Armin Mahler - Der Spiegel
John Rawlston/Chattanooga
O melhor comentário a respeito do escândalo da Volkswagen veio por cortesia do próprio ex-presidente-executivo Martin Winterkorn, muito antes de sua renúncia na semana passada. "Arrogância e complacência são as piores coisas que poderiam acontecer conosco", ele disse. A citação não saiu de sua recente mensagem por vídeo, onde tentou pedir desculpas pela autodestruição da empresa. Em vez disso, ela foi extraída de uma entrevista dada à "Spiegel" há exatamente um ano. E ele disse isso apenas como uma descrição de um risco hipotético. Ele ainda não tinha percebido que o pior já estava acontecendo há muito tempo.
Uma
crença na própria invencibilidade é comum entre os capitães da indústria
da Alemanha. Quando se trata de atingirem as metas que estabeleceram
para si mesmos, eles recorrem a quaisquer meios necessários. No caso da
Volkswagen, a queda se deu pelo desejo de superar a Toyota como maior
fabricante de carros do mundo. No caso do Deutsche Bank, foi a meta
devoradora de atingir um ganho de 25% em suas ações. A busca dessa meta o
fez culpado de quase todas as transgressões do setor financeiro que
acabaram levando à crise. Depois dela, o banco buscou mudar
fundamentalmente sua cultura corporativa, uma mudança que fracassou
terrivelmente. Hoje, o Deutsche Bank é apenas uma sombra do que era.
A Volkswagen agora está enfrentando um destino semelhante –um duro golpe para toda a economia alemã e que exigirá tempo para que se recupere. Nos últimos anos, de modo em grande parte despercebido pelo público, a indústria alemã já perdeu grande parte de seu brilho e poucas grandes empresas ainda jogam nas grandes ligas. A Lufthansa está com dificuldade para suportar o avanço das companhias aéreas de baixo custo, enquanto as gigantes de energia E.on e RWE estão lutando pela própria sobrevivência.
Cada caso é diferente, mas há algumas semelhanças –como a incapacidade de se adaptar às mudanças das condições e uma ignorância das correntes políticas e sociais. A RWE e a E.on se recusaram a aceitar a diminuição do apoio popular à energia nuclear e investiram muito pouco em energia renovável, depositando suas esperanças no apoio político. A Volkswagen respondeu aos padrões mais rígidos de emissões fraudando os testes, em vez de desenvolver motores de baixa emissão. Além disso, lobistas da indústria asseguraram que as exigências legais não eram rígidas demais.
As gigantes de energia permaneceram impunes até que a chanceler Angela Merkel decidiu repentinamente abandonar gradualmente a energia nuclear e adotar fontes de energia renováveis, após o desastre de Fukushima. O despertar para os fabricantes de automóveis está ocorrendo apenas agora, porque a Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês) americana revelou a fraude da Volkswagen.
Só há uma lição possível a ser extraída: essas empresas precisam enfrentar a realidade. Elas precisam abandonar sua ideia errônea de que a realidade pode ser moldada de acordo com suas necessidades. As negociatas com políticos precisam acabar. Isso também significa que precisam dar adeus à arrogância.
Esses concorrentes americanos contam com fundos quase infinitos e –talvez ainda mais importante– know-how de software. Mais que qualquer outra coisa, o carro do futuro será um computador sobre quatro rodas. Será que a indústria automotiva alemã ainda terá um papel de liderança no mercado do amanhã? Ou será reduzida a fornecedora para as grandes empresas de internet? Essa pergunta foi feita antes mesmo do fiasco da Volkswagen e a resposta agora é ainda mais incerta do que antes.
Como a indústria manufatureira alemã sobreviverá à concorrência quando agora há sérias dúvidas sobre sua competência básica, sobre a confiabilidade da engenharia alemã que ela gosta de alardear no exterior? O fim de sua credibilidade, a ruína de sua reputação, prejudicará não apenas a Volkswagen, mas todo o setor e, de fato, toda a indústria alemã.
