A trama é rocambolesca, mas, acreditem!, verdadeira. Se você tem a impressão de que a esculhambação já chegou ao Supremo, então está certo!
Se você está
com a impressão, leitor amigo, de que a esculhambação ameaça romper o
cerco e chegar ao Supremo, então é um otimista. Isso já aconteceu.
A
Procuradoria-Geral da República havia entrado com uma Ação Cautelar, no
fim do ano passado, para afastar Eduardo Cunha da Presidência da Câmara,
acusando-o de usar o cargo para obstruir o processo que contra ele
corre no Conselho de Ética. A decisão estava a cargo de Teori Zavascki,
que não tinha estabelecido uma data para decidir.
A situação é
complexa. O Supremo destituir o presidente da Câmara não é coisa
corriqueira. Quem quer que leia a Ação Cautelar de Rodrigo Janot vai
constatar que se trata de um conjunto de ilações, sem a evidência fática
de que Cunha transgrediu, de fato, o Regimento Interno da Casa para se
manter no poder. Afinal, uma coisa é rasgar o Regimento; outra,
diferente, é saber jogar com ele, ainda que com maus propósitos.
Adiante.
A Rede,
partido que milita fanaticamente contra o impeachment — embora tente
disfarçar os seus propósitos —, entrou com uma ADPF — Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental — pedindo a destituição de Cunha,
sustentando que ele não pode estar na linha sucessória. Afinal, é réu
no Supremo. Argumentação: se um presidente não pode ser réu, e por isso
Dilma será afastada, seu substituto temporário também não. Quando Temer
assumir o comando do país, Cunha é que ocuparia seu lugar nos períodos
de eventuais viagens fora do país.
Muito bem! O
relator da ADPF é o ministro Marco Aurélio. Para começo de conversa,
ele nem deveria ter reconhecido o instrumento. No país do habeas corpus
preventivo, temos agora a ADPF preventiva. Logo teremos o Mandado de
Segurança Preventivo e a Ação Direta de Inconstitucionalidade
Preventiva. Vale dizer: eu adivinho o que o outro vai fazer e já recorro
à Justiça.
Mas Marco
Aurélio reconheceu. Não só reconheceu como mobilizou Ricardo Lewandowski
para atropelar a pauta do Supremo e pôr a ADPF em votação. Qual seria o
resultado? Não sabemos. O fato é que a petição da Rede sugere que todos
os atos praticados por Cunha no exercício da Presidência da Câmara são
ilegítimos porque estariam violando preceitos fundamentais.
Em casos
assim, cumpre ao Supremo modular a decisão, vale dizer: se algo foi
feito enquanto um preceito fundamental estava sendo violado, então é
preciso reparar de algum modo o dano. É claro que isso abriria uma
janela retórica ao menos para questionar o impeachment, já que, na sua
trajetória, há a decisão inaugural de Cunha: recebeu a denúncia.
Marco
Aurélio e Lewandowski atropelaram Teori Zavascki e se preparavam para
transformar o Supremo num palco — a palavra que me ocorre é outra, mas
fiquemos por aqui mesmo. Dificilmente o Supremo acataria — ou acatará — a
tentativa de anular o processo de impeachment na Câmara, mas a dupla do
barulho forneceria munição a essa tese. Marina Silva, enquanto isso,
ajeitaria o seu xale e faria cara de santa do pau oco da floresta.
Teori se antecipou
Sentindo o fedor da tentativa de golpe, Teori passou a noite trabalhando e, em decisão liminar, afastou Cunha da Presidência da Câmara. Ora, uma liminar de Ação Cautelar tem efeito imediato e, portanto, tem precedência sobre ADPF. Assim, os ministros terão de se posicionar sobre a decisão de Teori, que deve ser endossada, e a ADPF fica prejudicada, bem como a tentativa do partido de Marina Silva e, tudo indica, de dois ministros do Supremo ao menos de melar o processo do impeachment.
Sentindo o fedor da tentativa de golpe, Teori passou a noite trabalhando e, em decisão liminar, afastou Cunha da Presidência da Câmara. Ora, uma liminar de Ação Cautelar tem efeito imediato e, portanto, tem precedência sobre ADPF. Assim, os ministros terão de se posicionar sobre a decisão de Teori, que deve ser endossada, e a ADPF fica prejudicada, bem como a tentativa do partido de Marina Silva e, tudo indica, de dois ministros do Supremo ao menos de melar o processo do impeachment.
Instituições
É claro que Cunha está muito bem afastado. Há muito já deveria ter sido cassado. Mas não é menos evidente que o protagonismo do Supremo nesse caso é indesejado.
É claro que Cunha está muito bem afastado. Há muito já deveria ter sido cassado. Mas não é menos evidente que o protagonismo do Supremo nesse caso é indesejado.
Por que o
governo não gostou na decisão de Teori? Porque tirou o palco para o
proselitismo de Marco Aurélio e Lewandowski. Tanto estava o Planalto
preparado para a ação que José Eduardo Cardozo já anunciou que vai usar a
decisão de Teori como base para um novo pedido de anulação do processo
na Câmara. Vai usar e sabe que será malsucedido porque nada na liminar
dá azo a essa possibilidade.
A síntese
das sínteses é esta: ao se antecipar, Teori afastou uma tentativa de
golpe no impeachment desfechada pelo Planalto, com o auxílio luxuoso de
Marco Aurélio, Lewandowski e Marina Silva.
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