a União Europeia", mas sim uma forma de abordar o fosso cada vez maior entre a economia suíça robusta e a situação triste no resto da Europa, particularmente na nações do Sul, onde "o desemprego está explodindo".
"Queremos enviar uma mensagem para os cidadãos europeus que o nosso mercado de trabalho não é ilimitado", disse ela.
Ainda assim, Von Falkenstein, presidente do Partido Liberal na Basileia, disse que as quotas eram realmente para "conter a pressão política na Suíça". O governo suíço "precisa mostrar que está levando a questão da imigração a sério ou poderá ter uma problema muito mais grave do próximo ano, o que poderia levar a um desmantelamento catastrófico de tudo o que a Suíça conseguiu negociar com a UE", disse ela.
Se as novas restrições tinham a intenção de atenuar a pressão populista liderada pelo Partido do Povo Suíço, de direita -que lutou com sucesso contra a adesão da Suíça à União Europeia- elas não parecem ter sossegado o partido.
Silvia Bär, do Partido do Povo Suíço, disse que as novas quotas eram praticamente "simbólicas", já que os imigrantes poderiam contornar as restrições pedindo licenças de trabalho de curto prazo até meados de 2014, quando os limites expirarão e não poderão ser renovados.
"Nossa infraestrutura está se deteriorando sob a tensão" provocada pelos novos imigrantes, diz o partido em seu manifesto. "Estradas congestionadas, transporte público superlotado e turmas escolares compostas principalmente de crianças estrangeiras são o resultado".
Ele acusa as autoridades suíças de "fazerem o seu melhor para resolver o problema dos estrangeiros naturalizando-os", observando que o número de pessoas que receberam a cidadania suíça aumentou mais de cinco vezes desde 1991, para quase 45.000. "Os desempregados estrangeiros muitas vezes consideram os benefícios sociais oferecidos aqui mais atraentes do que trabalhar em sua terra natal", acrescenta, ecoando reclamações semelhantes no Reino Unido.
Esses argumentos têm preocupado o lobby empresarial suíço, que em grande parte se opõe a qualquer repressão à migração, alertando para a falta de trabalhadores em setores como hotelaria e saúde. Mesmo as indústrias suíças por excelência, como a relojoaria, empregam um grande número de estrangeiros.
"Os políticos têm uma visão de curto prazo e esquecem-se que um país como a Suíça foi construído graças à imigração", disse Jean-Frédéric Dufour, diretor executivo da Zenith, uma relojoaria suíça.
De fato, o maior fluxo de imigração para a Suíça ocorreu há quase 50 anos, quando o país recebeu uma onda de trabalhadores de países como Espanha e Portugal, que fugiam da pobreza e da ditadura.
João Ferreira, 52 anos, gerente do restaurante Besenstiel na Basileia, emigrou de Portugal para a Suíça depois da revolução de 1974, que derrubou a ditadura fascista do país. Ele começou lavando pratos até, eventualmente, abrir um restaurante próprio. Ele agora tem 12 funcionários, uma mistura de portugueses, alemães, italianos e franceses.
Os imigrantes que chegam hoje, disse ele, formam "uma nova geração de portugueses, muito diferente, verdadeiramente qualificada, ao invés de quase nenhuma educação".
Tradução: Deborah Weinberg
UE lança plano pelo emprego jovem
Miguel Mora - El Pais
A Europa deu na terça-feira um primeiro passo de forte significado político para colocar os 6 milhões de jovens desempregados do continente (dos quais 2 milhões são espanhóis) no centro da agenda pública. Convocadas em Paris pelo grupo de pensadores do investidor e mecenas Nicolas Berggruen, as quatro maiores economias da zona do euro se comprometeram a implementar em algumas semanas um "new deal pelo emprego dos jovens".
O plano vai acelerar os investimentos e sugerir as reformas necessárias para modernizar e unificar o mercado de trabalho europeu, com o fim de incorporar uma geração indignada e quase perdida ao ciclo produtivo da qualidade e da inovação. Alemanha, França, Itália e Espanha dão assim o primeiro passo para tentar sanar as profundas feridas sociais abertas pelo explosivo coquetel de recessão, austeridade, má gestão, tecnocracia, afasia institucional e desunião que sofrem os 27.
