Teto esburacado
FSP
Dentre as muitas medidas para o controle dos gastos com pessoal, poucas
são mais simbólicas que o veto constitucional a remunerações de
ocupantes de cargos públicos acima do salário dos ministros do Supremo
Tribunal Federal.
Que esse teto —hoje de R$ 33,7 mil— tenha se transformado em letra morta
no Judiciário e no Ministério Público é demonstração de que a agenda
corporativista tem suplantado o interesse coletivo.
Pesquisa recente apontou que apenas 3% dos promotores paulistas recebem
menos que esse valor, em razão de variados penduricalhos e auxílios não
considerados para o cálculo dos limites. O mesmo se dá em outros
Estados.
No Executivo federal, 41% das autoridades de escalões superiores da
Fazenda e do Planejamento ganham acima do teto graças a auxílios e
jetons pela participação em conselhos de empresas estatais.
Na maior parte dos casos, o texto constitucional tornou-se inócuo por
conta de interpretações elásticas, não raro oportunistas, das regras.
Exemplo notório é o do auxílio-moradia, concebido originalmente para
juízes e promotores em serviço fora de seus domicílios.
Ocorre que em 2014 o ministro do STF Luiz Fux estendeu por liminar a
indenização de R$ 4.377 mensais a todos os magistrados na ativa. Não
tardou para que associações de promotores pleiteassem o mesmo
tratamento, com sucesso.
Os custos, estimados em cerca de R$ 1 bilhão ao ano, tendem a crescer. A
campanha para a sucessão de Rodrigo Janot na Procuradoria-Geral da
República mostrou que tais práticas gozam de aceitação quase irrestrita
entre aqueles que deveriam zelar pela moralidade.
A ampla concessão do auxílio-moradia, argumentou-se nos debates,
descaracteriza seu caráter indenizatório e impõe a incorporação
definitiva aos salários.
Felizmente, notam-se também reações a tais abusos. O Senado aprovou, no
final do ano passado, três projetos que visam garantir maior efetividade
ao limite imposto pela Constituição.
A matéria seguiu para a Câmara, mas só foi retomada neste mês, quando se criou uma comissão para discutir os supersalários.
No meio político, esse é quase sempre um subterfúgio para nada se fazer.
Não se ignora, ademais, o reduzido interesse dos congressistas, muitos
deles suspeitos de atos ilícitos, em se indispor com juízes e
promotores.
A economia com a aplicação do teto não seria, é fato, decisiva. A
medida, porém, representaria demonstração básica de respeito pelo
dinheiro do contribuinte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário