EUA e Irã podem cooperar para salvar o Iraque de extremistas sunitas
Apesar de décadas de hostilidade, Teerã e Washington devem fazer um esforço de cooperação
Mohammad Ali Shabani - TINYT
Para salvar o Iraque de extremistas sunitas, o Irã está mobilizando
seus aliados no Iraque e promovendo a colaboração entre o governo do
Iraque e da Síria. Washington, por sua vez, enviou assessores militares
para Bagdá. Esses esforços são corajosos. Mas, sem coordenação, não
serão frutíferos.
O Iraque, até recentemente, era um campo de
batalha entre o Irã e os Estados Unidos. Uma série de comandantes
militares norte-americanos competiu por influência com o general Qassim
Suleimani, chefe de operações exteriores da Guarda Revolucionária
Islâmica do Irã. No auge da ocupação americana, meia dúzia de iranianos
no Iraque exerciam mais poder do que os 150 mil soldados
norte-americanos no país.
Apesar de seu passado de desavenças,
os dois países agora podem salvar o Iraque, se agirem em conjunto. A
história tem mostrado que o Irã e os Estados Unidos são capazes de
afastar o Iraque do abismo. A guerra civil que assolou o país de 2006 a
2008 oferece lições de como deter o atual derramamento de sangue.
Naquela época, o Irã era o único país que podia pressionar a Síria para
bloquear o oleoduto jihadista sunita, enquanto segurava os esquadrões
da morte xiitas empenhados em livrar a capital iraquiana de sunitas. E
os Estados Unidos, como potência ocupante, foi capaz de se aproximar e
cooptar tribos sunitas rebeldes. Sem coordenação, estes esforços teriam
falhado.
O chefe do Conselho Islâmico Supremo do Iraque na
época, Abdul Aziz al-Hakim, e o presidente Jalal Talabani esforçaram-se
para conseguir que Washington e Teerã a trabalhassem juntos. Apesar do
colapso das negociações nucleares que então ocorriam entre o Irã e a
União Europeia, os Estados Unidos e o Irã conseguiram cooperar.
O primeiro passo crucial para acabar com a violência foi o apoio tácito
americano-iraniano a Nuri Kamal al-Maliki. Depois de se tornar
primeiro-ministro, Maliki devolveu o favor. Dentro de um ano de sua
inauguração, no verão de 2007, diplomatas iranianos e americanos
reuniram-se em seu escritório –a primeira reunião de alto nível entre os
dois adversários em quase 30 anos.
Hakim e Talabani não estão
mais no cenário político. Mas Maliki sim. Apesar de suas tendências
autoritárias e de sua incapacidade de integrar os sunitas no processo
político, ele continua a ser o político iraquiano menos impopular hoje.
Seu sucesso na eleição 30 de abril é prova disso.
Além disso,
tanto o Irã quanto os Estados Unidos ainda concordam em manter Maliki no
poder – em grande parte por falta de opção melhor. Apesar dos rumores
no Congresso, o secretário de Defesa Chuck Hagel afirmou que "a
possibilidade de renúncia de Maliki é um assunto interno iraquiano". E o
presidente Obama não hesitou em enviar seus militares de volta para o
Iraque.
O resultado da ofensiva sunita é previsível. O EIIL
(sigla em inglês para Estado Islâmico do Iraque e do Levante) será
incapaz de manter e governar o território capturado porque os iraquianos
sunitas não estão de acordo com as visões de Estado e sociedade
defendidas pelo EIIL. Prova disso é o sucesso anterior dos EUA em levar
alguns sunitas iraquianos a se voltarem contra os militantes
extremistas, e Maliki sabe disso. Embora a integração política sunita
seja crucial, a violência não deve ser recompensada com concessões. O
EIIL e seus aliados devem ser repelidos dos grandes centros urbanos e
dos postos de fronteira antes de qualquer negociação com militantes
pragmáticos.
Os sunitas do Iraque devem aceitar a realidade da nova ordem política
do país, que é dominado por xiitas e curdos, ou condenarem-se à
instabilidade e à violência perene causada por extremistas internos e
estrangeiros que se uniram aos militantes locais.
Os curdos
também enfrentam escolhas difíceis. Durante anos eles viveram na zona
cinzenta entre a independência e o federalismo. Os Estados Unidos e o
Irã devem convencer os líderes curdos que qualquer uso da atual
turbulência para obter concessões de Bagdá em questões como exportações
independentes de petróleo e o futuro da cidade disputada de Kirkuk vai
sair pela culatra. Washington está relutando em tomar partido entre
Erbil e Bagdá. Se isso acontecer, contudo, é improvável que vá
antagonizar Maliki. Nem tampouco Teerã.
O Irã e os EUA também
devem administrar os fatores externos. A Arábia Saudita há muito parecia
ter pouca disposição de aceitar a nova realidade do Iraque. Mas o reino
pode se flexibilizar quando a intransigência parecer autodestrutiva.
Washington deve transmitir aos sauditas que o fogo do extremismo,
inevitavelmente, entrará no coração da Península Arábica, a menos que
sejam tomadas medidas que detenham o apoio à militância. De fato, os EUA
hoje podem realmente compartilhar o interesse do Irã em ver outro
grande inimigo do EIIL, o regime sírio de Bashar al-Assad, perseguir os
extremistas sunitas. Os aviões de guerra de Assad agora estão
bombardeando os militantes na fronteira com o Iraque, o que não estavam
fazendo na semana passada.
O Irã e os Estados Unidos também devem procurar rachar o EIIL. Se o
grupo for confrontado apenas no Iraque, vai retirar-se para a Síria para
voltar noutro dia. Os Estados Unidos não podem e não devem agir como
força aérea do Iraque. Mas os militares americanos e suas capacidades
tecnológicas –na forma de vendas de drones, helicópteros e aviões de
combate – devem ser combinados com a inteligência iraniana e síria para
impedir a circulação de extremistas.
Finalmente, o Irã e os
Estados Unidos devem aumentar a força do Exército iraquiano e impedir o
surgimento de milícias. Maliki afirma que os milhares de voluntários que
se inscreveram para combater o EIIL serão o núcleo do próximo exército
iraquiano, mas ele precisa de bastante ajuda política, militar e de
inteligência dos Estados Unidos e do Irã para que não tenha que depender
de forças heterogêneas. Se essas forças se afastarem do exército em
direção às milícias, os resultados serão imprevisíveis e profundos.
Apesar de suas diferenças, tanto Teerã quanto Washington precisam de um
Iraque estável. Se não for pelo bem dos iraquianos, eles devem cooperar
para o bem de seus próprios interesses.
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