Sinais da decadência
Temos capacidade para reverter o processo
iniciado em 2012? Perto de nós existem exemplos patéticos de insucesso.
Venezuela e Argentina destruíram o que conquistaram
Murillo de Aragão - O Globo
Muitas civilizações e muitos países entraram em processo de
decadência irreversível. Foram capturados por uma espiral descendente e
não tiveram condições de sair dela. O Egito Antigo e a Grécia são
exemplos clássicos. A Espanha de hoje é uma sombra da potência mundial
que já foi. O Reino Unido, onde o sol nunca se punha, deixou de ser o
que era. Todos foram e deixaram de ser, ainda que com graus variados de
fracasso e decadência. Alguns, como o Reino Unido, se adaptaram aos
novos tempos. Outros nem tanto, como a Espanha. A Grécia vive do
passado.
Esse processo de decadência estaria acontecendo aqui no Brasil? Será
que estamos entrando em processo de decadência antes mesmo de termos
tido os benefícios do sucesso absoluto? Sem dúvida, sim. O Brasil vive
um processo de decadência econômica e social, iniciado em 2012, que pode
durar anos e se transformar em tendência irresistível. Os focos de
alarme estão na gestão da questão fiscal, na demora em promover ajustes
essenciais no arcabouço institucional do país e na completa rendição aos
interesses corporativistas de burocratas e de grandes corporações. Há
muito digo que o Estado foi sequestrado por interesses específicos e que
não consegue resistir a eles.
A
outra dúvida que se apresenta: temos ou não capacidade para reverter o
processo iniciado em 2012? Perto de nós existem exemplos patéticos de
insucesso. Venezuela e Argentina destruíram o que conquistaram de bom.
São sociedades em processo acelerado de decadência. O caso argentino é
mais grave, quando se pensa no sucesso social e econômico do país no
século passado. Foi tudo destruído pelo populismo irresponsável. O pior é
que não há reflexão profunda sobre as raízes do fracasso e da
decadência. Culpa-se o mundo, culpam-se os fundos abutres e os vizinhos.
Nunca a si próprio.
No Brasil, a era Lula entrou na antessala do sucesso, e chegamos a
achar que nosso lugar por lá era cativo. Que, finalmente, fazíamos o
mundo se curvar à nossa grandeza. A capa da “The Economist” com o Cristo
Redentor decolando nos dava a certeza do “agora vai!”. Promovemos uma
Copa do Mundo e vamos para as Olimpíadas, responsabilidade que o mundo
nos deu acreditando em nossa capacidade. No delírio, chegamos a dar
lições de moral à Alemanha de Merkel em 2012, quando Dilma criticou o
receituário de austeridade preconizado pela líder alemã.
Agora, para evitar a decadência, temos de ser austeros, pragmáticos e
humildes. Não é o que parece que acontecerá. O governo trata da crise
fiscal com incompetência. Incapaz de se decidir pelos cortes e de
enfrentar a questão de frente junto com a população, busca o déficit
primário como disfarce para uma covardia institucional imensa. Pior,
tratou da perda do investment grade como se isso não tivesse grande
importância. O mundo já está complicado o bastante para que deixemos de
fazer o dever de casa da recuperação.
Nossa grave incompetência e nossa covardia institucional podem estar
dando início a um longo processo de decadência. A presidente Dilma
Rousseff, por conta das indefinições em torno de um possível
impeachment, ainda tem tempo para tomar as medidas corajosas de que o
país precisa. Ela poderia fazer uma autocrítica séria dos erros de sua
gestão e iniciar um processo de recuperação do país e, quem sabe, de seu
mandato. Porém, ainda não chegamos ao ponto de deixarmos de ser
covardes e mostrar coragem cívica.
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