Muito barulho por nada
FSP
Instituído em 1985, nos primórdios da redemocratização do país, o
Ministério da Cultura foi reflexo simbólico, proposital ou não, do papel
que artistas e intelectuais haviam desempenhado nas pressões pelo fim
do regime militar.
Decorridas mais de três décadas desde lá, a pasta nunca assumiu
dimensões claramente compatíveis com o status ministerial. No Orçamento
de 2017, conta com R$ 2,7 bilhões —menos, por exemplo, que o reservado à
Universidade Federal do Rio de Janeiro ou ao IBGE.
Está sob sua jurisdição, ainda, R$ 1,7 bilhão ao ano em benefícios
tributários como os da Lei Rouanet, motivo de disputas e controvérsias
que se arrastam por anos.
Entretanto o ministério se manteve como canal de interlocução
privilegiada com o governo para uma parcela influente, embora
minoritária, da sociedade organizada.
Nesse contexto se podem entender os protestos desse segmento quando, em
2016, Michel Temer (PMDB) ensaiou reincorporar a estrutura da Cultura ao
Ministério da Educação —o que, por sua vez, constituía outro
simbolismo, a demonstrar austeridade (sem economia real de dinheiro
público).
Temer preferiu não levar adiante a medida, que poderia gerar desgaste
adicional à imagem de um governo impopular desde o nascedouro. A pasta
preservada ganha agora seu terceiro titular em pouco mais de um ano, o jornalista Sérgio Sá Leitão.
Seus antecessores não se mostraram confortáveis na função. O primeiro
deles, o diplomata Marcelo Calero, nunca obteve o respaldo do meio
cultural. Deixou o cargo ao ver-se pressionado pelo então ministro
Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) a liberar uma obra em Salvador.
O substituto, o pernambucano Roberto Freire (PPS), pouco apresentou que
fosse digno de nota. Protagonizou um embate público com o escritor
Raduan Nassar, defensor do PT, e pediu demissão quando o presidente da
República foi atingido pela delação da JBS.
Difícil crer que o novo ministro possa angariar simpatias a Temer na
classe artística, embora tenha experiência e trânsito no setor –foi
secretário municipal de Cultura do Rio, no governo de Eduardo Paes
(PMDB), chefe de gabinete do ministério na gestão de Gilberto Gil
(governo Lula) e diretor da Ancine (Agência Nacional do Cinema).
Haverá, decerto, políticas a serem propostas ou aperfeiçoadas. Como o próprio Sá Leitão escreveu nesta Folha, em maio do ano passado, tais providências independem de haver ou não um ministério exclusivo para a Cultura.
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