sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Repasses para hospitais e farmácia popular atrasarão, diz ministro da Saúde
NATÁLIA CANCIAN - FSP
Em sua primeira entrevista após assumir o cargo, o novo ministro da Saúde, o médico e deputado federal Marcelo Castro (PMDB-PI), disse à Folha que, diante da restrição orçamentária, deve atrasar o repasse de recursos para hospitais e programas como o Farmácia Popular já em dezembro deste ano.
A previsão é que 50% da verba destinada para a área de média e alta complexidade, que abrange o atendimento em pronto-socorro e realização de cirurgias e exames, seja paga apenas no início de janeiro.
Segundo Castro, o novo modelo de cálculo de financiamento da Saúde, aprovado neste ano pelo Congresso, deve trazer um deficit de ao menos R$ 7,5 bilhões em recursos para 2016. "O que hoje está ruim vai piorar."
Para obter recursos, o ministro defende a aprovação de uma nova CPMF compartilhada entre União, Estados e municípios –em uma proposta na qual os últimos, porém, teriam a arrecadação exclusivamente para a saúde.
Na entrevista, o ministro defendeu "intensificar" o Mais Médicos e disse que novos programas como o Mais Especialidades, bandeira de Dilma Rousseff na sua campanha, dependerão da liberação de recursos.
Folha - O senhor disse a secretários que não haverá recursos para pagar todos os serviços contratados neste ano.*
Marcelo Castro - No ano passado isso já aconteceu. O pacote de ações de média e alta complexidade [como hospitais e Santas Casas] só foi pago 70% em dezembro e 30% no dia 2 de janeiro. Neste ano, não temos hoje dinheiro para pagar alguns serviços.
Quais serviços?
Média e alta complexidade (MAC), Farmácia Popular e outros mais. Para MAC, só temos recursos para 50% do que foi faturado em dezembro [cerca de R$ 3 bilhões; no caso da Farmácia Popular, cujo repasse mensal é de R$ 260 milhões, o percentual a ser pago ainda será definido, informa o ministério].
Estamos buscando alternativas para ver se a gente consegue pagar tudo este ano. Se não conseguirmos, não trará transtorno porque em janeiro nós pagaremos. A grande preocupação não é de quem está prestando o serviço, é do próprio ministério, porque vamos ter em 2016 um Orçamento menor.
Qual a previsão para o ano que vem? Faltará recursos?
O Orçamento está sendo construído ainda. O problema de 2016 é que, pela nossa sistemática que é a emenda constitucional 86 [orçamento impositivo, aprovado pelo Congresso neste ano e que mudou o financiamento da saúde] o governo está sendo obrigado a gastar em ações e serviços públicos de saúde, que são despesas obrigatórias, 13,2% das receitas correntes líquidas.
Isso dá um orçamento para a Saúde de R$ 100,2 bilhões [o deste ano, sem os cortes orçamentários, era R$ 121 bilhões]. Se não tivesse essa regra e a gente aplicasse apenas a inflação do Orçamento deste ano para o do ano que vem, ele seria de R$ 107,7 bilhões. Essa regra nova já traz um deficit de R$ 7,5 bilhões. Se o Orçamento deste ano não tem dinheiro para pagar tudo, e se o do ano que vem é menor, como vai ser?
Nesse momento, não dá para pensar em programa novo ou aumentar despesas. Vamos manter o que está funcionando e não deixar de prestar serviços.
Ainda assim, pode haver cortes? A proposta enviada ao Congresso para 2016 também previa menos recursos para hospitais e Farmácia Popular.
Estamos conversando com a área econômica, com o relator do orçamento e Casa Civil. O argumento central é que um ministério que vai fazer uma obra física pode fazer em outro momento. O nosso não pode interromper os serviços que vem prestando. Temos certeza que a área econômica do governo vai ser sensível a isso. A saúde tem que ter atenção especial. Estamos tratando de vidas humanas. Os serviços já estão contratados. Não podemos chegar em outubro do ano que vem e dizer: parem o tratamento de câncer, as cirurgias e as hemodiálises e vamos recomeçar em janeiro.
E qual a solução?
Mais recursos. A área econômica tem uma proposta que é a CPMF. Ela é mais importante no momento para os Estados e municípios, principalmente para os municípios, que estão gastando além do mínimo constitucional porque são premidos pela demanda da sociedade. E entraria para melhorar a saúde. Há um consenso de que padecemos de dois problemas centrais na saúde: subfinanciamento e problemas de gestão, que envolve inclusive a má aplicação e o desvio de recursos. Está aí a CPI das órteses e próteses.
O senhor tem conversado com a presidente sobre a CMPF? Deve levar para a saúde? O Planalto já descarta que seja aprovada neste ano.
O que estamos argumentado junto à área econômica é que a CPMF proposta inicialmente para a Previdência vá para a seguridade social (saúde, previdência e assistência social), para União e Estados, e exclusivamente para a saúde para municípios.
Mas e se não passar? Há outras alternativas estudadas?
O governo não fecha suas contas sem aporte de recursos, sem mais impostos. Seja CPMF, CIDE (tributo cobrado sobre combustíveis), repatriação de recursos ou IOF.
Quais devem ser as prioridades de sua gestão?
Vamos priorizar a atenção básica. E vamos também fazer ajustes no cartão SUS, de modo que o paciente possa levar seu prontuário para onde for. Isso vai ser integrado com secretarias de saúde e muito provavelmente com os planos de saúde. Também vamos investir na regionalização. O ideal é que o paciente só saísse da região no caso de doenças graves.
O Mais Médicos vai mudar? Cubanos devem continuar?
Vai ser intensificado. É um programa muito bem avaliado e de grande alcance social.
Sem recursos, como fica o Mais Especialidades?
Ele já está concebido, mas não funciona ainda na prática. Vamos ver quando é que vamos ter recursos. Nossa prioridade no momento é manter funcionando o que já está funcionando. 

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