A pinguela da cultura
FSP
A imagem da pinguela, usada pelo tucano Fernando Henrique Cardoso para
se referir ao governo Michel Temer (PMDB), encontra hoje ilustração
didática na agonia do Ministério da Cultura. A particularidade aqui é
não se conseguir vislumbrar aonde tal ponte precária conduzirá.
A chefia da pasta pode passar em breve para o quarto nome desde a posse
do presidente, há pouco mais de um ano. Antes disso, a instituição
chegou a ser extinta —decisão revertida em questão de dias, diante da
grita de artistas.
O primeiro a encabeçar a Cultura foi o diplomata Marcelo Calero, que
demitiu-se após pressão do então ministro Geddel Vieira Lima (Secretaria
de Governo) pela liberação de obra em área tombada.
Assumiu o deputado Roberto Freire (PPS-SP), cuja principal aparição no
noticiário se deveu a estéril esgrima retórica com o escritor Raduan
Nassar, defensor do PT.
Sua gestão tampouco venceu a barreira dos seis meses. Freire renunciou
em maio passado, após o vazamento da gravação da conversa entre Temer e o
empresário Joesley Batista. Curiosamente, não havia exibido semelhantes
pruridos ao nomear 18 correligionários para cargos no ministério.
Na sequência, o cineasta João Batista de Andrade, um dos empregados pelo
antecessor, assumiu interinamente. Somava poucos dias no posto quanto
anunciou seu desinteresse em ser efetivado.
O cargo agora deve voltar à cota do PMDB. A senadora Marta Suplicy (SP), que já ocupou a função, declinou da primeira sondagem.
Outros nomes aventados são o do deputado André Amaral Filho (PB), 26,
cujas façanhas em prol da cultura incluem atuar para a instauração da
Frente Parlamentar em Defesa da Vaquejada, e o da deputada Laura
Carneiro (RJ), suplente de Eduardo Cunha.
A bem da verdade, as fundações dessa pinguela são frágeis de longa data.
Em 32 anos, a Cultura conheceu 15 titulares (sem contar os interinos).
Não há projeto de política continuada que resista a dança das cadeiras
tão buliçosa.
Noves fora as trepidações da pasta, há uma agenda relevante a ser
tocada, da qual a reformulação da Lei Rouanet (principal mecanismo de
financiamento à produção artística no país) constitui página
fundamental.
A matéria, em fase de audiência pública no Senado, patina há sete anos
no Congresso. Em sinalização auspiciosa, o governo endureceu há pouco os
dispositivos de controle do uso dos recursos obtidos via renúncia
fiscal. Com ou sem ministério, há por onde avançar.
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