Ana Maia - DN
Rua Cor de Rosa, no Cais do Sodré. Ambiente após a entrada em vigor da nova lei que proíbe a venda de bebidas alcoólicas a menores de 18 anos. | Gonçalo Villaverde / Global Imagens
Maioria dos casos registou-se entre os 45 e os 54 anos. Álcool é um dos cinco principais fatores de risco de morte ou doença
Em Portugal morreram 44 pessoas de overdose alcoólica. Ou seja, o consumo de bebida foi tão elevado num curto espaço de tempo que o corpo não teve capacidade para reagir à toxicidade, levando à falência dos órgãos. Este número refere-se ao ano passado e é surpreendente ainda mais quando comparado com as mortes provocadas por overdose de drogas. Em 2013 foram 22, sobretudo provocadas pelo consumo de opiáceos (o mais conhecido é a heroína) e de cocaína. O álcool é considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) um dos cinco principais fatores de risco de morte ou doença.
"As overdoses
por álcool são mais do que as devida ao consumo de drogas. Em 2014
foram 44. A faixa etária mais prevalente foi a de 45-54 anos e daí para
baixo", revela ao DN Manuel Cardoso, subdiretor-geral do Serviço de
Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), que
confessa um misto de surpresa e de choque com o que os dados agora
conhecidos revelam. A overdose acontece quando o fígado não é capaz de
decompor os produtos tóxicos, levando ao desacelerar do sistema
respiratório. O que pode acontecer com 0,6% de álcool no sangue.
Se
comparadas, as overdoses por álcool são o dobro das provocadas pelas
drogas ilícitas. Em 2013, o relatório "A Situação do País em Matéria de
Drogas e Toxicodependências", registou 22 mortes por overdose de drogas,
com destaque para os opiáceos (46% dos casos), seguidos da cocaína
(36%) e da metadona (27%). Nos dois anos anteriores a tendência foi
semelhante: em 2012 registaram-se 29 overdoses por drogas ilícitas e em
2011 foram 19.
Embora o consumo esteja a
descer, Portugal continua no top dos maiores bebedores per capita. E o
consumo exagerado traz um preço a pagar que continua a ser muito alto.
"Nos acidentes rodoviários 15% das mortes são atribuídas ao álcool, na
violência 22% dos abusos estão relacionados com este consumo e 22% dos
suicídios e sofrimento autoinfligido são atribuídos ao álcool. Nas
doenças de fígado, o álcool tem um peso de 50% e 30% dos cancros da boca
e da faringe estão relacionados com o este consumo", exemplifica.
"É um produto barato e acessível"
"São
estas mortes que levam a que a esperança média de vida à nascença
reduza em comparação com outros países europeus. O álcool contribui em,
pelo menos, 6% para a redução da esperança e da qualidade de vida",
refere o subdiretor-geral do SICAD, lembrando que o álcool é considerado
pela OMS um dos cinco principais fatores de risco de morte ou doença.
Impacto que é visível no número de anos de vida saudável, por exemplo
quando se compara Portugal com os países nórdicos. "Aos 65 anos
esperamos viver mais 20. Enquanto os nórdicos têm 14 a 15 anos de vida
saudável, nós invertemos e temos seis a sete anos", acrescenta.
Mudar comportamentos
A
lei do álcool foi alterada neste ano, passando a proibir a venda de
todas as bebidas a menores de 18 anos. Manuel Cardoso explica que não é
possível esperar uma mudança imediata nos padrões de consumo, mas quer
ver resultados dentro de três a quatro anos, à medida que os novos
limites forem sendo interiorizados. "O que assumimos com os nossos
parceiros é que com menos de 18 anos não se bebe. Temos de ter uma
educação para o consumo responsável", sublinha.
Os
parceiros de que fala fazem parte do Fórum Álcool e Saúde, que junta 79
membros, desde a saúde, à indústria, vendedores, autoridades policiais,
escolas e associações de pais. "Acreditamos que é através desta
intervenção que mudamos mentalidades para maior consciência dos efeitos
nocivos do álcool", diz. A publicidade, aponta, tem estado a mudar, nas
escolas trabalha-se com os jovens em projetos como "Eu e os outros", em
que o protagonista da história tem de tomar a decisão certa e que está a
mudar de comportamentos.
Com as
polícias aposta-se na fiscalização. "Um dos compromissos com a PSP e a
GNR é o aumento dos testes de alcoolemia, que passaram de cerca de 500
mil para um milhão. A cada três anos o condutor devia ser testado para
saber que existe fiscalização", frisa, salientando que vigiar a venda
nos bares e nos restaurantes é difícil. "Tenho consciência de que dão o
seu melhor, mas não têm vida fácil. O que me entristece são os pais que
não se preocupam com os filhos", afirma Manuel Cardoso.
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