Jean Baptiste Chastand - Le Monde
Claus Fisker/Reuters
9.set.2015 - Refugiados caminham por estrada no norte de Padborg, na Dinamarca
Com seu rosto rechonchudo e sua fala determinada, ela se tornou o símbolo do endurecimento dinamarquês, um país de sistema social generoso que desde os anos 2000 vem se fechando cada vez mais aos imigrantes. Inger Stojberg, 42, popular ministra da Integração contrária à imigração, apelidada de "pitbull" pelos tabloides locais, defendeu sem crise de consciência um projeto de lei polêmico que prevê um novo endurecimento do direito de asilo em um país onde ele já se encontra restrito. O texto, que deve ser votado no dia 26 de janeiro, comporta entre outras coisas a possibilidade de a polícia confiscar os bens dos solicitantes de asilo avaliados acima de 10 mil coroas (R$ 5.800) para financiar os auxílios recebidos.
Essa medida chocou e provocou
as condenações de vários órgãos internacionais. O Alto Comissariado das
Nações Unidas para os Refugiados afirmou que ela contraria os "padrões
europeu e internacionais de proteção aos direitos humanos" e pode acabar
"alimentando o medo e a xenofobia". Mas Stojberg passou por cima dessas
críticas. "Parece-me razoável que o Estado não pague por aqueles que
podem pagar por si mesmos", defendeu esse membro da ala direita do
Partido Liberal (Venstre), atualmente no poder graças ao apoio do
Partido Popular Dinamarquês (DF), de extrema-direita.
Além disso, segundo ela, essa mesma condição estaria reservada aos beneficiários dinamarqueses do auxílio social. Ela só admitiu ter flexibilizado ligeiramente seu projeto para acalmar os ânimos. O montante mínimo para as apreensões foi elevado de 3 mil (R$ 1.736) para 10 mil coroas. E, mais importante, os bens com "um valor sentimental", como alianças, não entrarão na conta. Essa medida inicial havia chocado especialmente a imprensa americana, que a comparou com as condições reservadas aos judeus durante a Segunda Guerra Mundial.
Em troca de algumas concessões, os partidos de direita no poder conseguiram até mesmo convencer os socialdemocratas a apoiarem seu texto, o que garante sua aprovação. "É verdade que temos uma responsabilidade moral de acolher as pessoas necessitadas, mas nossa economia e nossa coesão estão ameaçadas pelo número de refugiados", explicou sua porta-voz. "Nosso Estado-providência tem limites."
Com 21 mil solicitantes de asilo recebidos em 2015, a Dinamarca está longe de estar tão sobrecarregada quanto seu vizinho sueco, onde 163 mil imigrantes chegaram no mesmo período. Mas a opinião pública dinamarquesa é bastante favorável à limitação drástica das chegadas. Na quarta-feira, em um parlamento quase vazio, somente os partidos da esquerda radical protestaram, e embora vários parlamentares do Venstre também tenham manifestado seu desacordo, eles têm poucas chances de mudar a linha governamental.
"O governo dinamarquês só se preocupa com uma coisa: enviar aos refugiados o sinal de que a Dinamarca é um destino a ser evitado. O governo sabe muito bem que a maior parte dos imigrantes não tem dinheiro com eles e que o confisco dos bens é inaplicável", lamenta Andreas Kamm, secretário-geral do Conselho Dinamarquês para os Refugiados. "Enviamos notas para o governo há anos, mas sinceramente eles nunca mudaram nada, pois na Dinamarca você pode perder a eleição só por essas questões de imigração."
Anti-imigração, eurocético e anti-livre-circulação, o DF vem ditando há mais de uma década a agenda política sobre essas questões, defendendo medidas cada vez mais drásticas. Desta vez o partido está pedindo, por exemplo, a criação de acampamentos no campo para os refugiados, para deportá-los mais facilmente quando a segurança tiver retornado a seus países de origem. Com 21,1% dos votos durante as legislativas de junho de 2015, esse partido é o mais poderoso do bloco de direita.