Também terá um preço sobre a população em geral, cuja identidade está estreitamente ligada à força da economia e à solidez dos produtos alemães. Os alemães não se veem como uma nação de enganadores. Outros podem ser –principalmente os gregos, segundo a opinião popular, que os alemães gostam de desprezar.
Mas aí está de novo: é hora de dizer adeus à arrogância.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
A Volkswagen agora está enfrentando um destino semelhante –um duro golpe para toda a economia alemã e que exigirá tempo para que se recupere. Nos últimos anos, de modo em grande parte despercebido pelo público, a indústria alemã já perdeu grande parte de seu brilho e poucas grandes empresas ainda jogam nas grandes ligas. A Lufthansa está com dificuldade para suportar o avanço das companhias aéreas de baixo custo, enquanto as gigantes de energia E.on e RWE estão lutando pela própria sobrevivência.
Cada caso é diferente, mas há algumas semelhanças –como a incapacidade de se adaptar às mudanças das condições e uma ignorância das correntes políticas e sociais. A RWE e a E.on se recusaram a aceitar a diminuição do apoio popular à energia nuclear e investiram muito pouco em energia renovável, depositando suas esperanças no apoio político. A Volkswagen respondeu aos padrões mais rígidos de emissões fraudando os testes, em vez de desenvolver motores de baixa emissão. Além disso, lobistas da indústria asseguraram que as exigências legais não eram rígidas demais.
As gigantes de energia permaneceram impunes até que a chanceler Angela Merkel decidiu repentinamente abandonar gradualmente a energia nuclear e adotar fontes de energia renováveis, após o desastre de Fukushima. O despertar para os fabricantes de automóveis está ocorrendo apenas agora, porque a Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês) americana revelou a fraude da Volkswagen.
Só há uma lição possível a ser extraída: essas empresas precisam enfrentar a realidade. Elas precisam abandonar sua ideia errônea de que a realidade pode ser moldada de acordo com suas necessidades. As negociatas com políticos precisam acabar. Isso também significa que precisam dar adeus à arrogância.
Concorrentes ganham terreno
Isso soa ingênuo? Talvez. Mas é a única solução. Não é coincidência e, de fato, é altamente simbólico que na mesma semana em que o escândalo da Volkswagen veio à tona, a Apple também chegou às manchetes. Segundo o "Wall Street Journal", a empresa com sede na Califórnia está planejando lançar seu próprio carro até 2019. O Google também está desenvolvendo um carro sem motorista. A fabricante de carros americana Tesla já demonstrou a disrupção que uma recém-chegada pode provocar em um mercado.Esses concorrentes americanos contam com fundos quase infinitos e –talvez ainda mais importante– know-how de software. Mais que qualquer outra coisa, o carro do futuro será um computador sobre quatro rodas. Será que a indústria automotiva alemã ainda terá um papel de liderança no mercado do amanhã? Ou será reduzida a fornecedora para as grandes empresas de internet? Essa pergunta foi feita antes mesmo do fiasco da Volkswagen e a resposta agora é ainda mais incerta do que antes.
Como a indústria manufatureira alemã sobreviverá à concorrência quando agora há sérias dúvidas sobre sua competência básica, sobre a confiabilidade da engenharia alemã que ela gosta de alardear no exterior? O fim de sua credibilidade, a ruína de sua reputação, prejudicará não apenas a Volkswagen, mas todo o setor e, de fato, toda a indústria alemã.
Também terá um preço sobre a população em geral, cuja identidade está estreitamente ligada à força da economia e à solidez dos produtos alemães. Os alemães não se veem como uma nação de enganadores. Outros podem ser –principalmente os gregos, segundo a opinião popular, que os alemães gostam de desprezar.
Mas aí está de novo: é hora de dizer adeus à arrogância.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
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