quarta-feira, 21 de junho de 2017

Valentina de Botas: Convencendo eleitores; e outras notas
Parece que temos de pedir licença a Janot e ao MPF para criticar o que, mesmo para leigos, fratura o bom senso
Janoesley, que época!
Em que época é possível imaginar Michel Temer como o chefe da pior/maior/mais perigosa quadrilha do país dando ordens em Mantega, Palocci ou Vaccari? Ou decidindo com Lula a candidatura de Dilma em 2010? Ou discutindo a distribuição da nossa grana para eleger ditadores na América Latina e na África? Ah, é na Câmara que Temer reinava. Entendo. Foi de lá que, sem a cadeira e a caneta certas, ele abriu os cofres do BNDES para a JBS. Não vou sustentar a inocência de ninguém, mas até Janoesley percebeu que exagerou: somente os célebres índios não contactados da Amazônia não sabem que Temer, que não manda nem no PMDB ou sequer em Renan Calheiros, não chefiou o gangsterismo de Estado petista. Na disputa entre o power-point em que Dellagnol prendeu Lula e esse admirável submundo de Janoesley em que se somam as ilegalidades de Janot às mentiras de Joesley, a Lava Jato está sendo maculada. Com uma sintaxe e competência retórica que não tem, o açougueiro do edifício Baccarat (esquina da Rua 52 com a Quinta Avenida) se esconde atrás de jornalistas com as bandalheiras cada vez mais à mostra.

Sem auxílio luxuoso
Marcelo Crivella anunciou que a grana curta dos cidadãos cariocas destinada ao Carnaval de 2018 será reduzida à metade. Alguns críticos da decisão não acham que foi coisa do prefeito Crivella, mas do pastor Crivella, tornando-o um refém de sua religião. Quem manda Crivella não ser budista, pai de santo ou ateu? Aí, podia. Esses críticos não demonstraram como, no orçamento da cidade arruinada, um prefeito, sei lá, brâmane conseguiria a metade amputada do orçamento para uma festa que pode – e há muito já deveria – se bancar sozinha. A saída ao menos parcial do Estado de onde ele é desnecessário deveria ser uma celebração no país esmagado pelo Leviatã perdulário e ineficiente, mas no programa do Faustão deste domingo, a cantora Alcione, lembrando como artistas gostam do auxílio luxuoso do Estado, disse que “os caras robam (sic) lá na Petrobras e é o samba que paga”. Bem, não sei em certos mundinhos imunes à dramática realidade, mas no mundo sem luxo de grana para festas, os de sempre já estão pagando pelos “caras que roubam lá na Petrobras” já que a penúria obrigou a prefeitura a cortes nas verbas para serviços públicos cujos usuários são os cidadãos sem auxílios luxuosos. Tomara que o prefeito mantenha a decisão contra o tóxico estado-dependentismo.

No rebanho, mas como ovelha negra
Um site de jornalismo fast-food de alfafa chamou de otários, robôs e MAV quem ridicularizou o ridículo Janoesley com seu chefe imaginário. Nesta segunda-feira, Janot disse que quem “ataca a Lava Jato pertence a castas, é ignorante ou quer defender amigos poderosos”. Ignorante eu sou, ignoro a ampla maioria das coisas, mas sei reconhecer um farsante quando ele faz uma meia delação obtendo impunidade integral e sei reconhecer a diferença de conduta de um procurador-geral que quer prender Aécio Neves sob a acusação de obstrução à justiça por exercer o mandato parlamentar em contraste à inércia quando Mercadante foi gravado tentando comprar o silêncio de Delcídio Amaral. Ainda nesta segunda-feira, Gilmar Mendes disse que as “investigações não podem ultrapassar limites legais”, a declaração foi tirada do contexto e a patrulha jurídica retomou os ataques (ataques, não críticas) incessantes ao ministro. Depois de nos livrarmos da mulherzinha e afastarmos o risco de uma ditadura, parece que temos de pedir licença a Janot, ao MPF e a certos jornalistas tutores dos nossos afetos públicos para criticar o que, mesmo para leigos, fratura o bom senso. Ora, Janot arquivou o processo de Pasadena e Lewandowski cometeu um crime contra a Constituição quando fatiou o impeachment de Dilma. No que eles são superiores a Gilmar Mendes que apanha muito mais e sozinho? Diante dos ataques (não críticas) à Lava Jato disparados pelos petistas e pela sua defesa oficial e extraoficial, o MPF silencia e silenciado permanece diante das lambanças de Janot, preferindo tweetar para o rebanho. De rebanhos, só faço parte como ovelha negra na casta dos que foram roubados pelos amigos poderosos de Janoesley camuflados no seu admirável submundo resguardado intencionalmente e/ou não por essa patrulha jurídica autoritária, pelo Pravda Global e seus repetidores fast-food de alfafa. Vão se catar!

