terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

COMO A ALEMANHA VÊ A CRISE GREGA

Europa está jogando dinheiro em um poço sem fundo
David Crossland - Der Spiegel
Um ministro alemão rompeu com o discurso oficial do governo dizendo que a Grécia deveria ser estimulada a deixar o euro. O comentário feito ao “Spiegel” ocorreu pouco antes de uma votação parlamentar na segunda-feira (27) sobre o segundo pacote de resgate. Alguns jornais, inclusive o tabloide “Bild”, concordam que é hora de a Grécia partir.
A votação parlamentar alemã do segundo pacote de resgate para a Grécia foi manchada por um questionamento de dentro da coalizão de centro-direita da chanceler Angela Merkel sobre a sabedoria em dar mais ajuda ao país, com o ministro do interior, Hans-Peter Friedrich, dizendo que a Grécia deveria ser estimulada a deixar o euro.
Em entrevista ao “Spiegel” publicada na segunda-feira, Friedrich disse: “As chances da Grécia se regenerar e se tornar competitiva certamente são maiores fora da união monetária do que se permanecer na zona do euro”. Ele acrescentou que não apoiava uma saída forçada. “Não estou falando em expulsar a Grécia, e sim em criar incentivos irrecusáveis para sua saída”. Foi a primeira vez que um membro do governo alemão pediu que a Grécia deixasse a moeda comum.
Uma pesquisa de opinião publicada no “Bild am Sonntag” no domingo mostrou que a maioria dos alemães concorda com Friedrich, que é membro da União Social Cristã (CSU), partido da Bavária associado ao partido conservador de Merkel, a União Democrática Cristã.
De acordo com uma pesquisa de opinião conduzida pela Emnid, 62% dos entrevistados disseram que queriam que a votação parlamentar desse “não” na tarde da segunda-feira (27). Somente 33% foram a favor. Quase dois terços disseram que estavam convencidos que a Grécia não poderia ser salva da falência. É quase certo que o parlamento aprovará o pacote de $130 bilhões de euros (em torno de R$ 300 bilhões) porque os Sociais Democratas e os Verdes, da oposição, disseram que vão ficar ao lado da coalizão e votar em favor da ajuda.
O comentário de Friedrich gerou críticas de seus parceiros na coalizão assim como da oposição.
O ministro de relações exteriores, Guido Westerwelle, membro do Partido Democrático Livre (FDP), que é voltado para os empresários e é parceiro júnior da coalizão de Merkel, disse ao jornal “Die Welt” na segunda-feira: “Não entendo a especulação política sobre a Grécia sair da zona do euro. O que foi negociado e concordado deve ser aplicado, dos dois lados”.
O líder da oposição parlamentar do Partido Verde, Jürgen Trittin, chamou os comentários de Friedrich de “absurdos” e pediu que Merkel restaurasse a ordem em suas fileiras. “Me pergunto quanto tempo a chanceler vai ficar olhando o que acontece em sua coalizão”, disse ele à rádio pública “Deutschlandfunk”.
“É um questão difícil, e ninguém sabe se terá sucesso”, disse Trittin, referindo-se ao resgate. “Mas se não tomarmos esse passo hoje, o fracasso será garantido”.
Os Sociais Democratas emitiram uma declaração dizendo: “O CSU está completamente fora de controle”.
Os comentadores da mídia alemã estão divididos sobre a Grécia. Mas o jornal de circulação em massa “Bild”, um barômetro confiável do sentimento público alemão, foi fortemente contra o resgate na segunda-feira. A manchete “Pare!” na capa apela aos legisladores para que não aprovem o pacote. Também traz pequenas declarações de importantes economistas alemães, dizendo que a ajuda não vai resolver os problemas da Grécia e exortando o país a deixar o euro.
Em seu editorial, o “Bild” diz:
“Em um total contrassenso, a Europa está jogando dinheiro em um poço sem fundo. A Europa só pode dominar esta crise se fizer o que a maior parte dos especialistas está pedindo há muito tempo. A economia grega só pode se tornar competitiva e voltar a crescer com sua própria moeda -não com o euro forte. Continuar com as receitas antigas não vai funcionar. Por isso que a votação parlamentar de hoje vai ser ruim para a Grécia, ruim para a Alemanha e ruim para a Europa.”
O “Berliner Zeitung”, de esquerda, escreve:
“Sejamos realistas. A Grécia não vai conseguir andar com as próprias pernas com o segundo pacote de resgate. O corte da dívida planejado não será suficiente, as reformas não estão sendo feitas, e o país está quebrando sob o peso dos programas de austeridade.”
“Nem mesmo o ministro das finanças, Wolfgang Schäuble, elimina a possibilidade de novos pacotes de resgate serem necessários em breve. A Grécia não tem um instrumento importante para restaurar sua saúde: sua própria moeda. Se Atenas tivesse sua moeda, o país poderia desvalorizar seu dinheiro para se tornar mais barato no mercado mundial. Uma moeda fraca pode funcionar como um enorme estímulo econômico.”
“A saída da Grécia da zona do euro não terminaria com a solidariedade da UE para com a Grécia. Isso porque a Grécia ainda contaria com a ajuda de seus parceiros da UE. O resgate poderia se tornar mais barato e, muito mais importante, menos doloroso para os gregos”.
O conservador “Frankfurter Allgemeine Zeitung” escreve:
“Se a Grécia partir, vai retroceder 12 anos, para o ano 2000 -e quantos anos os outros membros da zona do euro voltarão no tempo? Seria uma prova de que não são capazes de objetivamente avaliar o pedido de ingresso de um país na zona do euro (o que tornaria qualquer futura expansão da zona do euro questionável); que são incapazes de ajudar até mesmo um pequeno parceiro (muito menos um país maior) e que não podem tornar irreversível a realização de suas visões políticas.”
“Isso não apenas causaria 'Schadenfreude' entre os competidores mundiais, mas levantaria a questão se o ingresso na UE é final ou se alguns países não seriam mais sábios em buscar outra direção, como Moscou ou Teerã.”
Se a permanência na UE fosse abalada em sua fundação, essa parte do mundo não voltaria para 2011 ou 2001, mas para os anos 90, ou 80, ou até mais para trás.”
Tradutor: Deborah Weinberg

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