Taimoor Shah e Mujib Mashal - NYT
REUTERS/Ahmad Masood
Agricultor afegão coleta flores da papoula, de onde é extraído o ópio, um poderoso analgésico que é a base da morfina e heroína. A foto foi tirada em uma vila a 500 km de Cabul, capital do Afeganistão
É a primavera que determina como será o ano, segundo um provérbio
afegão. E se os campos de papoulas em Helmand nesta primavera servirem
de amostra o Taleban terá um ano muito bom.
Conforme a colheita do ópio avança pela província de Helmand, a maior do Afeganistão em território e em cultivo de papoula, os agricultores e as autoridades relatam um alto rendimento. Os céus foram generosos com as chuvas fortes, e o governo afegão com o cancelamento das campanhas anuais de erradicação. Ele havia perdido grande parte do território de Helmand para o Taleban, de qualquer modo.
Conforme a colheita do ópio avança pela província de Helmand, a maior do Afeganistão em território e em cultivo de papoula, os agricultores e as autoridades relatam um alto rendimento. Os céus foram generosos com as chuvas fortes, e o governo afegão com o cancelamento das campanhas anuais de erradicação. Ele havia perdido grande parte do território de Helmand para o Taleban, de qualquer modo.
Assim, foi com tranquilidade
que os agricultores e milhares de trabalhadores temporários que viajaram
a Helmand rasparam a cola dos bulbos de ópio. Combatentes do Taleban
estavam ali perto para dar uma mão --e receber sua parcela de salários e
impostos, em dinheiro ou espécie. Os campos lotados pareciam o sonho de
um recrutador rebelde.
"Estamos contentes com a boa colheita este ano, comparada com as dos anos anteriores", disse Abdul Rahim Mutmain, um agricultor no distrito de Musa Qala. Mutmain disse que a produção em seu terreno modesto aumentou quatro vezes, comparada com a de 2015, que foi prejudicada por falhas na colheita e a erradicação do governo.
"Não há preocupação de segurança de que um só trabalhador seja revistado ou roubado pela polícia", disse Mutmain. "Todo o distrito está sob o controle do Taleban e o grosso dos colhedores é Taleban." E acrescentou: "Na verdade, este é o regime Taleban --você pode levar seu narcótico a qualquer lugar ou a qualquer momento em que quiser vendê-lo".
A ONU, que descreveu o comportamento do Taleban como "mais de 'mafiosos' do que de um 'governo à espera'", diz que a insurgência tira grande parte de seu orçamento do comércio de narcóticos, que a agência calcula aproximadamente em US$ 3 bilhões por ano (cerca de R$ 10,6 bilhões).
A história de quão profundamente o Taleban está envolvido no negócio, mesmo no nível agrícola, pode ser contada pelas oscilações da violência desde a colheita da papoula no ano passado.
Durante a maior parte do inverno, os insurgentes perseguiram as forças afegãs em Helmand, infligindo fortes baixas, derrubando postos avançados e até bairros inteiros. A luta alcançou os portões de Lashkar Gah, a capital da província, levando ao combate forças especiais britânicas e americanas.
Então, justamente quando começava a colheita, no final de março e início de abril, as autoridades relataram uma súbita queda nas lutas. Apesar do lançamento oficial pelo Taleban de sua ofensiva anual em 12 de abril, com a violência se intensificando em outras partes do país, Helmand ainda experimenta uma relativa pausa enquanto os últimos bulbos de papoula são raspados.
O período de calma permitiu que o Exército afegão em Helmand tivesse um raro intervalo para treinar e recompor as forças, que sofreram uma dura surra no ano passado. Com índices alarmantes de mortes e postos avançados dominados com facilidade, o 215º Corpo do Exército afegão foi obrigado a abandonar certos distritos, levando o restante das tropas ao quartel-general para um retreinamento coletivo.
