Procuradores da Lava-Jato rejeitam proposta de delação de Eduardo Cunha
Negociações que vinham se arrastando havia mais de um mês chegaram a um ponto final
Jailton de Carvalho - O Globo
A mais esperada e também uma das mais temidas delações desde os
acordos da JBS e Odebrecht não vai acontecer, pelo menos por enquanto.
Procuradores do Grupo de Trabalho da Lava-Jato em Brasília rejeitaram a
proposta de delação apresentada pelo ex-deputado Eduardo Cunha, um dos
mais próximos aliados do presidente Michel Temer. As negociações vinham
se arrastando há mais de um mês e, na sexta-feira passada, procuradores
decidiram botar um ponto final das negociações.
As promessas do ex-deputado de delatar políticos com quem mantinha
estreitos vínculos foram consideradas "inconsistentes e omissas". Cunha
também teria apresentado poucos documentos para comprovar as genéricas
acusações que teria feito. A informação sobre o fim das tratativas foi
divulgada pelo Valor e confirmadas pelo GLOBO nesta terça-feira. A
recusa da delação não pode, ainda, ser considerada uma derrota de Cunha.
Na semana passada, um interlocutor do ex-deputado disse que, mesmo com
novo advogado e negociações em andamento, ele tinha mudado de
estratégia.
À ESPERA DA NOVA PROCURADORA
Segundo esta
mesma fonte, Cunha apresentou de forma intencional uma delação branda
para ser rejeitada pela equipe do atual procurador-geral Rodrigo Janot. A
ideia dele seria esperar a posse da futura procuradora-geral Raquel
Dodge e, a partir daí, buscar um acordo mais favorável, com menos
revelações comprometedoras e mais benefícios. Com isso ele poderia
poupar os aliados com quem mantinha contato com mais frequência, entre
eles Temer e o ex-ministro Henrique Eduardo Alves.
Cunha
também estaria apostando também numa inversão de expectativas no
Supremo Tribunal Federal (STF) a partir da troca de papéis entre Janot e
Raquel Dodge. Com Janot fora de cena, ele acredita que seria mais fácil
obter um habeas corpus no STF para deixar a prisão em Curitiba. A
decisão da Câmara de impedir que o STF abra processo por corrupção
contra Temer como queria Janot teria sido um dos motivos que levaram
Cunha a recuar da ideia da delação já.
No início das negociações Cunha teria prometido falar sobre sobre
Temer e pelo menos mais 50 deputados, senadores e ministros, entre
outros políticos. Procuradores entendiam que, pelos indícios que pesam
contra o ex-deputado, Cunha teria munição para triturar a reputação de
um expressivo número de políticos, alguns deles do topo da hierarquia.
Era isso que justificaria o acordo com o ex-deputado. Até ser preso
Cunha era suspeito de liderar uma das maiores bancadas da Câmara. Ele
teria mantido o poder mesmo depois de encarcerado.
Investigadores ainda mantém o mesmo ponto de vista sobre o potencial
explosivo se, de fato, Cunha decidisse falar tudo o que sabe. Mas, nas
últimas semanas, eles passaram a estranhar a estratégia do ex-deputado.
Cunha prometia muito e entregava pouco. Para surpresa deles, Cunha
estaria deixando importantes fatos de fora da delação. Estaria também
apresentando versões completamente inverossímeis e até mesmo
contraditória em relação a contundentes provas já recolhidas ao longo
das investigações.
— Não sabemos se essa delação vai acontecer - dizia um dos investigadores.
Na sexta-feira, foi batido o martelo. Nos termos apresentados, a
Procuradoria-Geral entende que não tem cabimento fazer acordo com Cunha.
O ex-deputado está preso em Curitiba desde 20 de outubro do ano
passado. Em 31 de março deste ano ele foi condenado a 15 anos e 4 meses
de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas em
sentença assinada pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de
Curitiba.
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