A Alemanha deveria assumir a liderança em um compromisso sobre disciplina, refugiados e acesso ao gás russo
Norbert Röttgen - TINYT
EPA/BERND VON JUTRCZENKA
Refugiado faz selfie com a chanceler (premiê) alemã, Angela Merkel
Depois do horror em Bruxelas, a Europa está mais uma vez enlutada. Com razão, os Estados da União Europeia também se concentram em levar os perpetradores à Justiça e evitar um ataque na sequência. Cooperar mais efetivamente no contraterrorismo e reforçar a segurança nos aeroportos e estações de trem seria um bom começo.
Mas não devemos perder de
vista o quadro maior. O objetivo do Estado Islâmico em Bruxelas foi nos
assustar e inserir uma cunha entre nós, e parece que está tendo êxito.
Aqui na Alemanha, e em todo o continente, os partidos de direita
contrários à imigração pedem que seus países se voltem para dentro,
afastando-se uns dos outros.
Na Itália, a Liga Norte, anti-imigrantes, quer um fechamento imediato das fronteiras e das mesquitas. A primeira-ministra da Polônia, Beata Szydlo, duvida que seu país de 40 milhões de habitantes possa cumprir sua promessa de receber 400 refugiados este ano. Enquanto isso, Nigel Farage, chefe do Partido da Independência do Reino Unido, sugere que os atentados provam que seu país estaria mais seguro fora da UE.
Esses apelos à emoção fazem o jogo dos terroristas exatamente quando o que a Europa deve fazer é enfrentar seus desafios comuns com uma nova unidade interna e uma nova disposição a atuar no Oriente Médio.
A Europa precisa de um compromisso abrangente, e meu próprio país, a Alemanha, deveria dar o exemplo.
A Alemanha não pode pedir solidariedade na questão dos refugiados sem ceder terreno nas questões econômicas e energéticas que dividem a UE. Concretamente, isso significa aceitar deficits orçamentários que ultrapassam os limites da UE em países como França e Itália, que sofrem alto desemprego entre os jovens.
Também significa reavaliar planos para expandir o sistema de oleodutos Nord Stream, que vai da Rússia à Alemanha, contornando a Polônia e outros países do leste, que veem nisto uma ameaça à sua segurança energética. Somente fazendo concessões nessas áreas poderemos criar a base para um compromisso sobre aceitação dos refugiados que inclua uma justa distribuição de asilados por toda a UE.
Quanto ao Oriente Médio, é importante não confundir a questão de como tratar as pessoas que fogem da guerra e do terror na Síria, no Iraque ou no Afeganistão com a de como combater os militantes radicais que recebem inspiração e treinamento nesses países. E é importante lembrar que os ataques em Bruxelas, assim como os de Paris em novembro passado, parecem ter sido cometidos por cidadãos de países europeus.
Derrotar essa ameaça interna exige alcançar as comunidades muçulmanas que se sentem marginalizadas, com um grande número de jovens que, sem ver perspectiva, são atraídos pelo jihadismo.
No entanto, está claro que os acontecimentos no Oriente Médio podem afetar nossa estabilidade. Nossas disputas sobre como tratar os solicitantes de asilo estão desgastando a unidade da Europa como nunca antes. E justamente quando os acontecimentos no Oriente Médio confrontam a Europa com enormes desafios a enfrentar como um todo, a região torna-se menos vital para os EUA.
No mês passado, o jornalista Jeffrey Goldberg escreveu na revista "The Atlantic" que para o presidente Obama o Oriente Médio não é mais terrivelmente importante para os interesses americanos, nem reage positivamente aos esforços americanos para melhorá-lo, e portanto é um lugar onde os EUA arriscam sua credibilidade e poder quando seu esforços levam à guerra e a mortes de americanos.
Essa é uma avaliação compartilhada por muitos americanos; ela reflete antigas tendências como a crescente independência dos EUA do petróleo do Oriente Médio, o desafio comparativamente maior representado pela ascensão da China e a crescente importância econômica da Ásia e da América Latina.
Por isso, a suposição de que os EUA assumirão a liderança em todos os problemas está defasada. Se os europeus não estiverem preparados para assumir maior responsabilidade, o Ocidente poderá perder sua capacidade de moldar os acontecimentos no Oriente Médio.
Primeiro, a UE deve estar disposta a comprometer mais dinheiro na
região. Devemos melhorar as condições nos campos de refugiados em países
como Jordânia e Líbano, onde um euro rende até 30 vezes mais que na
Alemanha. Devemos investir mais no futuro econômico da região,
especialmente na jovem democracia da Tunísia. Se os jovens
norte-africanos virem estabilidade e prosperidade em suas próprias
comunidades, é provável que sintam muito menos pressão para emigrar.
Segundo, a Europa precisa de uma política unificada para o Oriente Médio, que cuide de nossa própria segurança. Não nos faltam instituições. Sofremos sobretudo de uma falta de vontade e uma relutância em descartar ideias antiquadas de prestígio nacional na política externa. Porque os países membros individuais frequentemente agem sozinhos, nossa união de 500 milhões de pessoas perde a força.
Por exemplo, uma recente proposta francesa de reiniciar as negociações de paz israelo-palestinas, com o objetivo de uma solução de dois Estados, seria mais forte se viesse do chamado E4+1, que reúne França, Reino Unido, Itália, Alemanha e o alto representante da UE para Relações Exteriores.
Esse grupo precisa ter um papel permanente nos assuntos do Oriente Médio. Sua primeira ordem de ação seria trabalhar com os EUA para convencer a Rússia a desistir de usar seu veto e permitir a criação de zonas humanitárias na Síria sob mandato da ONU. Como essas zonas precisarão de proteção militar, a Europa teria de apoiar sua iniciativa diplomática contribuindo com tropas para uma missão de paz internacional.
A Líbia também exige maior envolvimento político e militar. O treinamento e apoio europeu às forças locais mais moderadas poderia ser uma contribuição vital para conter o caos em um país que fica a apenas 480 km do solo italiano.
Finalmente, a nova realidade exige que preservemos a validade da parceria transatlântica no século 21. Mais ajuda dos EUA na questão dos refugiados --basicamente aceitando mais refugiados-- seria muito bem-vinda. Ao mesmo tempo, os políticos europeus devem dizer a seus eleitores que, na medida em que os EUA se afastarem do Oriente Médio, a Europa terá de suportar um fardo maior, porque há muito em jogo para nós.
No final, é claro, a Europa não será capaz de solucionar todos os problemas sozinha. Os EUA continuarão sendo uma força importante no Oriente Médio e na Europa, e o Ocidente precisará trabalhar em conjunto para garantir os interesses comuns vitais dos dois lados do Atlântico --por exemplo, que o Irã cumpra os termos do acordo nuclear e que uma nova Rússia assertiva seja contida.
Nada disso será fácil, mas não acredito que temos outra opção. Pois as bombas que explodiram na Bélgica em 22 de março visavam não apenas a população de Bruxelas, mas a unidade e os ideais europeus. Não podemos permitir que o terrorismo destrua a unidade da Europa.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Na Itália, a Liga Norte, anti-imigrantes, quer um fechamento imediato das fronteiras e das mesquitas. A primeira-ministra da Polônia, Beata Szydlo, duvida que seu país de 40 milhões de habitantes possa cumprir sua promessa de receber 400 refugiados este ano. Enquanto isso, Nigel Farage, chefe do Partido da Independência do Reino Unido, sugere que os atentados provam que seu país estaria mais seguro fora da UE.
Esses apelos à emoção fazem o jogo dos terroristas exatamente quando o que a Europa deve fazer é enfrentar seus desafios comuns com uma nova unidade interna e uma nova disposição a atuar no Oriente Médio.
A Europa precisa de um compromisso abrangente, e meu próprio país, a Alemanha, deveria dar o exemplo.
A Alemanha não pode pedir solidariedade na questão dos refugiados sem ceder terreno nas questões econômicas e energéticas que dividem a UE. Concretamente, isso significa aceitar deficits orçamentários que ultrapassam os limites da UE em países como França e Itália, que sofrem alto desemprego entre os jovens.
Também significa reavaliar planos para expandir o sistema de oleodutos Nord Stream, que vai da Rússia à Alemanha, contornando a Polônia e outros países do leste, que veem nisto uma ameaça à sua segurança energética. Somente fazendo concessões nessas áreas poderemos criar a base para um compromisso sobre aceitação dos refugiados que inclua uma justa distribuição de asilados por toda a UE.
Quanto ao Oriente Médio, é importante não confundir a questão de como tratar as pessoas que fogem da guerra e do terror na Síria, no Iraque ou no Afeganistão com a de como combater os militantes radicais que recebem inspiração e treinamento nesses países. E é importante lembrar que os ataques em Bruxelas, assim como os de Paris em novembro passado, parecem ter sido cometidos por cidadãos de países europeus.
Derrotar essa ameaça interna exige alcançar as comunidades muçulmanas que se sentem marginalizadas, com um grande número de jovens que, sem ver perspectiva, são atraídos pelo jihadismo.
No entanto, está claro que os acontecimentos no Oriente Médio podem afetar nossa estabilidade. Nossas disputas sobre como tratar os solicitantes de asilo estão desgastando a unidade da Europa como nunca antes. E justamente quando os acontecimentos no Oriente Médio confrontam a Europa com enormes desafios a enfrentar como um todo, a região torna-se menos vital para os EUA.
No mês passado, o jornalista Jeffrey Goldberg escreveu na revista "The Atlantic" que para o presidente Obama o Oriente Médio não é mais terrivelmente importante para os interesses americanos, nem reage positivamente aos esforços americanos para melhorá-lo, e portanto é um lugar onde os EUA arriscam sua credibilidade e poder quando seu esforços levam à guerra e a mortes de americanos.
Essa é uma avaliação compartilhada por muitos americanos; ela reflete antigas tendências como a crescente independência dos EUA do petróleo do Oriente Médio, o desafio comparativamente maior representado pela ascensão da China e a crescente importância econômica da Ásia e da América Latina.
Por isso, a suposição de que os EUA assumirão a liderança em todos os problemas está defasada. Se os europeus não estiverem preparados para assumir maior responsabilidade, o Ocidente poderá perder sua capacidade de moldar os acontecimentos no Oriente Médio.
Atentados terroristas na Bélgica
29.mar.2016
- Divulgadas novas fotos do aeroporto de Zaventem, em Bruxelas, na
Bélgica, após as explosões terroristas que aconteceram há exatamente uma
semana. Os ataques no aeroporto internacional e no metrô foram
executados por quatro cidadãos belgas de origem estrangeira. Dois deles
detonaram os explosivos que carregavam no saguão do aeroporto. A polícia
busca um terceiro homem que teria participado do ataque - Reuters
Como os europeus devem se adaptar? Como devemos reagir a essa mudança de paradigma?
Segundo, a Europa precisa de uma política unificada para o Oriente Médio, que cuide de nossa própria segurança. Não nos faltam instituições. Sofremos sobretudo de uma falta de vontade e uma relutância em descartar ideias antiquadas de prestígio nacional na política externa. Porque os países membros individuais frequentemente agem sozinhos, nossa união de 500 milhões de pessoas perde a força.
Por exemplo, uma recente proposta francesa de reiniciar as negociações de paz israelo-palestinas, com o objetivo de uma solução de dois Estados, seria mais forte se viesse do chamado E4+1, que reúne França, Reino Unido, Itália, Alemanha e o alto representante da UE para Relações Exteriores.
Esse grupo precisa ter um papel permanente nos assuntos do Oriente Médio. Sua primeira ordem de ação seria trabalhar com os EUA para convencer a Rússia a desistir de usar seu veto e permitir a criação de zonas humanitárias na Síria sob mandato da ONU. Como essas zonas precisarão de proteção militar, a Europa teria de apoiar sua iniciativa diplomática contribuindo com tropas para uma missão de paz internacional.
A Líbia também exige maior envolvimento político e militar. O treinamento e apoio europeu às forças locais mais moderadas poderia ser uma contribuição vital para conter o caos em um país que fica a apenas 480 km do solo italiano.
Finalmente, a nova realidade exige que preservemos a validade da parceria transatlântica no século 21. Mais ajuda dos EUA na questão dos refugiados --basicamente aceitando mais refugiados-- seria muito bem-vinda. Ao mesmo tempo, os políticos europeus devem dizer a seus eleitores que, na medida em que os EUA se afastarem do Oriente Médio, a Europa terá de suportar um fardo maior, porque há muito em jogo para nós.
No final, é claro, a Europa não será capaz de solucionar todos os problemas sozinha. Os EUA continuarão sendo uma força importante no Oriente Médio e na Europa, e o Ocidente precisará trabalhar em conjunto para garantir os interesses comuns vitais dos dois lados do Atlântico --por exemplo, que o Irã cumpra os termos do acordo nuclear e que uma nova Rússia assertiva seja contida.
Nada disso será fácil, mas não acredito que temos outra opção. Pois as bombas que explodiram na Bélgica em 22 de março visavam não apenas a população de Bruxelas, mas a unidade e os ideais europeus. Não podemos permitir que o terrorismo destrua a unidade da Europa.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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