"O debate Europa: as próximas etapas" reuniu no anfiteatro do Instituto de Estudos Políticos, popularmente conhecido como Sciences Po, o presidente francês e o chefe de governo espanhol e os ministros da Economia e Trabalho de Berlim, Paris e Roma. Junto deles, 400 representantes da sociedade europeia: empresários, líderes de opinião, políticos e ex-políticos, especialistas em comunicação e muitos estudantes, que acompanharam as discussões com entusiasmo.
François Hollande abriu a jornada reafirmando a intermitente febre europeísta da França e seu compromisso com o "new deal" (em referência ao plano de inspiração keynesiana implementado pelo presidente americano Theodore Roosevelt contra a Grande Depressão). O mandatário francês confirmou que o plano será discutido na cúpula europeia em 28 de junho e apresentado em 3 de julho, em Berlim, durante um encontro dos ministros do Trabalho europeus, presidido pela chanceler alemã, Angela Merkel, e por ele próprio.
Nicolas Berggruen, fundador do Instituto Berggruen e um investidor internacional com destacada participação na Prisa, editora de "El País", havia salientado ao apresentar o debate a necessidade de "buscar novas ideias europeias para entrar em um novo ciclo que permita deixar para trás a fase de austeridade", e Hollande reiterou que é preciso dar à zona do euro um governo econômico estável, e propôs dotá-lo de um orçamento que sairia de impostos como a taxa Tobin e seria dedicado a promover o emprego jovem.
"Trata-se de recuperar o crescimento em médio e longo prazo", disse Hollande. "Mas estamos diante de uma emergência e é preciso agir já." "A geração da pós-crise vai pedir contas aos governantes de hoje. Vão nos lembrar que nós tivemos a esperança de que, uma vez terminados nossos estudos, poderíamos ter um trabalho, uma vida bem-sucedida. Não podemos deixar essa geração sem perspectivas, porque senão os jovens sentirão só rancor e ingratidão em relação à Europa."
O plano englobará, em princípio, três injeções de capital diferentes, já programadas pela EU, mas que continuavam bloqueadas por falta de vontade política, por mera negligência burocrática ou para não violar o fervor da austeridade. Por um lado, a UE entregará € 10 bilhões ao Banco Europeu de Investimentos (BEI), que permitirão à entidade garantir cerca de € 60 bilhões em empréstimos para as pequenas e médias empresas (PMEs) que contratem jovens. Além disso, 16 bilhões de fundos de coesão paralisados há 18 meses serão destinados ao emprego juvenil, à inovação e à educação. Segundo a comissão, 55 mil PMEs e 780 mil jovens receberão ajudas.
Finalmente, um crédito europeu de € 6 bilhões será repartido até 2020 pelo BEI entre os sócios, em colaboração com o setor privado, para melhorar a capacitação dos que procuram seu primeiro emprego: no 25º aniversário do programa Erasmus, pretende-se expandir a ideia aos não universitários, sobretudo no deprimido sul, onde as cifras de desemprego superam --e em alguns casos mais que duplicam-- os 25%.
A maior novidade, entretanto, não é monetária e sim de método. A Alemanha vai incorporar ao "new deal" juvenil seu sistema de aprendizado vocacional misto, que permite aos jovens frequentar cursos públicos de formação em 340 ofícios diferentes, enquanto fazem estágios em empresas privadas para adaptar a oferta do mercado de trabalho à demanda.
A grande defensora desse programa é a ministra do Trabalho alemã, Ursula von der Leyen, que em Paris se revelou um modelo de dinamismo e rigor. Mãe de sete filhos, fala inglês e francês fluentemente e já soa como futura sucessora de Merkel. Embora seu tom seja mais suave, seu ímpeto não parece menor que o da chanceler; ouvindo-a, pareceu que seu afã é resolver o problema de desemprego do norte antes que o do sul.
"A Europa precisa de pessoal qualificado. Já temos as verbas e agora devemos mobilizar as empresas e os governos. Queremos mais mobilidade", disse. "Na Alemanha, Áustria e Holanda temos um milhão de postos de trabalho vagos."
