domingo, 24 de abril de 2016

Imagem de jovens praticando altinho próximo a corpos de vítimas de queda da ciclovia causa perplexidade
Garotos tiravam selfies em frente ao local; quem chegava à praia estendia cadeiras e guarda-sóis ao redor
Caio Barretto Briso - O Globo
Curiosos observam corpos de duas vítimas do acidente na ciclovia Tim Maia enquanto jovens jogam altinho ao fundo - Guilherme Leporace/21-04-2016
RIO - Dezenas de pessoas estavam ao redor dos dois corpos estendidos na areia de São Conrado. Havia um silêncio respeitoso enquanto a viúva do engenheiro Eduardo Marinho se despedia do marido, com a cabeça ensanguentada e o peito rasgado pelo embate nas pedras. Alguns choravam diante do inesperado, naquele feriado de sol no Rio que deveria ser de alegria. Com o passar dos minutos, a cena se tornou bizarra: garotos tiravam selfies em frente aos corpos, e uma roda de altinho logo se formou. Quem chegava à praia estendia cadeiras e guarda-sóis ao redor das duas vítimas. Foram três horas assim, com os corpos cobertos por cangas de praia.
No dia seguinte ao desastre que matou, até o momento, duas pessoas, o mar ainda batia com força na estrutura que não resistiu à ressaca de quinta-feira, produzindo estrondo e temor. A cada onda, o chão naquele trecho do calçadão tremia, embora menos do que na véspera. Muitas pessoas voltaram ao palco da tragédia tentando entender o que se passara. Para algumas, a imagem da roda de futebol ao redor das vítimas só não foi mais chocante do que o desastre em si.
— Isso não é normal. Parece que estamos perdendo a sensibilidade. Tudo é banalizado hoje em dia, até a morte — afirma o médico aposentado Alexander Magalhães, morador de São Conrado.
Os corpos ficaram tanto tempo na areia, debaixo do sol quente, que a maré subiu até alcançá-los. As ondas levavam os cadáveres de um lado para o outro, enquanto curiosos paravam para registrar o momento e publicar nas redes sociais. O estudante Carlos Henrique Pereira, de 16 anos, praticante de bodyboard, foi à praia nos dois dias para aproveitar as ondas grandes. Mal viu os corpos no chão.
— Não parei para ficar olhando. Não gosto dessas coisas, tenho medo de gente morta. Só quero que os culpados sejam punidos — disse o garoto, com um grupo de amigos que lamentava ter “perdido a bagunça” da véspera.
Ciclovia desaba em São Conrado
Parte da ciclovia da Avenida Niemeyer é destruída na altura da Gruta da ImprensaFoto: Custódio Coimbra / O Globo

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