sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Hollande fica impassível e ensopado em meio à tormenta que atinge seu governo
Philippe Euzen e David Revault d'Allonnes - Le Monde 
Fred Tanneau/AFP
François Hollande, presidente da França, fica ensopado enquanto faz um discurso debaixo de chuva na Île-de-Sein, na costa francesa da Bretanha, na segunda (25) François Hollande, presidente da França, fica ensopado enquanto faz um discurso debaixo de chuva na Île-de-Sein, na costa francesa da Bretanha, na segunda (25)
"Governar é chover".
Formulado por François Hollande, evidentemente embaixo de chuva, no dia 3 de abril de 2013 durante uma viagem pelo Marrocos, no auge da crise política desencadeada pelo escândalo Cahuzac, esse aforismo presidencial pretendia ser uma brincadeira. Só que ele está se tornando uma constante meteorológico-política de seu mandato.
Assim como a fatalidade da tragédia grega, as chuvas vêm acompanhando o mandato do presidente desde que ele tomou posse no dia 15 de maio de 2012 até seus dias mais difíceis.
E assim foi na segunda-feira (25), na ocasião da mais grave das crises governamentais enfrentadas desde essa data. Era para ser um dia inteiramente dedicado, na agenda presidencial, à comemoração do 70º aniversário da Libertação e mais úmido do que nunca.
Mal o chefe de Estado saiu de seu helicóptero que o deixava em Île-de-Sein (departamento de Finistère), começaram a cair as primeiras gotas de água, que no entanto não o perturbaram. Impassível diante da tormenta, ele fingiu estar cumprindo da forma mais normal do mundo as exigências de sua agenda. Como se nada demais estivesse acontecendo.
Algumas horas antes, no barco que levava para a ilha a imprensa, os deputados bretões e membros da Guarda Republicana, o anúncio da renúncia do governo havia caído como uma bomba, mudando radicalmente o foco do dia.
Os jornalistas bem que tentaram conseguir um comentário do presidente, ao longo dos 400 metros que separam o heliporto do museu da Resistência. Em vão: Hollande evitou suas perguntas, preferindo cumprimentar os moradores da ilha com um sorriso nos lábios.

Alto teor memorial

"O presidente está tranquilo", comentou Marylise Lebranchu, uma dos dois ministros presentes, juntamente com Jean-Yves Le Drian. Foi sem guarda-chuva, sob um dilúvio, que François Hollande, ensopado e de óculos embaçados, prestou sua homenagem aos resistentes de Sein.
Para homenagear a coragem desses homens que se juntaram ao general De Gaulle na Inglaterra, em junho de 1940, ele também enfrentou deliberadamente elementos desenfreados sem se proteger.
Uma imagem surreal e emblemática de um dia tempestuoso para o Executivo.
"A mensagem da ilha de Sein é que não há perigo ou dificuldade que não consigamos superar, contanto que exista vontade, contanto que haja união", arriscou em uma transparente alusão o chefe de Estado, que durante esse dia de alto teor memorial deixou Manuel Valls conduzir a operação de remanejamento do gabinete de governo na linha de frente.
Às 15h, o helicóptero presidencial se afastou e a chuva parou. Ela voltou a cair à noite, em Paris, onde Hollande foi celebrar a libertação da capital. Depois de se ensopar novamente ouvindo a Marselhesa, firme como um poste em frente à sede da prefeitura e depois recebendo as honras militares dos couraceiros e dos fuzileiros navais, o chefe de Estado, dessa vez protegido por um toldo, evocou as almas do Conselho Nacional da Resistência para retratar sua situação política.
"Não conseguiremos nada sem esforço, nada sem abnegação, nada sem coragem", ele avisa. "Mesmo nos momentos difíceis, sempre há a vontade que triunfa, a união que permite avançar e a solidariedade que faz com que sejamos a França."
Os discursos se encerraram e a tempestade continuou. Alguns minutos depois, por volta das 23h, o chefe do Estado conversou uma última vez pelo telefone com Manuel Valls. Bem a seco, dessa vez.

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