Bryan Denton/The New York Times
Agricultores afegãos cultivam a papoula no distrito de Nad Ali, na província de Helmand, no Afeganistão
A missão da Otan liderada pelos EUA no Afeganistão, que foi oficialmente modificada para um papel limitado de treinamento e assistência às forças afegãs, disse que o treinamento em geral está atrasado por causa do ritmo incansável da luta no ano passado.
O Exército foi obrigado a usar recrutas sem instrução simplesmente para preencher a brecha causada pelas baixas e deserções. Agora os militares afegãos e assessores da Otan dizem que tentam se reconcentrar em qualidade, melhor logística e cooperação em um nível de grande unidade.
Durante a temporada de colheita de um mês em Helmand, o Taleban teve coisa melhor a fazer do que lutar: eles lucram de diversas formas com os luxuriantes campos de ópio.
Seus combatentes muitas vezes deixam as armas para trabalhar como diaristas, segundo os agricultores. Eles também coletam o imposto do ópio que impõem em nível local, assim como aguardam a taxa adicional islâmica de 10% sobre a produção agrícola, chamada "ushr". Esse proventos deveriam ir para os necessitados, mas com frequência acabam indo para o Taleban.
Principalmente, a temporada de colheita torna-se um momento de recrutamento do Taleban, com milhares de homens que chegam de todo o país frustrados com a falta de oportunidade de trabalho.
"A colheita da papoula é um bom momento para o Taleban interagir com novos indivíduos --o melhor momento para recrutar", disse Bashir Ahmad Shakir, chefe do comitê de segurança no Conselho Provincial de Helmand.
Abdul Jabar Qahraman, o representante do governo afegão no comando dos combates em Helmand, disse que o Taleban faz campanha "24 horas" para recrutar entre os 15 mil trabalhadores, na maioria jovens desempregados, que chegam a Helmand para a temporada de colheita.
Ele disse que o governo prendeu cerca de 700 trabalhadores para perturbar a colheita, mas eles foram libertados dias depois, exceto por um pequeno número de suspeitos de ser membros do Taleban.
"A guerra no Afeganistão não é uma guerra de ideologia, mas de benefícios financeiros", disse Qahraman.
"As papoulas sustentam o Taleban financeiramente", acrescentou ele. "Os comandantes Taleban enchem os bolsos de dinheiro. Quando eles recebem o dinheiro e ficam satisfeitos, preparam-se para lutar."
Mas Zabiullah Mujahid, um porta-voz do Taleban, disse que o cultivo de ópio é uma questão regional e "tradicional", que dá à população a renda de que precisa para o resto do ano.
"A plantação de papoula não tem nada a ver conosco, e nesse ambiente de conflito não podemos evitá-la", disse Mujahid. "É natural que em certas áreas os combatentes do Taleban sejam residentes e tenham necessidades familiares. Talvez para suprir essas necessidades eles participem da colheita. Mas não é um trabalho formal do nosso lado."
Pense no 1,6 hectare de Mutmain no distrito de Musa Qala. Neste ano, ele disse que colheu cerca de 40 quilos de ópio cru, comparados com cerca de 13 kg em 2,4 hectares no ano passado. Dos 25 trabalhadores que ele contratou para os 15 dias de coleta da resina,
Mutmain disse que dez eram membros ativos do Taleban que tiraram uma folga para a colheita. Os demais eram jovens de outras províncias, na maioria de áreas vizinhas.
"Você sabe, eles se tornam bons amigos. Passam pelo menos 12 ou 15 dias juntos, o que basta para criar confiança", disse Mutmain. Os combatentes Taleban contam "histórias de coragem, como eles conseguem explodir veículos blindados" e arrasar postos de controle.
"Esse tipo de história realmente impressiona os novatos, e alguns vão com eles para os campos de batalha", disse Mutmain.
Como vive a certa distância de seus campos, Mutmain constrói cabanas improvisadas para os trabalhadores descansarem à tarde e dormirem à noite. Ele também contratou um cozinheiro que serviu feijão, ervilha e a tradicional bebida de iogurte do sul, "shrumbai".
