domingo, 29 de novembro de 2015

Erdogan: entre as ofertas da UE, sanções da Rússia e protestos curdos
Helena Tecedeiro - DN
Manifestantes saíram à rua em Istambul em protesto após a morte do advogado curdo Tahir Elci | EPA/CEM TURKEL
Presidente espera que a Cimeira do Clima, que começa amanhã em Paris, seja oportunidade para salvar relações com Moscovo.
Protestos violentos nas ruas, ontem, após o assassínio de um advogado curdo. Pressão da União Europeia, na cimeira UE-Turquia hoje à tarde em Bruxelas, para que Ancara trave o fluxo de refugiados em troca de um cheque de três mil milhões de euros e de uma aceleração no seu processo de adesão. Um potencial encontro com o russo Vladimir Putin, amanhã, à margem da Cimeira do Clima em Paris, para acalmar a tensão provocada pelo derrube na terça-feira de um caça russo que a Turquia garante ter violado o seu espaço aéreo. Três dias com três desafios diferentes o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, que se se recusar pedir desculpas a Moscovo ontem disse esperar que a cimeira de Paris seja uma oportunidade para salvar a relação com a Rússia.
"Os últimos acontecimentos deixaram-nos muito tristes", garantiu Erdogan na cidade ocidental de Baliksehir, num discurso transmitido pela televisão. O presidente turco recusou pedir as desculpas que a Rússia exige, sublinhando que quem merece um pedido de desculpas é a Turquia, cujo espaço aéreo foi violado. Mas disse esperar que a Cimeira sobre o Clima amanhã em Paris seja "a oportunidade para recuperar a nossa relação com a Rússia". E garantiu: "O confronto não trará felicidade a ninguém. Tal como a Rússia é importante para a Turquia, a Turquia é importante para a Rússia".
Mas foi pelo confronto que Putin ontem optou, ao assinar o decreto que estabelece sanções à Turquia. A partir de 1 de janeiro, os turcos passam a precisar de visto para entrar na Rússia, os operadores turísticos russos ficam proibidos de organizar tours na Turquia e o decreto prevê ainda o fim dos voos charter entre os dois países. As empresas russas veem a contratação de mão-de-obra turca limitada e a entrada de alguns produtos turcos no país fica suspensa. Segundo os dados de Moscovo, se os seus cidadãos deixarem de viajar para a Turquia, isso irá provocar um rombo de 9400 milhões de euros no sector turístico turco. Ao contrário, o Ministério dos Negócios Estrangeiros turco também pediu ontem a todos cidadãos para que adiem todas as viagens não urgentes para a Rússia.
Pouco antes, o porta-voz do presidente russo, Dmitri Peskov, classificara de "completa loucura" o comportamento da aviação turca. "Ninguém tem o direito de disparar contra um avião russo à traição, pelas costas", garantiu Peskov. Ancara garantiu ter avisado repetidamente o aparelho antes de o abater. Um dos pilotos sobreviveu depois de se ejetar, o outro foi morto por rebeldes turcomenos antes de chegar ao solo em território sírio.
Peskov garantiu ainda que Putin está "mobilizado, totalmente mobilizado, mobilizado ao ponto que as circunstâncias exigem". E acrescentou: "O golpe que a Rússia sofreu não tem precedente. Por isso a reação estará à altura dessa ameaça". Quanto a um eventual encontro entre Putin e Erdogan à margem da Cimeira do Clima, o porta-voz do Kremlin preferiu não confirmar nem desmentir.
Confrontos em Istambul
Ao final do dia em Istambul, a polícia tentou dispersar as cerca de duas mil pessoas que tinham saído à rua para protestar contra o assassínio, horas antes, de Tahir Elci, um influente advogado curdo. Os agentes, munidos de canhões de água e gás lacrimogéneo, acabaram por se envolver em confrontos com os manifestantes, que chamavam "ladrão" e "assassino" a Erdogan.
Elci, presidente da associação de advogados da província de Diyarbakir, no sudeste do país, tinha-se destacado pelas críticas ao governo, denunciando a sua opção de considerar o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) uma organização terrorista. O advogado foi atingido por um tiro na cabeça quando estava a falar com os media em Diyarbakir. As imagens da sua morte, captadas pelas câmaras de televisão presentes, inclusive pela Reuters, foram transmitidas em todo o mundo, levando a protestos tanto em Istambul como em Ancara.
Para o partido pró-curdo HDP não há dúvidas que Elci foi alvo de um "assassínio planeado". Já o primeiro-ministro Ahmet Davutoglu disse ainda ser cedo para perceber se foi morto ou apanhado num troca de tiros.

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