sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Microcefalia e a geração perdida
Patrícia Campos Mello - FSP
Na manhã desta quinta-feira (28), 30 mulheres e seus bebês aguardavam para serem atendidos na Fundação Altino Ventura, aqui no Recife.
Todos os bebês estavam no colo das mães, que pareciam exaustas. Não havia bercinhos, moisés ou carrinhos. A maior parte dos bebês com microcefalia chora sem parar e só sossega no colo da mãe. As mães passam todo o tempo balançando os bebês e fazendo carinho nas cabecinhas, muito pequenas.
Os bebês passaram por consultas com neuropediatras, oftalmologistas, psicólogos, fonoaudiólogos. As mães seguem a recomendação do governo e dos médicos de que fazer uma estimulação precoce –isto é, exercícios motores, visuais, auditivos e intelectuais desde o nascimento– ajuda as crianças a desenvolverem todo seu potencial.
Mas a realidade é que ninguém sabe ao certo como essas crianças vão se desenvolver, que tipo de reabilitação ajuda, por que exatamente elas desenvolveram microcefalia e quão grave vai ser o retardo mental que elas inevitavelmente terão.
Kleber Nunes/Folhapress
Mães de bebês com microcefalia esperam atendimento no Recife; PE tem maior número de notificações
Mães de bebês com microcefalia esperam atendimento no Recife; PE tem maior número de notificações
No Recife, capital do Estado com maior número de casos notificados de microcefalia, a neuropediatra Maria Rozivera Araújo Rodrigues acompanha desde o começo a epidemia, que aparentemente está ligada ao zika.
Dos 20 bebês que ela atendeu na quinta, todos tinham hipertonia, condição em que há um enrijecimento muscular –a criança fica "durinha". A maioria tinha a cabeça visivelmente pequena e uma espécie de "babado" de pele se forma atrás do crânio. Quase todas conseguem sugar, então mamam, no peito ou na mamadeira.
Elas têm irritabilidade extrema. "Não sabemos se é porque elas têm dor de cabeça por causa da malformação no cérebro", diz Rozivera. Muitas enxergam pouco e ouvem mal. "E ainda não dá para dizer quão grave é o retardo intelectual, mas certamente será grande."
O fato é que se sabe muito pouco sobre a doença, diz a neuropediatra. "Não sabemos o que esperar dessas crianças, é tudo muito novo para todos nós; não sabemos como elas vão responder à reabilitação, estamos começando do zero".
Mas ela está certa de que será uma "geração perdida, que não vai ter nenhum grau de autonomia". "Nunca vi isso na minha vida, um número tão grande de crianças com uma deficiência tão grave. Estamos entrando em um barco sem saber aonde ele vai." 

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