A OAB e as bancas estrangeiras
O Estado de S.Paulo - Editorial
Desde que os escritórios americanos e ingleses de advocacia manifestaram interesse em se instalar no Brasil, para assessorar empresas internacionais interessadas em participar das licitações e parcerias para a exploração do pré-sal e para as obras de infraestrutura da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016, escritórios brasileiros passaram a se mobilizar para garantir a exclusividade do mercado interno de serviços legais.
No ano passado, o Conselho Federal da OAB puniu um escritório de dois advogados brasileiros que funcionava como fachada para uma firma de Miami. Em 2010, respondendo a uma consulta formulada pela associação das grandes firmas nacionais, já havia reafirmado a proibição para associações e parcerias entre escritórios brasileiros e estrangeiros. A restrição havia sido imposta por um provimento baixado pela entidade em 2000. Ele permite que as firmas internacionais atuem apenas em consultoria de direito estrangeiro e considera nulos atos praticados por advogados não inscritos na OAB. Em 2010, havia 16 escritórios estrangeiros registrados na entidade.
Para tornar o mercado ainda mais restrito para esses escritórios, a OAB estuda a possibilidade de substituir esse provimento por outro ainda mais severo. Elaborado por um sócio do Siqueira Castro Advogados, uma das principais bancas do País, o projeto deverá ser votado até março pela Comissão de Relações Internacionais da OAB e, depois, encaminhado para o Conselho Federal da Ordem.
Pelo projeto, que foi divulgado pelo jornal Valor, os escritórios de advocacia ficam proibidos de usar expressões como "associado a" ou "em cooperação com" uma banca internacional, de imprimir cartões de visita e material de comunicação em comum e de compartilhar andares de um prédio. O projeto também veda associações que acarretem "perda ou diminuição da entidade institucional ou da autonomia da gestão administrativa, financeira, profissional ou de planejamento estratégico por parte das sociedades brasileiras".
Além disso, o projeto proíbe a realização de eventos jurídicos em conjunto e o compartilhamento de bancos de dados, listas de clientes, sistemas de informação, planos de carreiras e política de remuneração. Ficam proibidos, ainda, acordos formais e informais que envolvam divisão de despesas e investimentos, participação nos lucros e transferência de participação no capital social dos escritórios brasileiros.
Pelo projeto, os escritórios brasileiros que desrespeitarem essas regras ficarão sujeitos a processo disciplinar e sanções administrativas, civis e penais. Já as firmas internacionais terão sua autorização cassada e não poderão mais atuar nem como consultoras de direito estrangeiro. "Está claro que não se poderá abrir o mercado de trabalho para que os estrangeiros venham para cá fazer advocacia judicial, como estão querendo", diz o presidente da OAB, Ophir Cavalcante.
Ao vetar a entrada de escritórios estrangeiros no País, a OAB quer garantir a reserva de mercado para seus filiados. É seu papel. O problema é que a maioria dos advogados não tem condições de atender às demandas das empresas estrangeiras. Para os escritórios estrangeiros e as firmas nacionais que têm interesse na abertura do mercado de serviços legais, o protecionismo da OAB é incompatível com uma economia aberta como a brasileira. Se as empresas multinacionais podem atuar no Brasil e os grupos brasileiros podem atuar no mundo inteiro, o que justifica o veto aos escritórios de advocacia estrangeiros?
A abertura do setor de serviços legais é o desdobramento da globalização da economia, da expansão dos tribunais internacionais e da proliferação de novos mecanismos de resolução de conflitos, como os centros de arbitragem. A curto prazo, a OAB poderá ter sucesso, na preservação do mercado interno para seus filiados. Mas, por envolver grandes interesses econômicos e políticos, essa discussão a médio prazo será deslocada para os organismos multilaterais - e a posição deles é oposta à da OAB.
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