domingo, 15 de fevereiro de 2009
MADAME DE GIRARDIN (1804/1855)
A Noite
Eis a hora em que extingue a vela
Que o dia esconde os meus pernoites:
Meu coração à prima estrela
Se exibe como a flor das noites.
Ó noite de langor profundo,
Sabes juntar, precisa, a fé
Aos julgamentos onde o mundo
Em mim produz cegueira até.
Conheces bem o meu sonhar,
minha coragem e alegria;
Sabes que o meu filosofar
É desespero sem porfia.
Por ti me mudo sem reclamo;
Não mais mentiras vis, plurais;
Por ti eu vivo, eu sofro, eu amo,
Minha tristeza não ri mais.
Não mais coroa rosa e branca;
A face pálida e sem vez,
A minha fronte se desanca
Deixa cair minha altivez.
As minhas lágrimas contidas
Desfilam lentas nos meus dedos,
Tal fosse fontes não sabidas
Em ramos mortos de arvoredos.
Depois de um dia de tormento,
Um dia loudo de vaidade,
É bom langui sem fingimento
É bom sofrer em liberdade.
Sim, é amarga a alegria
De se jogar por um momento
Como uma presa que se cria
Por sobre as serras do tormento;
De esvaziar todos os prantos
Com um soluço derradeiro.
De ter levado sem encantos
Ao desespero o canto inteiro.
Então a dor já bem servida
Deixa um repouso vago e doce;
Não se pertence mais à vida,
Vosso ideal, vão, dissipou-se.
Nada-se e plana-se no espaço,
Reconduzido pela tarde;
Já não é mais sombra e passo,
Uma alma que não se retarde.
O clã do voo que se encerra
Vos emancipa como a morte;
Não há mais nome sobre a terra,
Pode-se em sonho ter sem corte.
De um mundo mau não resta um véu,
Nem elo e nem - lei e nem dor;
A alma, papílio em pleno céu,
Sem crime escolhe a sua flor,
Sob o domínio da incerteza
nâonos sentimos oprimidos
Assim se volta à natureza
Como o país de amores idos.
A minha noite luz e ensombra,
Encontro tudo na beldade
Reúnes tu estrela e sombra,
Todo mistério e verdade.
A brisa já gelou o alento
Da aurora, clama a ardentia;
Adeus, sincero pensamento;
Há que mentir... surgiu o dia.
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