Juros fervem no óleo de Levy
'Obra aberta' do Orçamento e boataria sobre ministro levam juros ainda para cima, apesar do BC
Vinicius Torres Freire - FSP
JOAQUIM LEVY "não está desgastado", "não está isolado", faz parte de uma
"família que tem várias opiniões", que não "está desunida", disse ontem
Dilma Rousseff no início da tarde de um dia de taxas de juros e câmbio
subindo em espiral de fumo para os céus. Não adianta, sob certo aspecto,
que o Banco Central tenha deixado a taxa "básica" da economia em
14,25%. Na praça, o sangue continua correndo.
Pior essa emenda da presidente do que a epopeia pelo avesso que vive o
ministro da Fazenda. Pelo menos para os donos do dinheiro grosso e seus
operadores, para quem a declaração presidencial apenas confirmou que o
plano de Levy é apenas um dentre tantos de que eles, "mercado", não
gostam.
A presidente acabou por dizer que o ministro está "prestigiado",
lembrando a velha e caricata história do presidente de clube de futebol
com time em crise, na zona de rebaixamento, a dizer que o técnico não
vai cair. Foram umas gotas adicionais de vinagre em um dia azedo pelos
boatos de que o ministro conversara com a presidente e com Michel Temer
sobre seu "futuro incerto" no governo.
Dada a boataria dispersa, é uma temeridade ainda maior dizer se e o que a
presidente conversou ontem com Levy. Quanto à conversa com o
vice-presidente, gente do PMDB vazava sem dó para o "mercado" e para
jornalistas que o ministro da Fazenda dissera estar em dúvida sobre o
que fazer de seu "futuro incerto" no governo e muito preocupado com o
futuro da eco- nomia, com o presente "descontrole". Um peemedebista
dizia alegremente que o ministro está "frito e desenganado". Parcela
importante do PMDB tem uma birra incompreensível com Levy.
O dia nem precisava de mais notícias confusas, telefones sem fio e
azedume. Começara com o ministro da Fazenda dado como destituído em vida
em vários jornais, embora o problema de fundo nem de longe seja esse,
mas o fato de um gover- no que já tem não apoio popular e parlamentar
agora não contar também com um Orçamento. Ou que talvez tenha um
Orçamento em prestações, parcelado, como insinuou ontem a presidente
quando adiantou a ideia exótica de que seu governo mandará ao Congresso
um adendo ao projeto de lei orçamentária. Trata-se de uma obra em
progresso, menos inteligível que o Finnegans Wake, de James Joyce, que
popularizou o termo.
Em paniquito pela falta de sentido dessa obra aberta, o "mercado" reagiu
à altura, levando as taxas de juros da praça e o dólar para as alturas.
A taxa de juro real de curto prazo, um ano, foi a 8,72% (14,87%
nominais), para onde não viajava desde novembro de 2008. Os juros
longos, taxas que os donos do dinheiro cobram para ficar com papéis do
governo que vencem em dez anos ou mais, por aí, foram a 7,5% (por
exemplo, papel de 2024), em disparada quase contínua desde a trégua de
meados de julho. Para constar, a taxa real de juros estava em 7,7% na
data da reunião anterior do BC para decidir juros, quando elevou a Selic
para 14,25%, em 29 de julho.
Na praça do mercado, as condições de negociar dinheiro estão mais duras.
O aperto monetário, na prática, continua. Mesmo sem histerias e
especulações desvairadas, o aperto deve continuar até o início de 2016.
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