Em
que medida invadir escolas pode melhorar o ensino? De que modo a
interrupção das aulas, do processo de ensino, pode resultar em um ensino
de qualidade? De que modo a pichação, a destruição do patrimônio e a
depredação das escolas invadidas podem colaborar para com melhores
estruturas escolares? De que forma oficinas de masturbação, miçangas,
capoeira, feminismo, pichação, malabares e hip hop podem contribuir em um universo de analfabetismo funcional endêmico (incluindo professores)?
Estive em uma escola invadida e encontrei as respostas.
Nem
precisava (ter visitado uma escola invadida para entender o que está
acontecendo). Como todo jovem sem base intelectual, com interesse pela
política e submetido ao professor médio brasileiro, fui devidamente
doutrinado e, entre os 14 e os 19 anos, fiz parte de grupos como a UJS
(União da Juventude Socialista, braço infanto-juvenil do PCdoB e um dos
organizadores das invasões); de modo que sei exatamente como funciona a
mentalidade do jovem revolucionário, tanto por haver sido eu mesmo um
"idiota útil" como por haver convivido com um exército (ou rebanho) de
jovens usados pela esquerda. Todavia, é sempre recomendável olhar o
problema o mais perto possível. Por isso, estive em uma escola “ocupada”
– invadida, tomada de forma criminosa por professores irresponsáveis e
alunos estupidificados, todos sob a batuta de partidos de esquerda,
sindicatos e organizações criminosas. Um amigo me acompanhava. Não
entramos, é claro – estávamos de banho tomado, não vestíamos camisa
vermelha e não fazemos parte da juventude engajada e do bem que quebra
tudo por um mundo melhor. Não nos deixaram entrar, portanto. Mas
disseram que se nos identificássemos e marcássemos uma hora poderíamos
conhecer a “ocupação”. Isso foi na sexta-feira, 20 de maio de 2016, em
frente ao portão principal da Escola Ernesto Dornelles, em Porto Alegre.
–
Opa. O que tá acontecendo aí? – perguntamos a um jovem mancebo, que
decerto quebrava paradigmas e problematizava o cosmos enquanto pinoteava
sobre um skate.
– Como assim? A escola tá ocupada!
–
Por quê? – ousamos questionar, enquanto contemplávamos o monte de
cadeiras quebradas prepostas ao portão principal (quem já estudou em
escola pública sabe que até se acumulam cadeiras quebradas, mas quem já
participou de movimento estudantil de esquerda, como eu, sabe que
destruir é a especialidade).
– Ué, pelo mesmo motivo que tem várias escolas ocupadas.
O
rapaz estava fora do rebanho, isolado; teria de recorrer somente a sua
consciência para nos responder. Em tom de ignorância amistosa, instamos o
rapaz a dar suas explicações:
– Não, não, isso nós sabemos. Mas por que precisamente vocês estão ocupando a escola? O que vocês querem?
Com mais reticências, hesitações e “ãããããs” do que palavras, o jovem começou a responder:
–
Hm, tem um monte de coisa. A gente tá apoiando os professores que
querem aumento de salário. A gente também quer melhores condições de
aula, equipamentos, instalação...
Imediatamente, olhamos para a
enorme pilha de cadeiras quebradas e para as paredes pichadas. Enquanto o
“estudante” se esforçava para lembrar-se dos motivos de estar ali
andando de skate em horário de aula, aproximou-se outro invasor,
praticamente um modelo de catálogo de skate wear, com trajes da moda cujos valores somados hão de ultrapassar o salário de um professor. Analisou-nos, viu que estávamos de boa e se afastou. O skatista continuou sua explicação, agora com o entusiasmo de quem acabara de lembrar-se da verdade do Universo:
– AH!!! Também tem o negócio das privatizações e da lei da mordaça.
– Privatizações? – questionamos assustados – Isso tá acontecendo?
– Sim, eles têm um projeto e já tão começando...
– “Eles” quem?
– Ah, o governo. Eles querem entregar as escolas.
– Terrível! E essa lei da mordaça, como é?
– Ah, é um projeto pros professores não poderem ensinar um monte de coisa... Escola Sem Partido é o nome.
– Poxa! E também é do governo?
– Sim, do governo!
– Terrível.
