terça-feira, 4 de julho de 2017

A Firma
Custo da corrupção de Cabral e sua Firma supera valor do subsídio do Rio ao cartel de ônibus, R$ 32 milhões neste ano. Ele recebia desde os anos 90, até em banheiro da Alerj
José Casado - O Globo
Sérgio Cabral era um sócio oculto da Fetranspor, o cartel formado pelas 200 concessionárias de ônibus que operam no Estado do Rio. Até onde se sabe, o ex-governador nunca foi dono de frota de transporte coletivo. Nem precisava, era o chefe da Firma — como o grupo de funcionários públicos corruptos se autodenominava, contou Luiz Carlos Cabral, ex-assessor de Cabral, em depoimento na Justiça Federal.
Entre 2010 e 2016, o ex-governador recebeu R$ 122 milhões, ou seja, 47% do valor distribuído pelos empresários de ônibus à Firma.
Embolsou R$ 20,3 milhões por ano. Foram R$ 55,6 mil por dia, na média, segundo as planilhas de propinas da Fetranspor obtidas pelo Ministério Público Federal.
Não é pouco. Corresponde à receita de venda de 14,6 mil bilhetes diários ao custo de R$ 3,80 por viagem. Isso só é possível obter com 384 ônibus rodando lotados o dia todo na cidade do Rio, de acordo com o Databank da Fetranspor.
Visto de outro ângulo, o custo da corrupção de Cabral e sua Firma supera o valor do subsídio dado pela Prefeitura do Rio ao cartel de ônibus, estimado em R$ 32 milhões neste ano. Representa, ainda, mais de dois terços de outro gasto do município com transporte coletivo, o dos alunos das escolas públicas.
Começou em 1991, relatou Álvaro Novis, responsável na Firma pela organização da logística de coleta, lavagem e distribuição de propinas. Empresas de ônibus e empreiteiras como Odebrecht pagavam em espécie, dinheiro vivo.
Transportar e armazenar grandes volumes de notas de baixo valor foi um problema, logo resolvido pela intervenção de uma corretora de valores, Hoya, e a contratação de empresas regionais de segurança, como a Transegur (sucedida pela Prosegur) e pela Transexpert.
O fluxo financeiro da Firma era centralizado na corretora, onde um funcionário, Edimar Moreira Dantas, atualizava planilhas.
Ele recebeu ordens para destruí-las quando a Operação Lava-Jato começou. Fez o serviço, mas antes copiou todo o movimento de 2010 a 2016 num pendrive, e levou-o para casa. Detido, negociou um acordo de delação premiada. Entregou a memória eletrônica, explicando a natureza dos dados.
Novis, o encarregado da logística na Firma, seguiu o exemplo de Dantas e entregou todos os pen drives que guardara durante anos.
Neles identificou as várias contas da Fetranspor reservadas a Cabral. Foram R$ 70 milhões pela “CM”; R$ 31,6 milhões via “Abacate” e R$ 16,5 milhões pela “Verde”, entre outras entregas.
Os primeiros pagamentos, lembrou, ocorreram dentro da Assembleia Legislativa.
Cabral foi deputado estadual por mais de uma década. No dia em que assumiu a presidência da Alerj, em 1995, chamou jornalistas ao seu gabinete e mostrou-lhes o banheiro privativo. Era o local preferido pelos antecessores, contou, porque lá ocorriam as entregas semanais de propinas.
Duas décadas depois descobre-se que aquele banheiro foi, também, um marco na carreira política de Sérgio de Oliveira Cabral Santos Filho. Aos 54 anos, o ex-governador do Rio está preso na cadeia pública de Benfica. Adormece em colchões ortopédicos.

Nenhum comentário: