Renato Costa/FramePhoto/Folhapress | ||
Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) em reunião na quarta-feira |
Por 8 votos a 3, os ministros decidiram que esse tipo de tráfico não
deve ser considerado hediondo, portanto, integrar o rol de crimes mais
graves e sem direito a benefícios de pena aos condenados.
Com isso, o traficante nessa situação poderá ter uma situação jurídica diferenciada, como, por exemplo, começar a cumprir a pena no regime semiaberto, em que o preso pode sair durante o dia para trabalhar e voltar à noite para a cadeia, além de pena reduzida de um sexto a dois terços, como os demais condenados por crime comum.
Para a maioria do STF, as condições do crime (como a quantidade de drogas) e a situação do acusado (como bons antecedentes) influencia na avaliação sobre o enquadramento de delito hediondo.
ESVAZIAMENTO DAS CADEIAS
"É um absurdo tratar [os traficantes] com tamanha benevolência", diz Christiano Jorge Santos, chefe do departamento de direito penal e processual penal da PUC-SP.
"O que dá a entender é que o Supremo não entende que o tráfico seja um crime grave, ou que está decidindo no intuito de abrir vaga em presídios, o que me parece equivocado nos dois aspectos", afirma Santos, ressaltando que "a política do esvaziamento de cadeias não é papel do Judiciário."
O professor lembra que o caso que serviu de base para a discussão dos ministros era o do porte de 772 quilos de maconha em uma caminhonete em Mato Grosso do Sul, o que indica que não se tratavam de traficantes de pequeno porte, apesar de não haver antecedentes. "Não é um usuário de crack que está com duas pedrinhas para manter próprio vício".
Para Renato Sérgio de Lima, vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o caso utilizado para a decisão talvez não seja o mais adequado para estabelecer a mudança, mas sinaliza a intenção do Supremo de lidar com a superlotação do sistema prisional brasileiro. "Hoje boa parte dos detentos é preso em função do trafico", diz.
Segundo Lima, existem criminosos que realmente precisam ser presos, como homicidas, chefes de facção e integrantes do crime organizado. "Cerca de 40% dos presos estão em situação provisória, não passaram por julgamento. A prisão não é a melhor saída para o microtraficante, réu primário. Isso é alimentar o crime organizado com recursos humanos."
Lima diz ainda que a atividade de compra e venda de drogas não é necessariamente violenta. "É o crime organizado em volta do tráfico que é, para fazer o capital de giro dele. A droga não pode ser desconectada do problema da prisão hoje", afirma.
Ele acredita que o correto seria o Congresso tratar do tema, mas que "o Supremo está tendo que atuar no vácuo da não decisão legislativa".
A DECISÃO
O tema começou a ser discutido em 2015 pelo tribunal, e a indicação era de que a maioria do Supremo votaria para considerar que o crime de tráfico de drogas deve ser considerado hediondo em todas as situações. Após pedidos de vista, o caso foi retomado nesta quinta, quando os ministros Edson Fachin, Teori Zavascki e Rosa Weber mudaram seus votos e o entendimento adotado pelo tribunal.
Os três seguiram a corrente puxada pela ministra Cármen Lúcia de que um réu primário e com bons antecedentes não pode receber pena grave. "No caso de tráfico privilegiado, tais pessoas devem ter tratamento distinto dos que comandam organização", disse a ministra no ano passado. Segundo Fachin, a lei que define crime hediondo é cuidadosa e o regime excepcional não se estende ao tráfico privilegiado.
O presidente do STF, Ricardo Lewandowski, e Celso de Mello destacaram o efeito do entendimento especialmente para mulheres presas. Lewandowski disse que estudos apontam que mais de 60% das mulheres presas no país estão envolvidas em tráfico de drogas. O presidente do tribunal disse ainda que muitas mulheres são envolvidas no tráfico em troca de vantagem econômica, como as mulas.
Os ministros Luiz Fux, Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello defenderam que a lei é clara e todo o tráfico é crime hediondo. "Recuso-me a entender que um crime pode ser privilegiado", afirmou.
A decisão do STF não obriga as demais instâncias a decidir dessa maneira, mas como se trata de decisão da mais alta corte do país, a tendência é que seja replicada nos demais tribunais.
O crime em Mato Grosso do Sul que serviu de base para a discussão no STF foi cometido no mês de abril de 2009 e, em junho de 2010, juiz da Comarca de Nova Andradina (MS) condenou os réus à pena de sete anos e um mês de reclusão, mas sem considerar o crime hediondo. Em seguida, o Ministério Público recorreu pedindo o reconhecimento da natureza hedionda do delito, e um dos réus solicitou também a redução da pena.
O Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul negou provimento às duas apelações e o MP recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em abril de 2012, o relator naquela Corte, em decisão monocrática, deu provimento ao recurso, reconhecendo a natureza hedionda do delito praticado pelos réus. A Defensoria Pública recorreu ao STF em nome dos dois condenados. O Supremo concedeu o habeas corpus para não ser crime hediondo e terem benefícios de redução de pena.
Com isso, o traficante nessa situação poderá ter uma situação jurídica diferenciada, como, por exemplo, começar a cumprir a pena no regime semiaberto, em que o preso pode sair durante o dia para trabalhar e voltar à noite para a cadeia, além de pena reduzida de um sexto a dois terços, como os demais condenados por crime comum.
Para a maioria do STF, as condições do crime (como a quantidade de drogas) e a situação do acusado (como bons antecedentes) influencia na avaliação sobre o enquadramento de delito hediondo.
ESVAZIAMENTO DAS CADEIAS
"É um absurdo tratar [os traficantes] com tamanha benevolência", diz Christiano Jorge Santos, chefe do departamento de direito penal e processual penal da PUC-SP.
"O que dá a entender é que o Supremo não entende que o tráfico seja um crime grave, ou que está decidindo no intuito de abrir vaga em presídios, o que me parece equivocado nos dois aspectos", afirma Santos, ressaltando que "a política do esvaziamento de cadeias não é papel do Judiciário."
O professor lembra que o caso que serviu de base para a discussão dos ministros era o do porte de 772 quilos de maconha em uma caminhonete em Mato Grosso do Sul, o que indica que não se tratavam de traficantes de pequeno porte, apesar de não haver antecedentes. "Não é um usuário de crack que está com duas pedrinhas para manter próprio vício".
Para Renato Sérgio de Lima, vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o caso utilizado para a decisão talvez não seja o mais adequado para estabelecer a mudança, mas sinaliza a intenção do Supremo de lidar com a superlotação do sistema prisional brasileiro. "Hoje boa parte dos detentos é preso em função do trafico", diz.
Segundo Lima, existem criminosos que realmente precisam ser presos, como homicidas, chefes de facção e integrantes do crime organizado. "Cerca de 40% dos presos estão em situação provisória, não passaram por julgamento. A prisão não é a melhor saída para o microtraficante, réu primário. Isso é alimentar o crime organizado com recursos humanos."
Lima diz ainda que a atividade de compra e venda de drogas não é necessariamente violenta. "É o crime organizado em volta do tráfico que é, para fazer o capital de giro dele. A droga não pode ser desconectada do problema da prisão hoje", afirma.
Ele acredita que o correto seria o Congresso tratar do tema, mas que "o Supremo está tendo que atuar no vácuo da não decisão legislativa".
A DECISÃO
O tema começou a ser discutido em 2015 pelo tribunal, e a indicação era de que a maioria do Supremo votaria para considerar que o crime de tráfico de drogas deve ser considerado hediondo em todas as situações. Após pedidos de vista, o caso foi retomado nesta quinta, quando os ministros Edson Fachin, Teori Zavascki e Rosa Weber mudaram seus votos e o entendimento adotado pelo tribunal.
Os três seguiram a corrente puxada pela ministra Cármen Lúcia de que um réu primário e com bons antecedentes não pode receber pena grave. "No caso de tráfico privilegiado, tais pessoas devem ter tratamento distinto dos que comandam organização", disse a ministra no ano passado. Segundo Fachin, a lei que define crime hediondo é cuidadosa e o regime excepcional não se estende ao tráfico privilegiado.
O presidente do STF, Ricardo Lewandowski, e Celso de Mello destacaram o efeito do entendimento especialmente para mulheres presas. Lewandowski disse que estudos apontam que mais de 60% das mulheres presas no país estão envolvidas em tráfico de drogas. O presidente do tribunal disse ainda que muitas mulheres são envolvidas no tráfico em troca de vantagem econômica, como as mulas.
Os ministros Luiz Fux, Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello defenderam que a lei é clara e todo o tráfico é crime hediondo. "Recuso-me a entender que um crime pode ser privilegiado", afirmou.
A decisão do STF não obriga as demais instâncias a decidir dessa maneira, mas como se trata de decisão da mais alta corte do país, a tendência é que seja replicada nos demais tribunais.
O crime em Mato Grosso do Sul que serviu de base para a discussão no STF foi cometido no mês de abril de 2009 e, em junho de 2010, juiz da Comarca de Nova Andradina (MS) condenou os réus à pena de sete anos e um mês de reclusão, mas sem considerar o crime hediondo. Em seguida, o Ministério Público recorreu pedindo o reconhecimento da natureza hedionda do delito, e um dos réus solicitou também a redução da pena.
O Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul negou provimento às duas apelações e o MP recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em abril de 2012, o relator naquela Corte, em decisão monocrática, deu provimento ao recurso, reconhecendo a natureza hedionda do delito praticado pelos réus. A Defensoria Pública recorreu ao STF em nome dos dois condenados. O Supremo concedeu o habeas corpus para não ser crime hediondo e terem benefícios de redução de pena.
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