É de tal sorte primário que levei exatos 23 minutos para apontar a teia de fraudes argumentativas. O rapaz daria razão a Francis, segundo quem um bom ator não pode ser muito inteligente. Eu discordo da afirmação. Mas vale pra Moura
Reinaldo Azevedo - VEJA
Paulo Francis dizia que um grande ator não pode ser muito inteligente. Sempre tomei a frase como uma de suas “boutades”… inteligentes! Queria dizer que o ator só consegue expressar a verdade necessária — ao menos segundo o seu gosto estético por teatro ou cinema — se é capaz de se esquecer, de suspender por um tempo o juízo. Mesmo assim, em regra, não concordava com ele nesse particular.
Mas me vi tentando a concordar ao ler o artigo de Wagner Moura na Folha
desta quarta. Se escreveu sozinho, não sei. Parece haver ali a canetada
ora de alguém da sociologia, ora do direito. Mas digamos que seja tudo
dele.
Os
argumentos, de toda sorte, são pueris. Moura admite que “o PT montou um
projeto de poder amparado por um esquema de corrupção”. Ufa! Rapaz
consciencioso! Acha que isso tem de ser investigado. Ótimo! Mas não se
pode cassar, sustenta, um governo eleito por 54 milhões, ainda mais
esse, que, diz ele, tirou milhões da pobreza.
Moura
nasceu em 1976. Tinha 16 anos quando Collor foi impichado, em 1992. Já
dá pra não ser um idiota. Também aquele projeto estava amparado na
corrupção e também aquele presidente foi eleito. E por que foi legítimo
derrubá-lo? Huuummm… É que Collor não tirou milhões da pobreza.
Corolário: quando um governo realiza uma obra social que Moura aprova,
ainda que seja ladravaz, não pode ser deposto.
Ou por outra: os pobres são usados como lavanderia moral de governos corruptos.
Grande Wagner Moura!
O
argumento jurídico de seu texto é canhestro. Segundo ele, trata-se de um
“impeachment sem crime de responsabilidade”. Um ator não é obrigado a
ler a Constituição e a Lei 1.079. A menos que vá escrever sobre
impeachment. A pedalada fiscal é crime de responsabilidade, rapaz! Não
me obrigue a fazer piadinhas com o Capitão Nascimento… Mais: não são
apenas os crimes de responsabilidade que podem levar ao impedimento.
Outro
argumento que ele deve ter achado definitivo: o nome de Dilma, diz ele,
não está na lista da Odebrecht. Erros em série. Nem mesmo se sabe o que é
e o que é não crime na lista; o fato de o nome dela não estar lá não a
absolve da pedalada. Ou do crime de obstrução da Justiça cometido na
nomeação de Lula, segundo o procurador-geral da República — o crime está
apontado na denuncia da OAB.
Mas, até
aqui, operei só na desinformação de Wagner Moura. Agora vamos à sua
pouca inteligência, ainda que seja um excelente ator — e nem assim acho
que Francis estava certo como regra.
Escreve o bruto:
“Ser legalista não é o mesmo que ser governista, ser governista não é o mesmo que ser corrupto. É intelectualmente desonesto dizer que os governistas ou os simplesmente contrários ao impeachment são a favor da corrupção.”
“Ser legalista não é o mesmo que ser governista, ser governista não é o mesmo que ser corrupto. É intelectualmente desonesto dizer que os governistas ou os simplesmente contrários ao impeachment são a favor da corrupção.”
Bem, eu já
demonstrei que ele está sendo “ilegalista”. Mas é o de menos. De fato,
ser legalista (em tese) não é sinônimo de governista, que não é sinônimo
de corrupto.
Pergunto a Wagner Moura se ele reconhece como válida a seguinte formulação:
“Ser a favor do impeachment não é o mesmo que ser antipetista, que não é o mesmo que ser golpista”.
“Ser a favor do impeachment não é o mesmo que ser antipetista, que não é o mesmo que ser golpista”.
Reconhece ou não, Wagner Moura?
Ou seus pensamentos delicados e matizados têm validade apenas para os que pensam como você?
Essa minha
pergunta desmonta de forma um tanto vexaminosa a falsa tolerância de
Moura com a divergência e expõe o sestro de todo esquerdista mixuruca: o
mundo se divide entre os bons, que estão com eles (às vezes, roubam um
pouco), e os maus: os que pensam de modo diferente.
É claro que um grande ator pode ser inteligente.
Não é o caso de Wagner Moura. Definitivamente. A menos que tenha decidido fazer o papel de bobo. E aí o ator merece os parabéns!
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