Realmente,
é terrível. Não sei se por desejo de voltar a radicalizar no skate ou
se por constrangimento de não haver recebido treinamento suficiente para
radicalizar nas palavras, o rapaz encaminhou o fim da conversa através
das grades da escola “ocupada” alertando que se quiséssemos entrar as
lideranças da ocupação teriam de avaliar nosso pedido. Mas já nos era o
suficiente. Fomos embora após ouvir as quatro motivações alegadas por
quem está ocupando as escolas. São duas grandes mentiras e duas verdades
que viram meias-verdades.
As mentiras:
O
Escola Sem Partido não é do governo e não pretende impedir que os
professores ensinem “um monte de coisas”. Trata-se de um projeto de lei
do deputado estadual Marcel van Hattem, que pretende impedir que
professores doutrinem ideologicamente seus alunos, garantindo-lhes o
direito e o dever de ensinar sobre tudo que diz respeito à sua matéria,
mas sem emissão de julgamentos enviesados – ou seja, que o professor
seja “informador”, não “opinador”. O que boa parte dos professores faz
há pelo menos três décadas é enviesar suas abordagens, recortando os
fatos, ocultando boa parte do conteúdo e direcionando os alunos para o
brete ideológico. O PL 190/2015 de van Hattem e projetos semelhantes em
outros estados foram estimulados pelo trabalho da ONG Escola Sem
Partido, criada por Miguel Nagib.
Infelizmente,
o Governo do Estado não planeja privatizar o ensino. Sindicalistas e
“professores” espalham o boato com base no PL 44, do Executivo, que,
basicamente, estabelece parcerias entre o governo e entidades privadas
“sem fins lucrativos” que conduzam “atividades dirigidas ao ensino”. Ou
seja, é uma tentativa – ainda insuficiente, mas salutar – de oferecer
opções de atividades e qualificação para quem depende do capengo poder
público. Aliás, a única privatização vista é a procedida pelos
invasores, que tomaram espaços públicos para si e se arrogam o direito
de escolher quem pode entrar nas escolas.
As verdades: professores recebem salários baixos e as escolas públicas estão sucateadas, caindo aos pedaços. Por que viram meias-verdades?
São
meias-verdades no contexto das invasões das escolas, pois são tomadas
como desculpas para essas movimentações, cuja justificativa principal, à
qual todas as outras estão subordinadas, é a melhora nas condições de
ensino. Ora, em que medida invadir escolas pode melhorar o ensino? De
que modo a interrupção das aulas, do processo de ensino, pode resultar
em um ensino de qualidade? De que modo a pichação, a destruição do
patrimônio e a depredação das escolas invadidas podem colaborar para com
melhores estruturas escolares?De que forma oficinas de masturbação,
miçangas, capoeira, feminismo, pichação, malabares e hip hop
podem contribuir em um universo de analfabetismo funcional endêmico
(incluindo professores)? É evidente que não há relação entre as
reivindicações dos invasores e o resultado das invasões. Não é preciso
pensar muito para concluir que é possível sustentar tais queixas sem
interromper as aulas e sem depredar patrimônio público; aliás, não é
somente possível – respeitar o estudo e seu ambiente é a única forma de
se proceder com as referidas reivindicações. Todos sabem disso, ainda
que alguns prefiram ignorar.
É assim a dinâmica dos movimentos
revolucionários: as causas, as bandeiras, são sempre aparentes; a causa
real final é sempre a revolução, e as causas intermediárias são a
acumulação de poder político e econômico. A causa aparente, aliás,
jamais deve ser alcançada; a obtenção dos objetivos alegados acabaria
com a justificativa das ações radicais. Eis a resposta para quem se
pergunta por que o PT não resolveu o problema de seus companheiros do
MST.
É exatamente esse o caso das escolas invadidas. A verdade
inteira é que as “ocupações” são manobras políticas, inseridas num
contexto de luta pelo poder, que é precisamente tudo que interessa às
lideranças dessas movimentações – partidos de esquerda (PT e suas linhas
auxiliares, PCdoB e PSOL), sindicatos de trabalhadores que não
trabalham (CUT, CPERS e outros) e organizações criminosas (MST, MTST,
Levante Popular etc.).