A lista de intervenções foi longa e luxuosa. Mario Monti, o ex-primeiro-ministro italiano; Jacques Delors, ex-presidente da Comissão Europeia, e Felipe González, ex-primeiro-ministro espanhol, entre muitos outros, lembraram a necessidade de continuar aperfeiçoando o maravilhoso sonho europeu. A Europa irrita, dói, às vezes parece adormecida e desunida. Mas, apesar de tudo --e nisso todos pareceram concordar outra vez--, continua sendo um fabuloso artefato político e a única solução de longo prazo para os problemas de seus velhos e cansados países-nações.
Medidas contra o desemprego juvenil
- Crédito de € 6 bilhões será distribuído até 2020 entre os países para os jovens que procuram o primeiro emprego. O plano é transferir o bem-sucedido programa Erasmus --que completa 25 anos-- também para os não universitários, para que possam se formar em empresas em países da UE.
- 16 bilhões de fundos estruturais, ainda não utilizados há 18 meses, para emprego juvenil, inovação e educação: 55 mil pequenas e médias empresas e 780 mil jovens receberão essas ajudas.
- Serão entregues 10 bilhões ao Banco Europeu de Investimentos para que garanta 60 bilhões em empréstimos para PMEs que contratarem jovens.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Comissão Europeia alivia política de austeridade
Entidade prorrogou prazo para que Espanha e França, entre outros, reduzam seu deficit
PETER SPIEGEL - "FINANCIAL TIMES"
A Comissão Europeia reduziu o ritmo da austeridade na zona do euro ontem, mas alertou que continuava improvável que o bloco produzisse crescimento econômico sólido em curto prazo.
Ao apresentar sua aguardada avaliação quanto aos planos orçamentários de seus 27 países-membros, Bruxelas alertou que as redes de segurança social estão se desgastando e a pobreza vem crescendo perigosamente em muitas partes da Europa, com o fracasso dos esforços para combater o desemprego.
A comissão defendeu sua decisão de dispensar quatro das seis maiores economias da União Europeia de cumprir suas alardeadas regras orçamentárias, alegando que a recente calma nos mercados propicia prazo maior para que elas implementem reformas econômicas.
Mas a decisão, que também livrou a Itália do regime de fiscalização intensiva criado em resposta à crise na zona do euro, veio acompanhada de um alerta de que as reformas estão demorando mais do que seria "desejável" para produzir crescimento.
Como se esperava, a comissão prorrogou por dois anos o prazo para que Espanha, França e Eslovênia reduzam seus deficit orçamentários a menos de 3% do Produto Interno Bruto (PIB). Esses países deveriam cumprir a meta já a partir deste ano.
Além disso, Holanda, Bélgica e Portugal receberam prazo adicional de um ano para cumprir a norma, a despeito de a Bélgica ter violado claramente as regras da União Europeia ao desrespeitar seu limite de deficit no ano passado.
A Bélgica terá de enfrentar revisões trimestrais a partir de agora, no entanto --a primeira vez que isso acontece na zona do euro.
Países que não integram a zona do euro também foram dispensados das regras orçamentárias, entre os quais a Polônia, que recebeu prazo adicional de dois anos, e a Hungria, que não precisará mais ser monitorada pela União Europeia sob o chamado "procedimento de deficit excessivo".
CRÍTICAS
Em uma indicação da gravidade das preocupações da comissão com as perspectivas econômicas da zona do euro, os relatórios incluem requerimentos significativamente mais detalhados de informação do que no passado.
O presidente da França, François Hollande, foi especialmente criticado, e Bruxelas afirmou que as reformas nas leis trabalhistas que ele implementou até o momento foram insuficientes.
De forma semelhante, ainda que a Itália tenha sido dispensada do procedimento especial de vigilância de deficit depois de conseguir reduzir seu deficit a 3% do PIB por margem estreitíssima este ano, a comissão advertiu Roma por não ter concluído muitas medidas de reforma, entre as quais conseguir uma redução significativa na carga geral de dívida do país --a segunda mais alta da União Europeia, atrás da Grécia.
Tinta dos jornais estudantis nos EUA está acabando, e a culpa é da web
Winnie Hu - NYT   
O jornal, como muitos outros por toda parte, tem se esforçado para se adaptar ao aumento dos custos de impressão, e o Facebook e o Twitter se tornaram os meios de comunicação preferidos das gerações mais jovens.
