Triste
fim de uma obra mal concebida
O Globo - Editorial
Encontrando-se com o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, o senador
Pedro Simon (PMDB-RS) definiu o relatório de cinco mil páginas apresentado pelo
relator da CPI do Cachoeira, deputado Odair Cunha (PT-MG), como sendo “de
mentirinha”, e lamentou que, ante o exemplo dado pelo STF no julgamento do
mensalão, o Congresso tenha perdido a oportunidade de apanhar um corruptor, “o
que seria inédito”.
O relatório, cuja leitura foi adiada para quarta-feira próxima, não pede a
quebra do sigilo bancário da construtora Delta e de seu proprietário, Fernando
Cavendish. Ao invés disso, o texto pede o indiciamento de pessoas como o
governador de Goiás, Marconi Perillo, do jornalista Policarpo Junior, da “Veja”,
exclui o governador (petista) do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, e pede que
seja investigado o procurador-geral da República, Roberto Gurgel.
Pode-se entender a decepção do senador Simon com essas peripécias do
Congresso, mas a verdade é que o triste fim da CPI do Cachoeira estava escrito
nos astros desde há bastante tempo. A ideia original transparece sem nenhum
disfarce no relatório final (que, de tão ruim, foi desmerecido pelo próprio
oficialismo).
Era um trabalho de vingança, em que foi figura de proa o ex-presidente Lula.
Tratava-se de turvar as águas ante a proximidade do julgamento do mensalão; de
criar dificuldades para a oposição, na figura do senador Demóstenes Torres; de
mostrar que a imprensa tinha relações com meliantes; de desmoralizar o
governador de Goiás, Marconi Perillo, culpado de ter avisado o presidente, antes
de todo mundo, que havia uma história de comprar parlamentares.
Nada disso foi obtido. Não se esmiuçou o caso Cachoeira; Demóstenes Torres
foi cassado pelo Conselho de Ética do Senado; e nada foi apurado sobre a Delta,
lavadora de dinheiro público federal e estadual.
A partir da revelação de que o empreiteiro Cavendish mantinha íntimas
relações com figuras do esquema governista, desapareceu o interesse do esquema
oficialista numa investigação que acabaria sendo um tiro no pé.
Perdido o rumo, os governistas recusaram a prorrogação dos trabalhos para que
as ligações da Delta com o mundo político fossem investigadas a fundo.
Sobra a tentativa de intimidar a imprensa, na figura do jornalista da “Veja”.
Mas, como diz o deputado Miro Teixeira, “é temerário provocar indiciamentos sem
ter tentado ouvir as pessoas”.
A esse respeito, começou a ser votado na comissão um requerimento de
convocação do jornalista, apresentado pelo senador Fernando Collor. Mas antes
mesmo que fosse votada a matéria, o relator tirou o documento de votação.
“Ele viu que seria derrotado” — diz Miro Teixeira. “E agora propõe o
indiciamento, desprezando a manifestação da maioria dos membros da
comissão.”
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