Com o afastamento de Dilma Rousseff, sem
acesso aos cofres públicos, esses grupos perderam o principal meio de
financiamento de sua atuação. Em poucas palavras: a fonte da mortadela
secou. Que fazer? Nada mais fácil que recorrer ao exército formado em
três décadas de hegemonia esquerdista no ensino, com base em um
currículo de fundo marxista em seu todo e com o construtivismo
destruidor como guia. De uma hora para outra, como que por mágica,
escolas de todo o Brasil começaram a ser “ocupadas”, num processo de
desestabilização de curto prazo e formação de uma militância que será
muito útil no longo prazo.
Contudo, sabemos que, mesmo que o
ambiente escolar seja intelectualmente insalubre como um todo, ainda não
se consegue a adesão dessa comunidade com um discurso radical. E é aqui
que entram as meias-verdades de que falei anteriormente, as legítimas
reivindicações
por melhores salários para os professores e por espaços escolares mais
decentes. Com bandeiras aparentemente justas, os militantes
profissionais arregimentam militantes neófitos, ingênuos e absolutamente
suscetíveis ao arrebatamento de fazer parte de um grupo “justo” e
rebelde. São estes novos radicais os idiotas úteis do momento.
Supõe-se
que é do terrorista e ditador russo Lenin a expressão “idiotas úteis”,
com a qual manifestava seu desprezo para com os militantes da causa
comunista no Ocidente. Líderes esquerdistas de todo o mundo, de ontem e
de hoje, sempre fizeram uso de uma militância engajada e abnegada. Essa
linha de frente faz o serviço sujo (divulgar e propagar a ideologia, sem
ou com violência), enquanto os líderes ficam à espreita, imaculados,
esperando o momento certo para avolumar-se ante seus militantes. Estes,
tão logo a causa triunfa, são descartados por motivos vários (discordar
da violência excessiva, manifestar decepção com a falta de senso
democrático dos líderes etc.).
Na Iugoslávia, na Romênia, na
China, em Cuba, nas Repúblicas Soviéticas e onde quer que a esquerda
socialista tenha tomado ou conquistado o poder, os líderes fizeram largo
uso dos dedicados e ingênuos idiotas úteis que logo seriam descartados.
Mutatis mutandis, é esse o processo que se verifica hoje nas escolas invadidas.
Nosso
amigo skatista do início desta história é um belo exemplo de idiota
útil, como, repito, eu mesmo já fui. Por isso, com meu testemunho do
tempo em que estive do lado de lá, as compreensões obtidas
posteriormente e a contemplação dos casos atuais, posso afirmar que,
como o rapaz com quem conversamos na Escola Ernesto Dornelles, a imensa
maioria dos alunos e dos professores que participa desses crimes de
invasão não sabe por que está ali. Esse suscetível rebanho se acostumou a
exigir, a reivindicar. Os professores, mesmo os ingênuos idiotas úteis,
em sua maioria querem melhores salários, o que é justo, mas exigem
também todas os direitos que viram regalias típicas no contexto do
funcionalismo público brasileiro; não querem resolver o problema, querem
fazer parte do problema.
Duvida? Ouse falar-lhes em “meritocracia”. Já
os estudantes, mesmo os não-esquerdizados, também estão mal-acostumados a
exigir direitos e fugir de deveres. E a todos – alunos e professores –
agrada a idéia de fazer parte de algo grandioso, contestador, capaz de
modificar a sociedade; e, se não tiverem de pensar muito, somente tendo
de cerrar o punho e gritar alto, então, é o melhor dos mundos. E isto é
tudo. Caminham docilmente no brete ideológico construído em anos de
dominação, conduzidos por uma elite política, sindical e terrorista que
sabe muito bem o que faz e que está interessada em muitas coisas – todas
muito, muito distantes de remunerações justas e meritórias para
professores e de melhores condições materiais de ensino e aprendizagem.
Não
é por acaso que as lideranças falam sempre as mesmas coisas, de forma
frenética e incontinente; também, não é por acaso que o rebanho
titubeia, gagueja, solta as palavras-chave ao ar de forma imprecisa e
desconectada – a diferença que há entre estes e aqueles é o nível de
domínio da mentira, é a capacidade e a disposição para decorar os
argumentos das causas aparentes. Em resumo: como tudo na esquerda, é
tudo mentira, afetação, falsidade, mendacidade.
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