A diferença é que "The Clinton News" é um jornal escolar, escrito e lido pelos alunos da escola de segundo grau DeWitt Clinton High School. Agora, enquanto comemora seu 100º ano como um dos jornais estudantis mais antigos da cidade de Nova York, "The Clinton News" representa um testemunho de outro legado de papel e tinta que está rapidamente desaparecendo.
Menos de uma em cada oito escolas públicas da cidade relataram ter um jornal ou aula de jornalismo impresso numa pesquisa informal feita este mês por funcionários da secretaria da educação, que não acompanham oficialmente este tipo de informação. Muitos desses jornais foram reduzidos a publicar apenas algumas vezes por ano por causa do corte de funcionários e de orçamento, e de um novo foco nas matérias acadêmicas essenciais. Alguns já não são mais publicados em papel, existindo apenas como jornais online ou blogs de notícias.

Panorama

Se Nova York é a capital de mídia do mundo, "não se diria isso julgando pelas publicações estudantis", disse Edmund J. Sullivan, diretor-executivo da Associação de Imprensa Estudantil de Columbia, que dá prêmios e realiza oficinas para jornalistas do ensino médio. Ele diz que sete das 560 escolas públicas da cidade são integrantes ativos da associação, menos do que as cerca de 85 que faziam parte em 1970. Em comparação, 23 escolas particulares da cidade estão participando.
Nacionalmente, quase dois terços das escolas públicas têm jornais, de acordo com um estudo da mídia feito em 2011 pelo Centro de Jornalismo Estudantil da Universidade Kent State. Mas Mark Goodman, professor de jornalismo que supervisionou o estudo, disse que um número desproporcional das escolas sem jornais eram de áreas urbanas com maiores porcentagens de alunos pertencentes a minorias. "Elas tendem a ter menos recursos", disse ele, acrescentando que essa divisão contribuiu para um problema de longo prazo da baixa representação das minorias nos empregos do setor da mídia.
O jornal estudantil foi por muito tempo uma tradição estimada em muitas das principais escolas secundárias do país, que permitia aos alunos tomarem a iniciativa e aprimorarem suas habilidades de escrita, enquanto absorviam lições de ética e responsabilidade. Ele fornecia um fórum público para discutir educação cívica com inteligência e paixão e, como um bônus, acrescentava pontos acadêmicos nas candidaturas para a faculdade.
Mas o declínio desses jornais nos últimos anos não é uma perda apenas para as escolas, mas também para uma indústria que está lutando pela sobrevivência. É pouco provável que os alunos criados numa dieta de posts de internet e mensagens instantâneas sejam leitores de jornais no futuro.
"Se não temos sequer um jornal neste nível, como eles vão desenvolver uma paixão por isso?", disse Joshua Sipkin, que foi conselheiro de um jornal online, agora extinto, na Information Technology High School, no Queens. "A maioria dos alunos nem sabe dos jornais, a menos que recebam um (jornal) Metro New York gratuito".
Na High School of Telecommunication Arts and Technology no Brooklyn, "não houve um momento de maior orgulho" do que quando o jornal da escola foi publicado, disse David M. De Martini, diretor-assistente. Mas o jornal, The Statement, desapareceu silenciosamente este ano depois de um mal-sucedido experimento online, que reunia alunos de vários anos, destinado a substituir a versão impressa que tinha de ser sustentada, em parte, através de vendas de bolos e subsídios da Associação de Pais e Mestres.
Até a World Journalism Preparatory School, uma escola pública no Queens que ensina seus 600 alunos a usarem as habilidades de jornalismo para explorar o mundo ao seu redor, tem lutado para encontrar uma forma de sustentar o jornal da escola, uma experiência que, segundo a diretora, proporcionou uma valiosa lição do mundo real sobre o setor. Este ano, a escola eliminou o financiamento para o jornal depois de dizer várias vezes aos alunos que ela não podia pagar indefinidamente US$ 10 mil por ano para imprimi-lo. Os alunos, que não conseguiram vender anúncios, optaram por um jornal online.
"É assim que as publicações sobrevivem ou não, e ter responsabilidade pelas receitas que as apoiam é fundamental para entender o negócio", disse Cynthia Schneider, fundadora e diretora da escola. "Eu não quero que eles passem pelo segundo grau pensando que tudo lhes é dado."