Seu presidente, Kristian Thulesen Dahl, preferiu permanecer fora do poder para poder negociar melhor caso a caso seu apoio ao governo atual, minoritário, o que permite ao DF que dite a política governamental sem correr o risco de perder votos ao fazer concessões. Esse equilíbrio político já existia entre 2001 e 2011 e na época levou a um endurecimento da política de imigração dinamarquesa, levando todos os partidos a se alinharem com suas posições.
Nos centros de refugiados no país, os debates no Parlamento têm sido acompanhados com cautela. "Claro, é um problema que eles possam perder suas joias, mas acho que estão fazendo isso por causa dos refugiados que não querem trabalhar", acredita Kawtar Mustafa, uma síria de 30 anos abrigada em um antigo hospital transformado em centro de acolhimento, em Elseneur. Ela escolheu a Dinamarca junto com seu marido porque ela se sente tranquila nesse "pequeno país com poucos refugiados". Assim como muitos dos refugiados presentes, ela também já tem família na Dinamarca.
Em Elseneur, assim como em outros lugares, as condições são dramáticas. É verdade que os refugiados recebem alimentação e um lugar para dormir, mas ganham somente entre 100 e 200 coroas (R$ 56 e R$ 112) a cada duas semanas e só se participarem das tarefas de limpeza. Não é o suficiente para pagar a passagem de ônibus de 24 coroas para irem até o centro da cidade, que fica a mais de 30 minutos a pé. É uma situação que pode durar meses, tempo até que o pedido de asilo seja examinado.
"Sinceramente, a Dinamarca é muito difícil", diz Abdulkadir Ali Ahmed, um somali que chegou ao país há três anos. Ele está em um limbo jurídico depois de ter seu pedido de asilo recusado mas também sem poder ser deportado devido à situação em seu país de origem. "Não recebo nada, não tenho direito de trabalhar e não sei quanto tempo isso pode durar", diz. "E como deixei minhas impressões digitais aqui, não posso nem mesmo ir à Suécia."
Além disso, segundo ela, essa mesma condição estaria reservada aos beneficiários dinamarqueses do auxílio social. Ela só admitiu ter flexibilizado ligeiramente seu projeto para acalmar os ânimos. O montante mínimo para as apreensões foi elevado de 3 mil (R$ 1.736) para 10 mil coroas. E, mais importante, os bens com "um valor sentimental", como alianças, não entrarão na conta. Essa medida inicial havia chocado especialmente a imprensa americana, que a comparou com as condições reservadas aos judeus durante a Segunda Guerra Mundial.
Em troca de algumas concessões, os partidos de direita no poder conseguiram até mesmo convencer os socialdemocratas a apoiarem seu texto, o que garante sua aprovação. "É verdade que temos uma responsabilidade moral de acolher as pessoas necessitadas, mas nossa economia e nossa coesão estão ameaçadas pelo número de refugiados", explicou sua porta-voz. "Nosso Estado-providência tem limites."
"Destino a evitar"
As outras medidas muito polêmicas, como a redução de 10% nas bolsas para os refugiados e a mudança de um para três anos do prazo imposto para trazer as famílias—um direito que para os refugiados acolhidos na França é imediato—foram mantidas sem adaptações. E isso ainda que, como admite um conselheiro influente do governo, "elas estejam no limite daquilo que permitem as convenções internacionais". O primeiro-ministro dinamarquês, Lars Lokke Rasmussen, chegou a pedir oficialmente uma modificação da convenção de Genebra de 1951 sobre os refugiados, uma hipótese irrealizável mas que diz muito sobre o estado de espírito do governo dinamarquês.Com 21 mil solicitantes de asilo recebidos em 2015, a Dinamarca está longe de estar tão sobrecarregada quanto seu vizinho sueco, onde 163 mil imigrantes chegaram no mesmo período. Mas a opinião pública dinamarquesa é bastante favorável à limitação drástica das chegadas. Na quarta-feira, em um parlamento quase vazio, somente os partidos da esquerda radical protestaram, e embora vários parlamentares do Venstre também tenham manifestado seu desacordo, eles têm poucas chances de mudar a linha governamental.
