Presidencialismo enfraquecido
Merval Pereira - O Globo
Ramon Puerta, presidente do Senado, assumiu novamente, mas durou
apenas 15 minutos e renunciou. Eduardo Oscar Camaño, presidente da
Câmara, assumiu em seu lugar e no dia seguinte a Assembléia elegeu
Eduardo Duhalde, governador da província de Buenos Aires, que ficou no
poder até maio de 2003, quando houve eleição presidencial para o mandato
normal, vencida por Nestor Kirchner após Carlos Menem ter desistido do
segundo turno.
Se o presidente Michel Temer for removido do Palácio do Planalto para
responder a um processo por crime de corrupção passiva perante o
Supremo Tribunal Federal, Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos
Deputados, ascenderá à chefia do Poder Executivo. Se Temer for condenado
e perder definitivamente o mandato, o Congresso escolherá o novo
presidente da República, o qual, provavelmente, será o próprio Maia. Se
Maia não quiser se candidatar à reeleição, ou não puder por falta de
apoio, mas sim ao governo do Rio, terá que se desincompatibilizar seis
meses antes da eleição, e o novo presidente da Câmara assumirá a
presidência da República em seu lugar. Ele pode, ainda, se
candidatarnovamente a deputado federal.
O cientista político Octavio Amorim Neto, professor da EBAPE/FGV,
escreveu no Boletim Macro do IBRE deste mês um artigo onde aponta esta
sucessão de presidentes como um dos sintomas da decadência do
presidencialismo brasileiro: “(...)em 2017, é possível que um segundo
presidente seja destituído em menos de dois anos e que, ao longo do
quadriênio 2015-2018, tenhamos três ou quatro chefes do Executivo”, diz
ele.
Para o cientista político, o enfraquecimento do presidencialismo não
tem sido obra de um plano deliberado. O primeiro grande torpedo que
recebeu o regime, lembra ele, foi a votação final do afastamento de
Dilma pelo Senado Federal em agosto de 2016.
Para Octavio Amorim Neto, “(...) Ao contrário do que se tem dito, não
foram as motivações políticas da deposição dessa mandatária que deram o
caráter “parlamentarista” da decisão. Foi, isto sim, o fato de Dilma
não ter perdido seus direitos políticos ao ser removida do Palácio do
Planalto, tal qual acontecera com Fernando Collor em 1992. O que
diferencia a destituição de um chefe de governo de um regime
presidencialista daquela de um regime parlamentarista não é o móbil
subjacente ao voto dado pelos legisladores, mas o fato de que, sob o
primeiro sistema de governo, a remoção do chefe do Executivo por crime
de responsabilidade acarreta também uma punição legal por meio da perda
dos direitos políticos, o que não ocorre sob o parlamentarismo”.
Outro aspecto que tem caracterizado o enfraquecimento do
presidencialismo, para ele, é o reconhecimento, pelo próprio presidente
Michel Temer, de que seu governo é “semiparlamentar”. Também o clamor
por eleições presidenciais e parlamentares antecipadas por parte dos
líderes dos dois principais “partidos presidenciais” do Brasil, o PT e o
PSDB, enfraquece o presidencialismo, pois “(...) um dos elementos
essenciais desse sistema de governo é justamente o caráter fixo dos
mandatos do presidente e dos congressistas. Pedir “Diretas Já”, como tem
feito Lula, ou eleições gerais antecipadas, como sugeriu Fernando
Henrique Cardoso, é lançar um torpedo na nau presidencialista”, analisa
Octavio Amorim Neto.
Em suma, diz ele, aqueles que desde 1985 – quando foi criada a
Comissão Arinos, passando pela Assembleia Nacional Constituinte de
1987-88 e chegando ao plebiscito de 1993 sobre a forma e o sistema de
governo – têm militado pela substituição do nosso atual presidencialismo
puro pelo parlamentarismo puro ou pelo semipresidencialismo, do tipo
francês ou português, as condições políticas encontram-se cada vez mais
maduras para que o desejo se transforme em realidade.
“Para que saiamos da depressão causada pelo atual noticiário
político-policial, é fundamental que se comece a discutir seriamente o
sistema de governo mais adequado para o novo Brasil que certamente
nascerá das urnas de outubro de 2018”, exorta Octavio Amorin Neto.
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