Desinteresse

Em muitas escolas, um fator ainda maior para o desaparecimento dos jornais escolares é o menor envolvimento dos alunos. O jornal antes robusto da Francis Lewis School High, The Patriot, tem lutado para continuar como um modesto projeto on-line depois que a escola, em Queens, parou de oferecer uma disciplina de jornalismo que produzia a maior parte das matérias para a edição impressa. John Pagano, o ex-conslheiro, disse que depois que os alunos deixaram de receber notas pelo seu trabalho, "ficou muito difícil conseguir matérias."
"É uma guerra de atrito", disse Rob Schimenz, presidente da Associação de Imprensa Estudantil de Nova York, um grupo de conselheiros de jornais de 45 escolas. A associação parou de enviar informações para cada escola da cidade há alguns anos, porque muito poucas respondiam.
Ainda assim, muitos conselheiros de jornais e acadêmicos de jornalismo alertam contra o fim dos jornais estudantis. Algumas escolas trouxeram de volta seus jornais depois de algum tempo de inatividade. A Boys and Girls High School no Brooklyn lançou não só um, mas dois jornais, pela primeira vez este ano para oferecer aos alunos mais oportunidades de se expressarem.
Katina Paron, diretora da New York City High School Journalism Collaborative no Baruch College, disse ver sinais de que alguns jornais estudantis estão prosperando. Desde 2009, seu programa forneceu desenvolvimento profissional para 146 escolas públicas de segundo grau, pelo menos 60 das quais indicaram estar publicando jornais este ano, disse ela.
No Bronx, The Clinton News foi publicado até durante a Grande Depressão, duas guerras mundiais, cortes no orçamento escolar e durante um período na década de 1990 em que parecia que acabaria. Os alunos da escola têm levantado dezenas de milhares de dólares para ajudar a cobrir os custos de impressão, comprar novos computadores e softwares, e usar cores nas páginas.
"The News faz parte da nossa história e que seria necessário uma briga de punhos para que ele acabasse", disse Gerard Pelisson, ex-professor de estudos sociais que liderou os esforços. Ainda assim, diz Pelisson, os alunos não arrecadaram dinheiro para o jornal para além do ano que vem, porque eles têm se concentrado na sobrevivência da própria escola. A DeWitt Clinton recebeu uma nota F nos últimos dois anos dos funcionários da secretaria da educação, espalhando temores de que ela possa ser fechada.
The News, que imprime 3 mil cópias a cada dois meses, esforça-se para ser um quadro de avisos para uma escola que é tão grande que alunos podem cursar os quatro anos sem se conhecerem. Em suas páginas, os alunos já publicaram sua própria nota para a escola baseados em pesquisas com os estudantes, e divulgaram suas ideias sobre o porte de armas e, em outro artigo, sobre Beyoncé no Super Bowl. Eles criticaram até as roupas que os professores usam nas aulas – manchas nas axilas e calças empoeiradas de giz foram enfaticamente vetadas.
A veterana Rebecca Dwarka, 18, disse que estava orgulhosa do trabalho do jornal e gostaria que mais colegas se interessassem.
"O Facebook é a nova forma de descobrir o que acontece", disse ela. "Ninguém quer sentar e ler um artigo inteiro sobre qualquer coisa."  
Tradutor: Eloise De Vyder
A administração Obama intimida a imprensa
Corine Lesnes - Le Monde
28.mai.2013 - Saul Loeb/AFP
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama
O desencanto foi consumado entre a imprensa e o presidente americano. Em 2008, e em menor medida em 2012, a mídia enfatizava sobretudo o candidato "cool" que era Barack Obama. Hoje, seu governo é apresentado como adepto do segredo e da intimidação, perseguindo os autores de vazamentos com aquilo que Leonard Downie, o vice-presidente do "Washington Post", chama de "vigor sem precedentes desde a administração Nixon".
George W. Bush não era particularmente carinhoso com a imprensa, que lhe era recíproca. Mas, para os jornalistas, a surpresa foi ver que a administração Obama havia "continuado e até mesmo acentuado a repressão aos vazamentos", disse ao "New York Times" a repórter da "New Yorker" Jane Mayer, que revelou ao público os memorandos do departamento de Justiça que autorizavam o uso de tortura em 2002.

