Modelos árabes no poder são fracassados e devem ser abandonados
Thomas L. Friedman - NYT
O mês passado apresentou ao mundo o que a analista israelense Orit
Perlov descreve como os dois modelos de governo árabes dominantes: EIIL e
Sissi.
O EIIL, que evidentemente é o Estado Islâmico do Iraque e
do Levante, a milícia sunita sanguinária que vem arrancando um novo
Estado de áreas sunitas na Síria e no Iraque. E Sissi, ou seja,
Abdel-Fattah el-Sissi, o novo homem forte/presidente do Egito, cujo
regime foi inaugurado nesta semana sentenciando vergonhosamente três
jornalistas da Al-Jazeera à prisão sob acusações claramente forjadas
--uma grande nação agindo de forma tão pequena.
Perlov, pesquisadora de redes sociais do Oriente Médio, do Instituto de
Estudos de Segurança Nacional da Universidade de Tel Aviv, argumenta
que EIIL e Sissi são apenas dois lados da mesma moeda: um eleva "Deus"
como o árbitro de toda a vida política e o outro, "o Estado nacional".
Ambos falharam e vão continuar a falhar --e necessitam da coerção para
se manterem no poder-- porque não podem oferecer aos jovens árabes e
muçulmanos o que eles mais precisam: educação, liberdade e trabalho, de
forma que realizem todo o seu potencial e sua capacidade de participar
como cidadãos iguais na vida política.
Nós vamos ter que esperar
por uma nova geração que "coloque a sociedade no centro", argumenta
Perlov, uma nova geração árabe/muçulmana que não pergunte "como podemos
servir a Deus ou como podemos servir o Estado, mas como eles podem nos
servir".
Perlov argumenta que esses modelos de governo --o
hiper-islamismo (EIIL) movido por uma guerra contra os "takfiris", ou
apóstatas, que é como extremistas muçulmanos sunitas referem-se a
muçulmanos xiitas; ou o hiper-nacionalismo (Sissi) movido por uma guerra
contra "terroristas islâmicos", que é como o Estado egípcio chama a
Irmandade Muçulmana-- precisam ser esgotados para abrir espaço para uma
terceira opção construída sobre o pluralismo na sociedade, na religião e
no pensamento.
O mundo árabe precisa finalmente esvaziar os
mitos gêmeos de um Estado militar (Sissi) ou de um Estado islâmico
(EIIL) na busca pela prosperidade, estabilidade e dignidade. Somente
quando as populações em geral "finalmente admitirem que os dois modelos
são fracassados e impraticáveis", argumenta Perlov, pode haver "uma
chance desta região entrar para o século 21".
A situação não é
totalmente desanimadora. Há dois modelos emergentes, frágeis e
imperfeitos, em que as nações do Oriente Médio muçulmano construíram uma
governança decente com base na democratização da sociedade e com algum
pluralismo político, cultural e religioso: Tunísia e Curdistão. Repito,
ambos são obras em andamento, mas o que é importante é que emergiram das
próprias sociedades. Há também as monarquias relativamente suaves, como
a Jordânia e o Marrocos, que pelo menos estão fazendo experimentos com
uma governança mais participativa, permitindo alguma oposição, e não
governam com a brutalidade dos autocratas seculares.
"Tanto o
modelo secular autoritário, recentemente representado por Sissi, quanto o
modelo religioso radical, representado atualmente pelo Isis, falharam",
acrescenta Marwan Muasher, ex-ministro das Relações Exteriores da
Jordânia e autor de "The Second Arab Awakening and the Battle for
Pluralism" (O Segundo Despertar Árabe e a Batalha pelo Pluralismo, em
inglês), usando outra sigla, Isis, para se referir ao Estado Islâmico do
Iraque e do Levante.
"Isso ocorreu porque eles não abordaram as
reais necessidades das pessoas: melhorar a qualidade de vida, tanto em
termos econômicos e de desenvolvimento quanto na sensação de
participação no processo de tomada de decisão. Ambos os modelos têm sido
excludentes, apresentando-se como detentores da verdade absoluta e da
solução para todos os problemas da sociedade".
Mas o público
árabe "não é burro", acrescenta Muasher. "Continuaremos a assistir
discursos exclusivistas em grande parte do mundo árabe no futuro
previsível, mas os resultados vão acabar superando a ideologia. E os
resultados só poderão vir de políticas de inclusão, que deem a todas as
forças uma participação no sistema, gerando estabilidade, freios e
contrapesos, e por fim, prosperidade. EIIL e Sissi não podem vencer.
Infelizmente, pode levar um tempo para esgotar todas as outras opções
antes que se desenvolva uma massa crítica conhecedora desse fato básico.
Esse é o desafio da nova geração no mundo árabe, onde 70% da população
tem menos de 30 anos de idade. A geração mais velha, secular ou
religiosa parece não ter aprendido com o fracasso da era
pós-independência em alcançar o desenvolvimento sustentável e o perigo
das políticas exclusivistas".
Na verdade, o Iraque fundado em 1921 foi-se com o vento. O novo Egito
imaginado na praça Tahrir é natimorto. Muitos líderes e seguidores em
ambas as sociedades parecem ter a intenção em dar outra chance às suas
ideias fracassadas do passado antes de, esperamos, optarem pela única
ideia que funciona: o pluralismo político, religioso e educacional. Isso
pode demorar um pouco, ou não. Não sei.
Tendemos a entender
todas as histórias como se fossem sobre nós mesmos. Mas esta não é sobre
nós. Certamente fizemos muitas coisas ignorantes no Iraque e no Egito.
Mas também ajudamos a abrir suas portas para um futuro diferente, que
seus líderes fecharam totalmente por enquanto.
Daqui para
frente, onde houver pessoas realmente comprometidas com o pluralismo,
devemos apoiá-las. E onde houver ilhas de decência ameaçadas, devemos
ajudar a protegê-las. Mas essa história é principalmente sobre eles,
sobre sua necessidade de aprender a viver juntos, sem um punho de ferro
no alto, e isso vai acontecer apenas quando --e se-- eles quiserem que
isso aconteça.
Tradutor: Deborah Weinberg
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