sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Mais de 56 milhões de pessoas saíram da pobreza na América Latina 
A maioria ainda enfrenta o risco de voltar à miséria em caso de crise ou adversidade 
Felipe Betim - El País
Jorge Dan Lopez/Reuters
30.jul.2014 - Mulher chora ajoelhada na favela "Buena Vista" durante desocupação, na Cidade da Guatelama. Os moradores afirmam que a área é ocupada há dois anos por 160 famílias de baixa renda 30.jul.2014 - Mulher chora ajoelhada na favela "Buena Vista" durante desocupação, na Cidade da Guatelama. Os moradores afirmam que a área é ocupada há dois anos por 160 famílias de baixa renda
Mais de 56 milhões de pessoas saíram da pobreza extrema na América Latina entre 2000 e 2012. Não se trata de uma propaganda a favor de algum governo, e sim do Relatório Mundial de Desenvolvimento Humano 2014 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), intitulado "Sustentar o progresso humano: reduzir vulnerabilidades e construir resistências", divulgado em julho passado.
A organização apresentou os dados da América Latina na última terça-feira (26) em El Salvador e, apesar de reconhecer o progresso da região, chama a atenção para o fato de que mais de um terço dos cidadãos (199,7 milhões) ainda está na corda bamba. Eles enfrentam o risco de voltar à pobreza caso ocorra alguma crise ou adversidade. Uma proporção que, segundo o Pnud, é "alta demais".
A ONU explica que os cidadãos em extrema pobreza são os que recebem até US$ 4 por dia. Os latino-americanos nessa situação eram 189,9 milhões em 2000, ou 41,7% da uma população de 454,9 milhões. Em 12 anos, 56,2 milhões deixaram esse grupo, de modo que o número de pobres baixou para 133,7 milhões em 2012, ou 25,3% dos 528,3 milhões de habitantes da região, salienta o Pnud.
Esse progresso é resultado, sobretudo, do crescimento econômico da última década, mas o estudo revela que 38,3% se deveram também a políticas redistributivas. Os resultados variam: em países como México ou El Salvador, a contribuição desse efeito superou os 80%, enquanto em países como Venezuela ou Colômbia mais de 80% da redução da pobreza se deveram ao crescimento.
O documento aponta também que 81,6 milhões conseguiram acesso à classe média – cidadãos com renda per capita diária entre US$ 10 e 50. Em 2000 eram 99,6 milhões de latino-americanos, 21,9% do total; em 2012 subiram para 181,2 milhões, 34,3%. Também aumentou, embora em menor grau, o número de pessoas cuja renda per cápita supera os US$ 50 por dia: eram 8,9 milhões de pessoa em 2000 (2%) e em 2012, 13,7 milhões (2,6%).
O estudo salienta, entretanto, que a região não conseguiu diminuir a população em situação vulnerável. Ao contrário. Esse grupo aumentou entre 2000 e 2012, passando de 156,5 milhões de habitantes (34,4% do total) para 199,7 milhões (37,8%). Isto é, 43,1 milhões de pessoas a mais. Trata-se de pessoas que se encontram em um limbo social: são trabalhadores informais, migrantes, pessoas com incapacidade, minorias, idosos, mulheres, crianças, entre outros, segundo o Pnud. Não estão mais na pobreza, mas ainda não conseguiram ascender à classe média.
Entre os quase 200 milhões de vulneráveis, a metade (98,5 milhões) tem trabalho. No entanto, 54,4% deles são trabalhadores informais, 49,6% não têm acesso a serviços médicos, 46,1% não têm direito a aposentadoria e 53,2% não têm contrato de trabalho. Além disso, há a percepção de muitos latino-americanos de que o desenvolvimento da região – que em 2013 registrou um IDH de 0,740, considerado alto – está ameaçado pelos níveis cada vez mais elevados de homicídios e outros crimes violentos, segundo o Pnud.
"Se os países não reduzirem sua vulnerabilidade e reforçarem a capacidade de recuperação diante de crises financeiras e desastres naturais, não seremos capazes de garantir, e muito menos de ampliar, os avanços na região no âmbito social, econômico e ambiental", salientou Jessica Faieta, diretora da Pnud para a América Latina e o Caribe, na apresentação do relatório.
Entre os 18 países estudados, que concentram 90% da população da América Latina e do Caribe, o Pnud revela que a Bolívia foi o que mais conseguiu reduzir seus índices de pobreza, em 32,2%, mas também o que mais aumentou o tamanho de sua população vulnerável, em 16,9%. É seguida pelo Peru, que reduziu em 26,3% a pobreza. Em troca, esse país andino conseguiu transferir a maioria dos que eram pobres para a classe média, que aumentou 19,1%, o maior índice da região.
O estudo também salienta que Argentina, Chile e Costa Rica conseguiram reduzir tanto a pobreza quanto a vulnerabilidade, o que representou um maior aumento da classe média. Sobretudo na Argentina, onde esse grupo cresceu 17,5%, o segundo melhor resultado da região, depois do Peru.
No caminho oposto se encontram Guatemala e República Dominicana, onde a pobreza aumentou 6,8% e 0,7%, respectivamente. Também diminuiu o tamanho da classe média, em 3,3% na Guatemala e 3,7% na República Dominicana. Este país preocupa ainda mais porque o índice de cidadãos vulneráveis também aumentou em 3,6%, enquanto na Guatemala baixou 3,1%.
"Em todas as regiões do mundo, o ritmo do progresso social e econômico é mais lento hoje do que na década passada. Está muito claro que mais das mesmas políticas não vão nos render os mesmos resultados de antes", acrescentou Faieta. "Mais que nunca, a região tem que investir em proteção social universal, particularmente nas fases mais críticas da vida dos latino-americanos, como é o caso de crianças, jovens e idosos", concluiu.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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