Associated Press monitorada

O auge da discórdia foi quando a agência Associated Press revelou, no dia 13 de maio, que o Ministério da Justiça havia obtido, um ano antes, as contas de 20 de suas linhas telefônicas (entre elas a central e a linha da sala de imprensa do Congresso). O FBI estava tentando localizar a origem de uma informação publicada no dia 7 de maio de 2012 pela agência sobre uma tentativa –frustrada-- de atentado contra um avião americano no Iêmen.
Antes da publicação, a AP havia consultado oficiais da administração, como geralmente faz a imprensa americana sobre os assuntos que envolvem a segurança nacional, e esperou por cinco dias pela autorização. Portanto, foi com grande surpresa que a direção da agência descobriu, através de uma carta datada de 10 de maio, que suas linhas telefônicas tinham sido alvo de um monitoramento secreto durante dois meses. Milhares de números de telefone foram apreendidos.
Uma semana mais tarde, o "Washington Post" revelou que um jornalista da Fox News, James Rosen, também havia sido alvo de um monitoramento sem precedentes em 2010 por ter publicado informações sigilosas sobre a preparação de um teste nuclear norte-coreano. Pela primeira vez, um jornalista foi processado como "coautor" de um vazamento e foi alvo de processos criminais. O FBI havia obtido do departamento de Estado o detalhamento de suas entradas e saídas do prédio e entrou em sua conta particular do Gmail. Mas eles são proibidos de vasculhar os documentos de jornalistas, a menos que sejam acusados de algum crime.

"Criminalização do jornalismo"

Os defensores da Primeira Emenda, que protege a liberdade de imprensa, condenaram essa "criminalização do jornalismo". Cinquenta e dois veículos de imprensa encaminharam um protesto ao ministro da Justiça, Eric Holder. Para David Brooks, do "New York Times", o Ministério da Justiça ficou "completamente maluco". A tecnologia agora facilita o rastreamento das fontes, ele ressalta. "É grande a tentação de olhar os e-mails dos repórteres. Será necessária uma autodisciplina", explica Brooks. Especialistas em investigação lamentaram o efeito dissuasivo dessas apurações. Suas fontes não se manifestam mais, ainda mais porque as autoridades se recusaram a revelar quem ainda está sendo monitorado.
O próprio Barack Obama percebeu que não podia ficar por muito tempo contra a imprensa, uma vez que sua administração é criticada por várias outras controvérsias. Em seu discurso sobre a segurança nacional, no dia 23 de maio, ele se declarou "perturbado" com as repercussões dessas investigações sobre a missão da informação. "Os jornalistas não deveriam correr riscos judiciários só por estarem fazendo seu trabalho", ele disse. "Devemos nos concentrar naqueles que infringem a lei."
O presidente pediu a Holder que consultasse os órgãos de imprensa e que lhe fizesse um relatório antes do dia 12 de julho, sem se preocupar com o fato de que foi o próprio ministro que assinou a autorização para monitorar o repórter da Fox News. No caso da AP, Eric Holder afirmou ter negado, sendo que ele mesmo questionou a origem do vazamento, mas ele não o fez por escrito --uma leviandade espantosa, que os republicanos pretendem investigar. Holder, cuja cabeça já vem sendo pedida pelos republicanos há anos, é o primeiro procurador-geral afroamericano. Ele faz parte do círculo mais próximo de Barack Obama.

"Marca Obama sofre um baque"

"A marca Obama sofre um baque", disse Carl Bernstein, ex-colega de Bob Woodward no caso Watergate. E o caso faz parte de um contexto cada vez mais conflituoso entre a imprensa e a administração. A mídia tradicional se queixa de estar sendo evitada pela Casa Branca, que privilegia as redes sociais e tem criado cada vez mais seu próprio conteúdo, sob forma de fotos e vídeos.
Barack Obama é o presidente que menos realizou coletivas de imprensa desde Ronald Reagan (79 durante seu primeiro mandato, contra 89 de George W. Bush e 133 de Bill Clinton). No lugar desse exercício sempre arriscado, ele prefere as entrevistas individuais a canais de TV, se possível regionais. "A ironia com Obama é que ele maltrata a imprensa, mas esta não contra-ataca", observa Tobe Berkovitz, professor de comunicação na Boston University. "É quase uma relação abusiva."