Logo depois que a colheita terminou, um coletor de impostos Taleban chegou com um caderno e uma testemunha, disse Mutmain. Às vezes os agricultores precisam mostrar para inspeção os sacos de ópio que colheram, cada um pesando cerca de 5 kg. Mas na maioria das vezes o Taleban aceita sua palavra.
"Ou você lhes paga pelo preço real, ou em narcótico", disse Mutmain sobre o imposto. Ele pagou em dinheiro, o equivalente a US$ 400 (cerca de R$ 1.400,00).
Muitos em Helmand temem que haja um ano de duros combates à frente, agora que a máquina rebelde está abastecida com dinheiro novo e novos combatentes.
"As forças militares afegãs em Helmand estão se preparando para enfrentar o verão mais duro de lutas", disse Shakir, o membro do conselho provincial.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
"Estamos contentes com a boa colheita este ano, comparada com as dos anos anteriores", disse Abdul Rahim Mutmain, um agricultor no distrito de Musa Qala. Mutmain disse que a produção em seu terreno modesto aumentou quatro vezes, comparada com a de 2015, que foi prejudicada por falhas na colheita e a erradicação do governo.
"Não há preocupação de segurança de que um só trabalhador seja revistado ou roubado pela polícia", disse Mutmain. "Todo o distrito está sob o controle do Taleban e o grosso dos colhedores é Taleban." E acrescentou: "Na verdade, este é o regime Taleban --você pode levar seu narcótico a qualquer lugar ou a qualquer momento em que quiser vendê-lo".
A ONU, que descreveu o comportamento do Taleban como "mais de 'mafiosos' do que de um 'governo à espera'", diz que a insurgência tira grande parte de seu orçamento do comércio de narcóticos, que a agência calcula aproximadamente em US$ 3 bilhões por ano (cerca de R$ 10,6 bilhões).
A história de quão profundamente o Taleban está envolvido no negócio, mesmo no nível agrícola, pode ser contada pelas oscilações da violência desde a colheita da papoula no ano passado.
Durante a maior parte do inverno, os insurgentes perseguiram as forças afegãs em Helmand, infligindo fortes baixas, derrubando postos avançados e até bairros inteiros. A luta alcançou os portões de Lashkar Gah, a capital da província, levando ao combate forças especiais britânicas e americanas.
Então, justamente quando começava a colheita, no final de março e início de abril, as autoridades relataram uma súbita queda nas lutas. Apesar do lançamento oficial pelo Taleban de sua ofensiva anual em 12 de abril, com a violência se intensificando em outras partes do país, Helmand ainda experimenta uma relativa pausa enquanto os últimos bulbos de papoula são raspados.
O período de calma permitiu que o Exército afegão em Helmand tivesse um raro intervalo para treinar e recompor as forças, que sofreram uma dura surra no ano passado. Com índices alarmantes de mortes e postos avançados dominados com facilidade, o 215º Corpo do Exército afegão foi obrigado a abandonar certos distritos, levando o restante das tropas ao quartel-general para um retreinamento coletivo.
Bryan Denton/The New York Times
Agricultores afegãos cultivam a papoula no distrito de Nad Ali, na província de Helmand, no Afeganistão
A missão da Otan liderada pelos EUA no Afeganistão, que foi oficialmente modificada para um papel limitado de treinamento e assistência às forças afegãs, disse que o treinamento em geral está atrasado por causa do ritmo incansável da luta no ano passado.
O Exército foi obrigado a usar recrutas sem instrução simplesmente para preencher a brecha causada pelas baixas e deserções. Agora os militares afegãos e assessores da Otan dizem que tentam se reconcentrar em qualidade, melhor logística e cooperação em um nível de grande unidade.
Durante a temporada de colheita de um mês em Helmand, o Taleban teve coisa melhor a fazer do que lutar: eles lucram de diversas formas com os luxuriantes campos de ópio.
