quarta-feira, 11 de maio de 2016

Professor de História ou contador de estória?
A questão é a seguinte: se você for educado para acreditar que a Lua é um lugar habitado, vai começar a escrever sobre os tipos de vida que supõe que lá existam, e, para você, isso é um compromisso com a verdade. Quando o indivíduo parte de um ponto torto, chegará a um destino muito mais distorcido. Em outras palavras, se partir de uma mentira, não chegará à verdade, e, quando isso ocorre na História, o professor se torna um contador de estórias, o que não condiz com sua proposta inicial. Por exemplo, se o indivíduo acredita que a mais-valia é um dogma ou, quase isso, não será capaz de estudar economia sem dar tilt.
Não estou dizendo que sou eu que tenho a verdade, longe de mim, pois como escreveu C.S. Lewis, este deve ser um fardo insuportável. Mas digo, sim, que os pressupostos que se baseiam só na luta de classes estão errados, ainda que seja essa luta de classe pós-moderna e colorida que envolve desde gênero às outras fobias criadas nos laboratórios da demência.
Quando o professor relativiza a ditadura soviética dizendo que “não foi bem assim”, não está sendo professor de História, está querendo escrever fábulas. Quando o professor diz que o povo cubano tem outra filosofia de vida que não a “consumista” e, por isso, dirige carros velhos sem se importar, ele estará recitando uma poesia escrita com as tintas da sua paixão ideológica.
Quando você ouvir – como já ouvi – alguém enunciando que em Cuba o povo se preocupa mais com o “social” – palavra mágica – do que com a economia, você não ouve um historiador, mas um mitólogo rudimentar. Sempre que o professor de História disser que o nazismo foi uma ideologia totalitária e apontar o comunismo como algo que “só foi ditatorial porque deturpado”, você não está perante um historiador, mas perante um bardo contemporâneo e desqualificado.
O intrigante disso tudo é que muitos professores desdenham os mitos e fábulas dizendo que isso não passa de mera diversão e, talvez por isso, criem as suas próprias que, por sinal, são bem mais desinteressantes. O problema é que essas ficções criadas por eles nem mesmo podem ser concebidas como divertidas, pois, ao passo que na literatura os mortos podem ressuscitar, na fábula dos ideólogos os mortos, que foram realmente mortos, são enterrados em valas coletivas e abertas pela pá ideológica.
A discussão sobre a influência da subjetividade na historiografia é vasta, é um debate ainda bastante frequente e, claro, indispensável, mas penso que, na prática, muitos historiadores ainda não levam isso a sério.
Dizer que o século XX foi uma era de extremos, como disse o marxista Eric Hobsbawm, é verdade, porém que isso jamais se repetirá como alguns suspeitam, não é. Ainda que neguem que a História seja a “Mestra da Vida”, acreditar nisso é o primeiro passo para que tudo volte a ocorrer. Hoje, na Síria, a humanidade mostra sua face mais bruta, por isso ainda prefiro interpretar a alma humana com pessimismo, sem aquele romantismo rousseauniano do bom selvagem e isso nenhum jacobino com Lattes vai mudar.
No que diz respeito às pressupostos com as quais analisamos a sociedade, o conceito bíblico da “Queda” é, de longe, mais prudente do que a mitologia romântica do “Bom Selvagem”.
Finalmente, para o contador de fábulas, aí, sim, defendo uma revolução, mas uma revolução historiográfica e que, creio firmemente, será recusada por ele. No fim das contas, seria aconselhável ao contador de estórias que se julga cientista, um bom divã para tentar compreender seus próprios ressentimentos e misérias existenciais que, erroneamente, são atribuídos somente ao meio exterior.
Deixem as fábulas para a literatura fantástica, não confundam. No mundo real não há heróis.

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