quinta-feira, 6 de julho de 2017

Epidemia de balas perdidas precisa ser contida
É fundamental planejar as ações, usando inteligência e cooperação com outros órgãos, inclusive federais, como já foi feito, para combater o tráfico de drogas
O Globo
Uma adolescente de 14 anos é a mais recente vítima da epidemia de balas perdidas que aflige o Rio. Na manhã de ontem, ela estava dentro do Colégio Estadual Ricarda Leon, em Belford Roxo, na Baixada Fluminense, quando foi atingida nas costas, tendo o pulmão perfurado. A PM alegou que, no momento em que a menina foi ferida — ela está internada no Hospital Geral de Nova Iguaçu —, traficantes trocavam tiros numa favela da região.
Menos de 24 horas antes, um outro episódio chocara a cidade. No fim da tarde de anteontem, Vanessa Vitória dos Santos, de 10 anos, morreu após ser atingida por um tiro na cabeça quando estava dentro de casa, na comunidade Camarista Méier, onde está instalada uma das 38 Unidades de Polícia Pacificadora do estado. Segundo vizinhos, policiais perseguiam bandidos quando a menina foi baleada. O subcomandante da UPP, tenente Marco Luiz, ficou ferido na ocasião.
Os dois casos se somam a outro episódio dramático ocorrido nos últimos dias. Na Favela do Lixão, em Duque de Caxias, Claudineia dos Santos Melo, que estava grávida, foi alvejada por uma bala perdida que atingiu também seu bebê, Arthur. Claudineia está internada no Hospital Moacyr do Carmo, e Arthur luta pela vida no Hospital Estadual Adão Pereira Nunes. Segundo os médicos, o bebê sofreu lesões graves. Ainda não se sabe de onde partiu o tiro.
O caso de Claudineia, por si só, já deveria ter levado as autoridades do estado a reverem sua política de segurança e as estratégias da polícia — se é que elas existem. Independentemente da origem do disparo, não há argumentos que expliquem o fato de um bebê se tornar vítima da violência antes mesmo de nascer. Esta é uma marca indelével no sangrento prontuário do Rio.
A sucessão de tragédias faz com que a violência se banalize. E, tão chocante quanto as histórias ouvidas a cada dia, é a letargia do governo para impedir essa fábrica de balas perdidas.
A tática de confrontos tem se revelado desastrosa. Tampouco resolverá blindar paredes ou levantar muros de escolas, até porque crianças têm de se deslocar até elas. Desde o início do ano letivo, a violência provocou o fechamento de 379 das 1.537 escolas da rede municipal ao menos uma vez.
A polícia precisa ter um levantamento sobre os casos de balas perdidas, para saber onde, quando e por que acontecem. De modo que possa agir a partir de uma base. É fundamental também planejar as ações, usando inteligência e cooperação com outros órgãos, inclusive federais, como já foi feito, no combate ao tráfico. O projeto das Unidades de Polícia Pacificadora, que privilegiava o policiamento de proximidade, em detrimento dos confrontos, tem de ser urgentemente recuperado.
E o governo federal precisa fazer a sua parte. Afinal, as armas que alimentam a guerra do Rio entram no estado por fronteiras, portos e aeroportos vulneráveis. Muitas vezes pela porta da frente.
Acima de tudo, estado e União precisam agir. O que até agora não têm feito.

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