segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Um preço alto
TEMA EM DISCUSSÃO: Legalização do jogo para criar receita extra contra a crise 
O Globo
A legalização do jogo é uma aposta oportunista que, volta e meia, retorna à mesa de negociações no Congresso, patrocinada pela operosa bancada de parlamentares que emprestam o mandato ao lobby da jogatina. Por sua vez, os governos lulopetistas sempre tiveram um posição ambígua em relação ao tema, ora estimulando ensaios para a liberação do jogo, ora recuando.
Não é de estranhar que, desesperado pela criação de novas receitas para tapar o buraco fiscal em que permanecem atolados o Orçamento e o país, o Planalto não tenha desestimulado, de maneira inequívoca, os movimentos no Senado que buscam abrir nova temporada de pressões em favor da volta de cassinos e similares. Ao contrário, a própria presidente Dilma Rousseff teria sondado deputados sobre a receptividade da ideia.
Não faltam razões para condenar a legalização do jogo no Brasil. A decorrência mais imediata seria jogar no colo do crime organizado, dono de uma estrutura bem montada da jogatina clandestina, o controle de fato dessa atividade. O Estado não teria meios, ainda que contasse com vontade política, de conter o avanço da criminalidade sobre as apostas.
As quadrilhas brasileiras que hoje dominam no subterrâneo as diversas modalidades de jogos de azar têm a expertise de burlar o controle estatal, fruto de conexões com máfias internacionais, uma evidência comprovada por operações policiais contra a exploração de máquinas caça-níqueis e similares.
A legalização também balizaria operações de lavagem de dinheiro sujo. A Operação Lava-Jato, que desmonta os esquemas lulopetistas de desvio de dinheiro criados no âmbito do petrolão, tem revelado que partidos políticos e operadores financeiros se valem de tecnologias e métodos sofisticados para sangrar o Estado. Esses grupos dominam técnicas avançadas para lavar o produto de assaltos ao caixa de órgãos públicos e outras operações ilícitas. Colocar, sob o anteparo da liberação legal, o jogo nesse pantanoso universo abrirá mais espaço para a “indústria” das lavanderias de dinheiro.
Por natureza, o jogo no Brasil tem um DNA contaminado pela criminalidade, pela violência e pela burla a regras próprias de atividades que funcionam na legalidade. Legalizá-lo num país onde há uma crônica opção pela impunidade, inclusive relacionada a crimes de colarinho branco, seria um campo a mais a se abrir para criminosos operar, sob anteparo legal, seus suspeitos métodos de enriquecimento ilícito e lavagem de dinheiro.
As iniciativas no Senado em favor da liberação não estão limitadas a discursos. Há propostas tramitando na Casa. Na Câmara, está para ser instalada uma comissão especial para analisar a legalização do jogo. O canto da sereia para atrair a boa vontade do governo é a perspectiva de que o jogo recolha para os cofres públicos R$ 20 bilhões por ano. Por questões éticas e por ferir compromissos do poder público com o combate à criminalidade, é um preço alto, que não vale a pena o país pagar. O caminho para superar as dificuldades fiscais do momento não pode passar por esse tipo de aposta.

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