Convencendo eleitores
Se Joesley, o comprador de políticos está impune, por que o eleitor deveria punir os comprados não os reelegendo?

200 milhões em ação, pra frente Brasil
1) Fachin retira de Moro processos contra Lula e Odebrecht; 2) Janot anuncia que anistiará caixa 2 sem propina. Se Gilmar Mendes e algum parlamentar fossem os sujeitos em 1 e 2, o Pravda Global levantaria o coral de ahs e ohs. Pelo isentismo manipulador e pelo moralismo chantagista, os brasileiros estão permitindo a tutela à sua indignação, reagindo como manada a decisões jurídicas mais de acordo com quem as toma do que com a substância legal delas. De 200 milhões de técnicos de futebol, os brasileiros passamos a doutores em direito constitucional, penal e eleitoral. Naquilo que até mesmo profundos conhecedores da ciência inexata do Direito divergem, quem questiona o pensamento aplainado recebe a tatuagem de defensor-de-bandido, robô, xucro, MAV, ignorante. Tudo, claro, em nome do bem e da verdade. Me perdoem se pareço cínica, mas acho que é só meu desencanto. Como a passagem foi abrupta sem tempo de assimilar o conhecimento e nuances, a coisa é facilitada observando-se quem decidiu: se o odiado do momento Gilmar Mendes, abomina-se; se os queridinhos da hora Fachin+Janot, aplaude-se. Me refiro também aos chamados formadores de opinião que a deformam. Pessoalmente e de dentro da minha prazerosa irrelevância de cidadã comum, evito falar do que não sei, mas não aceito que calem meu direito ao questionamento. Assim, como não pude ainda me informar sobre a decisão de Fachin, não a comento. Quanto à de Janot, já me explicaram sua correção técnica: a lei possibilita a suspensão de processos sob determinadas condições. Reconheço o acerto dele apesar de o achar uma figura destrutiva cujas ilegalidades para demitir o mordomo (sempre suspeito) que vinha arrumando a casa são uma aberração no estado de direito democrático também porque traduzem a intenção de reformar a sociedade, prerrogativa exclusiva dela pelo voto e/ou outras formas de pressão, pois, quando o Estado (PGR/MPF) a quer reformar, ele se torna autoritário, refratário a críticas e demoniza quem as faz. Janot deveria ter separado caixa 2 de propina desde o começo, quando enviou a tal lista a Fachin, mas ambos preferiram misturar a farinha no mesmo saco para “limpar este-Congresso-que-está-aí”. Receio que a “limpeza”, se não promovida em ciclos eleitorais por alguns tempo em que o sujo e o meio-sujo coexistam, resulte inútil na melhor hipótese e, na pior, num transe autoritário.

A gratidão e o abraço
Aguinaldo Silva lembrou, no começo do fim deste domingo, que “o Rio teve 80 policiais militares mortos e 261 feridos este ano. Mas, segundo alguns sociólogos de plantão na tevê e jornais, a culpa é deles”. É um privilégio não precisar conhecer a intimidade da rotina de trabalho dos policiais, um privilégio que veta o direito de julgar esses profissionais que vão aonde eu jamais teria coragem de ir, e só de leve imagino o que sentem os familiares desses trabalhadores cujo risco de não voltar vivos para casa ao fim do expediente é absoluto. Claro que há os policiais que se confundem com os bandidos no cotidiano brasileiro selvagem. Agradeço a todos os outros (a ampla maioria) e abraço as famílias daqueles para os quais o risco absoluto se concretizou.

Belíssimo
O Roda Viva com Drauzio Varella. Informativo, realista, comovente.

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