Seus combatentes muitas vezes deixam as armas para trabalhar como diaristas, segundo os agricultores. Eles também coletam o imposto do ópio que impõem em nível local, assim como aguardam a taxa adicional islâmica de 10% sobre a produção agrícola, chamada "ushr". Esse proventos deveriam ir para os necessitados, mas com frequência acabam indo para o Taleban.
Principalmente, a temporada de colheita torna-se um momento de recrutamento do Taleban, com milhares de homens que chegam de todo o país frustrados com a falta de oportunidade de trabalho.
"A colheita da papoula é um bom momento para o Taleban interagir com novos indivíduos --o melhor momento para recrutar", disse Bashir Ahmad Shakir, chefe do comitê de segurança no Conselho Provincial de Helmand.
Abdul Jabar Qahraman, o representante do governo afegão no comando dos combates em Helmand, disse que o Taleban faz campanha "24 horas" para recrutar entre os 15 mil trabalhadores, na maioria jovens desempregados, que chegam a Helmand para a temporada de colheita.
Ele disse que o governo prendeu cerca de 700 trabalhadores para perturbar a colheita, mas eles foram libertados dias depois, exceto por um pequeno número de suspeitos de ser membros do Taleban.
"A guerra no Afeganistão não é uma guerra de ideologia, mas de benefícios financeiros", disse Qahraman.
"As papoulas sustentam o Taleban financeiramente", acrescentou ele. "Os comandantes Taleban enchem os bolsos de dinheiro. Quando eles recebem o dinheiro e ficam satisfeitos, preparam-se para lutar."
Mas Zabiullah Mujahid, um porta-voz do Taleban, disse que o cultivo de ópio é uma questão regional e "tradicional", que dá à população a renda de que precisa para o resto do ano.
"A plantação de papoula não tem nada a ver conosco, e nesse ambiente de conflito não podemos evitá-la", disse Mujahid. "É natural que em certas áreas os combatentes do Taleban sejam residentes e tenham necessidades familiares. Talvez para suprir essas necessidades eles participem da colheita. Mas não é um trabalho formal do nosso lado."
Pense no 1,6 hectare de Mutmain no distrito de Musa Qala. Neste ano, ele disse que colheu cerca de 40 quilos de ópio cru, comparados com cerca de 13 kg em 2,4 hectares no ano passado. Dos 25 trabalhadores que ele contratou para os 15 dias de coleta da resina,
Mutmain disse que dez eram membros ativos do Taleban que tiraram uma folga para a colheita. Os demais eram jovens de outras províncias, na maioria de áreas vizinhas.
"Você sabe, eles se tornam bons amigos. Passam pelo menos 12 ou 15 dias juntos, o que basta para criar confiança", disse Mutmain. Os combatentes Taleban contam "histórias de coragem, como eles conseguem explodir veículos blindados" e arrasar postos de controle.
"Esse tipo de história realmente impressiona os novatos, e alguns vão com eles para os campos de batalha", disse Mutmain.
Como vive a certa distância de seus campos, Mutmain constrói cabanas improvisadas para os trabalhadores descansarem à tarde e dormirem à noite. Ele também contratou um cozinheiro que serviu feijão, ervilha e a tradicional bebida de iogurte do sul, "shrumbai".
Logo depois que a colheita terminou, um coletor de impostos Taleban chegou com um caderno e uma testemunha, disse Mutmain. Às vezes os agricultores precisam mostrar para inspeção os sacos de ópio que colheram, cada um pesando cerca de 5 kg. Mas na maioria das vezes o Taleban aceita sua palavra.
"Ou você lhes paga pelo preço real, ou em narcótico", disse Mutmain sobre o imposto. Ele pagou em dinheiro, o equivalente a US$ 400 (cerca de R$ 1.400,00).
Muitos em Helmand temem que haja um ano de duros combates à frente, agora que a máquina rebelde está abastecida com dinheiro novo e novos combatentes.
"As forças militares afegãs em Helmand estão se preparando para enfrentar o verão mais duro de lutas", disse Shakir, o membro do conselho provincial.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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