Orçamento indexado inviabiliza ajuste
Apesar de uma coleta de tributos menor,
gastos previdenciários e outros foram corrigidos por uma inflação alta,
criando despesa maior que a meta de superávit
O Globo
O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, e equipe investem horas e horas
de trabalho na tarefa de encontrar maneiras de incentivar a retomada do
crescimento, mas sem que isso implique aumento dos gastos. Devem saber
que o desequilíbrio fiscal construído principalmente no último ano do
primeiro mandato da presidente Dilma acelerou a inflação, impôs um ciclo
recessivo profundo ao país e esfumaçou o que restava de confiança de
investidores e consumidores no governo.
O próprio Barbosa reafirma o compromisso de buscar a meta de
superávit primário de 0,5% do PIB, este ano, fixada no Orçamento. Não
será fácil, devido à própria recessão, causa da redução no recolhimento
de impostos. Não só por isso. O governo Dilma finge que o grave assunto
não existe — para não contrariar o PT e, certamente, as próprias
convicções. Mas, enquanto ministro e equipe se debruçam sobre uma
equação difícil de resolver, a simples aplicação dos índices de
indexação sobre aposentadorias e outros benefícios criou uma despesa que
torna praticamente impossível o governo alcançar a meta do 0,5% do PIB.
A não ser que, a depender da recomposição da base governista, no
segundo semestre, o Planalto consiga aprovar mais uma daquelas
flexibilizações estatísticas, para deduzir bilhões da meta. Mesmo assim,
será preciso cautela, dada a quase nula credibilidade da presidente
neste campo. Maior a criatividade estatística, pior a reação dos
mercados. Mais inflação e juros.
Obedecida a indexação pelo salário mínimo ou inflação das
aposentadorias, os segurados do INSS que recebem um SM ganharam um
reajuste de 11,6%, enquanto aqueles benefícios superiores ao mínimo
subiram 11,28%. Foi transposta a inflação para os benefícios, mesmo com
recessão e queda na coleta de impostos. O efeito dessa indexação será,
em 2016, uma despesa de R$ 41,1 bilhões — bem mais que o R$ 30 bilhões
que o governo esperava arrecadar no ano passado, de abril a dezembro,
com a ressurreição da CPMF. E mais que os R$ 30,5 bilhões do superávit
de 0,5% do PIB. A conta é maior, porque há outros gastos que são
remarcadas todo início de ano. Na terça, o governo anunciou que, a
partir de amanhã, por exemplo, o teto do seguro-desemprego passará de R$
1.385,91 para R$ 1.542,24, aumento de pouco mais de 11%. Está exposto,
agora na prática, o grande obstáculo a um ajuste fiscal que representam a
superindexação do Orçamento e sua vinculação a gastos específicos —
Saúde e Educação, por exemplo. Além de se engessar o administrador
público, impede-se que despesas sejam avaliadas pelo critério salutar da
sua eficácia. Gasta-se naquilo porque se gastou no ano passado.
A parcela de 90% do Orçamento está engessada. E grande parte destes
bilhões encontra-se indexada pelo salário mínimo ou inflação. Daí
crescerem, mesmo na recessão e na diminuição da coleta tributária. Não
há ajuste fiscal efetivo que seja possível. E sem ele, impede-se a
retomada do crescimento, num trágico círculo vicioso.
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