Mas os casos de escutas poderão mudar a situação. "O presidente deve entender que o comportamento comumente chamado de 'jornalismo' não pode ser confundido com 'espionagem'", repreende o cronista do "Washington Post", Eugene Robinson, que, no entanto, está entre os mais fiéis defensores de Barack Obama.
Tradutor: UOL
Saúde à venda: tratamento de pneumonia custa até US$ 38 mil nos EUA
Valores abusivos são encontrados em todo país; pessoas chegam pagar 300 dólares apenas para ser atendido
Dodô Calixto - OM


Em um hospital em Dallas, nos EUA, o tratamento para pneumonia custa, em média, 14 mil dólares. Na mesma cidade, porém, o valor cobrado pelo mesmo serviço pode chegar a 38 mil dólares.
Na Flórida, o atendimento médico mais barato para qualquer problema cardíaco gira em torno de oito mil dólares. O mais caro, 75 mil. Já em Nova Jersey, um centro médico cobra 101.945 dólares (cerca de 200 mil reais) para implantar um marcapasso no coração (o hospital Albert Einstein, em São Paulo, por exemplo, cobra cerca de 10 mil reais pelo serviço).
Entre outros exemplos, o governo dos EUA revelou no começo de maio
uma tabela com a diferença de preços em diversos hospitais do país. Pela primeira vez na história, os norte-americanos tiveram acesso a um plano detalhado de quanto é cobrado pelos serviços hospitalares. O resultado foi chocante.
 [No vídeo abaixo, norte-americanos revelam abusos e detalhes sobre o sistema de saúde nos EUA em entrevista a Opera Mundi]

 Como não existe regulamentação para o setor, os prestadores de serviço cobram sem preço de tabela. Alguns hospitais na Califórnia, por exemplo, “pedem 300 dólares apenas para receber o paciente e perguntar qual é o problema”, afirma o estudante Marcus Murakami em entrevista a Opera Mundi.
Em nota oficial, Washington afirma que as variações podem ocorrer em função da gravidade do paciente ou a duração do tratamento. A qualidade do serviço, no entanto, não é o motivo para a diferença dos preços, argumenta o governo.
Especialistas atribuem a disparidade no sistema de saúde ao fato dos pacientes não se mobilizarem contra os preços abusivos ou, na maioria das vezes, sequer terem acesso aos valores cobrados.
A conta do hospital vai geralmente para os planos de saúde, que arcam em média com 90% das despesas. Para as camadas populares, o governo oferece subsídio - planos de saúde federais pagam pelo atendimento. Nos EUA não existe um sistema público de saúde – todos os hospitais são pagos.
“Os pacientes não se preocupam com o valor da conta do hospital, pois eles sabem que não vão pagar de qualquer forma. É o plano de saúde ou o governo que irá pagar. Como não existe essa preocupação, os hospitais podem cobrar até 900 dólares por uma aspirina”, analisa o professor de administração Garrett Taylor a Opera Mundi.
Os que mais sofrem com os preços abusivos dos hospitais são os estrangeiros, sem cobertura oficial, e os norte-americanos que não têm dinheiro para pagar o plano de saúde e, ao mesmo tempo, a renda familiar não se enquadra em “pobre” – grupo de pessoas que o governo oferece subsídio. Segundo informações do Center for Disease Control and Prevention, o número de norte-americanos sem seguro de saúde nos EUA é de 45 milhões de pessoas.
“Não é verdade que a população não se importa com o valor da cobrança. Para os que não têm seguro, eles precisam pagar a conta no valor integral. Então, o preço do serviço importa, sim”, afirma professora de medicina da Universidade de São Francisco, Renee Hsia, em entrevista ao Washington Post.
Ao divulgar a tabela com os preços nos hospitais no país, o governo procura fechar o cerco contra os opositores do Medicare de Obama – projeto que cria um sistema único de saúde ao país, similar ao SUS no Brasil – e ganhar respaldo frente à população.
A diferença entre os valores cobrados pelos planos de saúde e os hospitais chegam a ser de 10 a 20 vezes mais caros que o administração federal propõe com Medicare.
* Com colaboração de Gabriel Colombo