segunda-feira, 19 de junho de 2017

Cabeça a prêmio
Ricardo Noblat - O Globo 
Pedro Collor começou a derrubar o irmão da presidência da República ao denunciá-lo por corrupção sem apresentar provas.
Bastou a Roberto Jefferson o poder da palavra para detonar o escândalo do mensalão que quase pôs a pique o governo Lula.
Além de provas entregues à Justiça, Joesley Batista ofereceu uma narrativa dura e crua de suas relações com políticos nos últimos anos.  Alvíssaras! Evoluímos.
O país do futuro, esse substantivo abstrato, dá sinais de que poderá rebentar se assim quisermos.
O capitalismo de compadrio estrebucha na maca e resiste em ser substituído pelo capitalismo moderno da livre competição que independe de favores do Estado.
A agonia de um será lenta, mas aparentemente inevitável. O nascimento do outro, demorado e sujeito às dores do parto natural.
O ponto da situação política, ontem à tarde, em Brasília, indicava: Temer fica no cargo. Até que saia. Quando? Quem sabe?
A absolvição por excesso de provas da chapa Dilma-Temer provocou a sensação inicial de que o governo estava perto de poder respirar sem a ajuda de aparelhos.
O que Batista contou à revista ÉPOCA, depois de mais um longo depoimento prestado à Lava Jato, pulverizou a sensação.
A força da entrevista não está na revelação de novos fatos capazes de acuar um presidente da República já em apuros. Está na maneira como o dono do Grupo JBS juntou fatos conhecidos, ordenou-os, detalhou-os e refletiu sobre eles com realismo.
É provável que por prudência não tenha dito tudo o que disse aos procuradores da Lava Jato. É compreensível que tenha agido assim.
Um delator não pode ultrapassar limites estabelecidos por seus inquisidores oficiais. E esses, com toda certeza, o obrigam a preservar segredos que só deverão se tornar públicos mais adiante.
Certamente, a próxima oportunidade de se conhecer tais segredos será quando a Procuradoria-Geral da República denunciar Temer ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O procurador Rodrigo Janot está tentado a fatiar a denúncia para não dar sossego a Temer. Apresentada de uma só vez, ela poderia ser recusada de uma vez só pela Câmara dos Deputados.
Hoje, ali, Temer conta com mais de 250 votos para arquivá-la. O ideal para ele seria que a votação ocorresse antes de o Congresso sair de férias na primeira semana de julho. Se depender de Janot, porém...
Temer é investigado pelo STF por corrupção passiva, obstrução da Justiça e organização criminosa. Cada um dos delitos poderá dar ensejo a uma denúncia, de modo que a Câmara só possa votá-las em agosto, depois das férias.
Até lá, Temer continuaria sangrando, o governo paralisado, mas fingindo que está ativo, e haveria tempo para o surgimento de fatos novos, jurídicos ou políticos.
Esta semana, o STF decidirá a sorte do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG). Seguirá solto ou será preso?
Em julgamento, também a revisão dos termos da delação premiada de Batista e a substituição ou não do ministro Edson Fachin como relator da Lava Jato.
O STF é composto por 11 ministros. Cada um deles é uma ilha. As ilhas só formam um continente quando a imagem do tribunal corre perigo. É o caso.
Daqui a mais uma ou duas semanas, o juiz Sérgio Moro julgará Lula no processo do tríplex do Guarujá. Lula é réu em mais cinco.
O que antes se imaginava como o grand finale da Lava Jato, possível de cortar a respiração coletiva, estará longe disso.
Há muito mar a ser navegado, e procelas à frente.

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