Demetrio Magnoli - FSP
"Sobre a Morte e o Morrer", da psiquiatra Elisabeth Kubler-Ross, publicado em 1969, expõe a teoria dos cinco estágios do luto. Kubler-Ross não pensava no luto político, mas os contorcionismos dos "intelectuais orgânicos" do lulopetismo sugerem paralelos viáveis. A entrevista concedida por Jessé Souza, presidente do Ipea, à "Ilustríssima" (10.jan) indica que, confrontada com o falecimento de seu projeto político e econômico, a maioria da esquerda brasileira percorre o estágio inicial: negação.
Jessé declara guerra à corrente principal das ciências sociais
brasileiras, acusando Sérgio Buarque de Hollanda ("o pai desse
liberalismo colonizado brasileiro"), Raymundo Faoro e Roberto DaMatta de
fabricar as ferramentas ideológicas destinadas a "demonizar o Estado" e
"permitir a privatização de todas as áreas da sociedade". O "Estado
Mínimo" só existe nos sonhos de verão de ínfimas seitas ultraliberais.
Já o "Estado Máximo", objeto de adoração de Jessé, constitui a nossa
tradição moderna, de Getúlio Vargas a Lula, com escala em Ernesto
Geisel. Há 36 anos, a crítica de esquerda ao capitalismo de Estado foi
uma das fontes da fundação do PT. Hoje, num movimento regressivo, os
intelectuais do lulopetismo dedicam-se a apagar os vestígios daquela
crítica.
A regressão é uma negação. No 13º ano de poder lulopetista, sob uma epidemia de dengue, face à inauguração de uma Olimpíada que terá como palco as águas cariocas infestadas de poluição, numa metrópole cuja saúde pública entrou em colapso, Jessé enxerga no "Estado Máximo" um instrumento de redenção dos pobres. O Estado geiseliano, dizia a esquerda que juntou-se ao PT, servia para canalizar recursos públicos ao grande empresariado nacional e internacional. A aventura lulopetista no BNDES e na Petrobras é uma nova prova do que já se sabia, acrescida de lições suplementares: nosso capitalismo de Estado obedece, também, aos interesses da alta burocracia estatal e da elite política que comanda o Executivo e o Congresso. Para ter razão, Jessé precisaria abolir os 13 últimos anos de nossa história: a experiência de poder do partido ao qual presta sua consultoria teórica.
"A corrupção é endêmica ao capitalismo", proclama Jessé, para dissolver a corrupção presente na corrupção universal, absolvendo o "Estado Máximo" cujas engrenagens propiciaram a aliança entre o PT e o grande capital privado. Quando, finalmente, algumas figuras de proa do petismo reconhecem que o partido "se lambuzou" no governo, Jessé retruca com a senha formulada pelos intelectuais petistas nos tempos do mensalão: a alegada perseguição da "mídia conservadora" contra os "governos populares". O estágio da negação confunde-se, muitas vezes, com o seguinte, que é o da raiva, ensina Kubler-Ross. Circulando entre um e outro, os intelectuais do PT atrasam a marcha do partido rumo ao estágio final, da aceitação, uma dádiva que não está ao alcance de todos.
O empreendimento da negação atinge um cume paroxístico no diagnóstico sobre o triste outono do modelo lulopetista. Segundo Jessé, a crise em curso decorre da reação do "grande capital especulativo" contra o governo Dilma, que tentou "comprar a briga" contra a "grossa corrupção" universal do capitalismo. "Hoje, fica claro que esse pessoal não a perdoou pela ousadia", conclui o personagem que denuncia a "tolice pré-fabricada entre nós". As altas finanças lucraram desmesuradamente na era lulopetista e, na hora aguda da crise, o Bradesco ofereceu a Dilma um ministro da Fazenda. Mas, no estágio da negação, o paciente bloqueia o mundo dos fatos, racionalizando suas próprias emoções.
No fundo, o presidente do Ipea toma emprestado o discurso de Nicolás Maduro, que atribui a implosão do modelo chavista a uma "guerra econômica" promovida pelas elites nacionais e estrangeiras. É Caracas, na "Ilustríssima".
A regressão é uma negação. No 13º ano de poder lulopetista, sob uma epidemia de dengue, face à inauguração de uma Olimpíada que terá como palco as águas cariocas infestadas de poluição, numa metrópole cuja saúde pública entrou em colapso, Jessé enxerga no "Estado Máximo" um instrumento de redenção dos pobres. O Estado geiseliano, dizia a esquerda que juntou-se ao PT, servia para canalizar recursos públicos ao grande empresariado nacional e internacional. A aventura lulopetista no BNDES e na Petrobras é uma nova prova do que já se sabia, acrescida de lições suplementares: nosso capitalismo de Estado obedece, também, aos interesses da alta burocracia estatal e da elite política que comanda o Executivo e o Congresso. Para ter razão, Jessé precisaria abolir os 13 últimos anos de nossa história: a experiência de poder do partido ao qual presta sua consultoria teórica.
"A corrupção é endêmica ao capitalismo", proclama Jessé, para dissolver a corrupção presente na corrupção universal, absolvendo o "Estado Máximo" cujas engrenagens propiciaram a aliança entre o PT e o grande capital privado. Quando, finalmente, algumas figuras de proa do petismo reconhecem que o partido "se lambuzou" no governo, Jessé retruca com a senha formulada pelos intelectuais petistas nos tempos do mensalão: a alegada perseguição da "mídia conservadora" contra os "governos populares". O estágio da negação confunde-se, muitas vezes, com o seguinte, que é o da raiva, ensina Kubler-Ross. Circulando entre um e outro, os intelectuais do PT atrasam a marcha do partido rumo ao estágio final, da aceitação, uma dádiva que não está ao alcance de todos.
O empreendimento da negação atinge um cume paroxístico no diagnóstico sobre o triste outono do modelo lulopetista. Segundo Jessé, a crise em curso decorre da reação do "grande capital especulativo" contra o governo Dilma, que tentou "comprar a briga" contra a "grossa corrupção" universal do capitalismo. "Hoje, fica claro que esse pessoal não a perdoou pela ousadia", conclui o personagem que denuncia a "tolice pré-fabricada entre nós". As altas finanças lucraram desmesuradamente na era lulopetista e, na hora aguda da crise, o Bradesco ofereceu a Dilma um ministro da Fazenda. Mas, no estágio da negação, o paciente bloqueia o mundo dos fatos, racionalizando suas próprias emoções.
No fundo, o presidente do Ipea toma emprestado o discurso de Nicolás Maduro, que atribui a implosão do modelo chavista a uma "guerra econômica" promovida pelas elites nacionais e estrangeiras. É Caracas, na "Ilustríssima".
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