"O governo dinamarquês só se preocupa com uma coisa: enviar aos refugiados o sinal de que a Dinamarca é um destino a ser evitado. O governo sabe muito bem que a maior parte dos imigrantes não tem dinheiro com eles e que o confisco dos bens é inaplicável", lamenta Andreas Kamm, secretário-geral do Conselho Dinamarquês para os Refugiados. "Enviamos notas para o governo há anos, mas sinceramente eles nunca mudaram nada, pois na Dinamarca você pode perder a eleição só por essas questões de imigração."
Anti-imigração, eurocético e anti-livre-circulação, o DF vem ditando há mais de uma década a agenda política sobre essas questões, defendendo medidas cada vez mais drásticas. Desta vez o partido está pedindo, por exemplo, a criação de acampamentos no campo para os refugiados, para deportá-los mais facilmente quando a segurança tiver retornado a seus países de origem. Com 21,1% dos votos durante as legislativas de junho de 2015, esse partido é o mais poderoso do bloco de direita.
Seu presidente, Kristian Thulesen Dahl, preferiu permanecer fora do poder para poder negociar melhor caso a caso seu apoio ao governo atual, minoritário, o que permite ao DF que dite a política governamental sem correr o risco de perder votos ao fazer concessões. Esse equilíbrio político já existia entre 2001 e 2011 e na época levou a um endurecimento da política de imigração dinamarquesa, levando todos os partidos a se alinharem com suas posições.
Nos centros de refugiados no país, os debates no Parlamento têm sido acompanhados com cautela. "Claro, é um problema que eles possam perder suas joias, mas acho que estão fazendo isso por causa dos refugiados que não querem trabalhar", acredita Kawtar Mustafa, uma síria de 30 anos abrigada em um antigo hospital transformado em centro de acolhimento, em Elseneur. Ela escolheu a Dinamarca junto com seu marido porque ela se sente tranquila nesse "pequeno país com poucos refugiados". Assim como muitos dos refugiados presentes, ela também já tem família na Dinamarca.
Acampamento de tendas
Os quartos são limpos e acolhedores. O centro é considerado um "Hilton" pelos funcionários da Cruz Vermelha que trabalham ali. Mas a prefeitura, controlada em parte pelo DF, pretende fechá-lo em breve e transformá-lo em um centro de convivência. Os novos solicitantes de asilo são encaminhados para um acampamento de tendas, a solução preferida do governo, que quer restringir os acolhimentos em prédios para mostrar aos dinamarqueses que não está gastando demais com os estrangeiros.Em Elseneur, assim como em outros lugares, as condições são dramáticas. É verdade que os refugiados recebem alimentação e um lugar para dormir, mas ganham somente entre 100 e 200 coroas (R$ 56 e R$ 112) a cada duas semanas e só se participarem das tarefas de limpeza. Não é o suficiente para pagar a passagem de ônibus de 24 coroas para irem até o centro da cidade, que fica a mais de 30 minutos a pé. É uma situação que pode durar meses, tempo até que o pedido de asilo seja examinado.
"Sinceramente, a Dinamarca é muito difícil", diz Abdulkadir Ali Ahmed, um somali que chegou ao país há três anos. Ele está em um limbo jurídico depois de ter seu pedido de asilo recusado mas também sem poder ser deportado devido à situação em seu país de origem. "Não recebo nada, não tenho direito de trabalhar e não sei quanto tempo isso pode durar", diz. "E como deixei minhas impressões digitais aqui, não posso nem mesmo ir à Suécia."
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