É negativo o exemplo dos procuradores federais: o conselho superior do MPF incluiu no orçamento de 2018 um reajuste de 16%
Carlos Alberto Sardenberg - O Globo
Está certo que o governo tem despesas obrigatórias, isso querendo dizer que não podem ser eliminadas ou mesmo reduzidas. Ok, mas não é obrigatório aumentar essas despesas.
Salário do funcionalismo está no rol das
obrigatórias, assim como o pagamento das aposentadorias e pensões. Mas o
problema não é esse. É que essa despesa aumenta não obrigatoriamente — e
isso estoura as contas.
A meta do governo federal deste ano é reduzir o déficit para R$ 139 bilhões. Leram bem. Esse baita rombo, se atingido, terá sido um êxito, porque menor que o buraco de 2016. Mais ou menos como perder o jogo por 4 a 1 depois de estar perdendo por 4 a 0.
E há sérias dúvidas sobre a possibilidade de diminuir a goleada. No primeiro semestre deste ano, o déficit superou largamente o resultado do mesmo período de 2016.
Fora do governo, o pessoal dá quase como certo que o estouro da meta anual será de uns R$ 6 bilhões, pelo menos. E sabem quanto o governo está gastando a mais por conta de reajustes salariais concedidos em 2016 para diversas categorias do funcionalismo? Cerca de R$ 20 bilhões.
Simples assim: se os reajustes, que não eram obrigatórios, não tivessem sido concedidos, a meta fiscal deste ano seria facilmente cumprida. Os reajustes não eram obrigatórios. Resultaram de decisões políticas tomadas pelo governo Temer e sua base no Congresso.
Reparem: não se trata de discutir caso a caso ou se a categoria merecia ou não. Se há um problema de dinheiro, de falta de dinheiro, não se pode aumentar a despesa de pessoal, a tal despesa obrigatória. Porque aí não tem mais como cortar.
Ou tem? Há informações segundo as quais o governo está estudando uma maneira de adiar o pagamento desses reajustes no ano que vem. Seria possível um trabalho de convencimento do funcionalismo e de suas associações?
Difícil.
Considerem o exemplo (negativo) dado pelos procuradores federais: o conselho superior do Ministério Público Federal resolveu incluir no seu orçamento de 2018 um reajuste salarial de 16%. A inflação está rodando na casa dos 3,5% ao ano, e a categoria está entre as mais bem pagas do serviço federal, com salário inicial de R$ 28 mil.
E pode-se dizer que os procuradores estão desempenhando muito bem seu papel de zelar pelo cumprimento da lei e, especialmente, combater a corrupção. A Lava-Jato é seu melhor exemplo.
Mas muita gente no país, a grande maioria dos brasileiros, está cumprindo muito bem suas obrigações tanto no setor público quanto no privado. A questão não é essa. É de dinheiro e de saber quem paga a conta.
É notória a escassez de recursos da administração federal. Procuradores frequentemente advertem sobre a possibilidade de cortes de verbas prejudicarem o combate à corrupção. E ainda assim aprovam um aumento de despesa pessoal de R$ 116 milhões ao ano? No momento em que o governo está aumentando impostos, ou seja, cobrando contas dos cidadãos? Notem: foi uma decisão unânime dos conselheiros do MPF.
Há outro ponto grave. O orçamento previsto para o órgão é de R$ 3,8 bilhões para 2018. Desse total, nada menos que R$ 3 bilhões vão para pagamento de salários. Sobram apenas R$ 800 milhões para todo o funcionamento da máquina, investigações, processos etc.
Como já está valendo a regra do teto de gastos, os conselheiros, com a aprovação da futura procuradora-geral Raquel Dodge, resolveram que será formada uma comissão para verificar onde se pode economizar no custeio para financiar o aumento de salários.
A ideia, portanto, é tirar dos R$ 800 milhões os R$ 116 milhões para a folha salarial. Ora, não estavam reclamando que pode faltar verba para as investigações? E vão tirar R$ 116 milhões? E se é possível reduzir assim o custeio, não poderiam dar uma contribuição fazendo economia?
Não faz a menor lógica. Não é sensato nem razoável. Segundo o atual procurador, Rodrigo Janot, foi uma “decisão política”, que atribuiu à futura procuradora. Esta justificou a decisão. Mas o modo como argumentou foi tão vacilante, fugindo das palavras como “aumento de salários”, que mostrou um claro constrangimento. Ela não quis desagradar à categoria no início de seu mandato.
É triste. Se uma categoria tão respeitável e tão ciosa da aplicação do espírito público não consegue compreender o difícil momento por que passa o país, o que se pode esperar?
Muitos argumentam: há muitos outros gastos aumentando no setor público e o próprio presidente Temer está gastando dinheiro para comprar votos para derrubar a denúncia contra ele na Câmara dos Deputados. Mas não é exatamente contra isso que agem os procuradores federais?
Em tempo: o orçamento do MPF e, pois, o reajuste salarial precisam ser aprovados pelo Congresso Nacional. A ver.
A meta do governo federal deste ano é reduzir o déficit para R$ 139 bilhões. Leram bem. Esse baita rombo, se atingido, terá sido um êxito, porque menor que o buraco de 2016. Mais ou menos como perder o jogo por 4 a 1 depois de estar perdendo por 4 a 0.
E há sérias dúvidas sobre a possibilidade de diminuir a goleada. No primeiro semestre deste ano, o déficit superou largamente o resultado do mesmo período de 2016.
Fora do governo, o pessoal dá quase como certo que o estouro da meta anual será de uns R$ 6 bilhões, pelo menos. E sabem quanto o governo está gastando a mais por conta de reajustes salariais concedidos em 2016 para diversas categorias do funcionalismo? Cerca de R$ 20 bilhões.
Simples assim: se os reajustes, que não eram obrigatórios, não tivessem sido concedidos, a meta fiscal deste ano seria facilmente cumprida. Os reajustes não eram obrigatórios. Resultaram de decisões políticas tomadas pelo governo Temer e sua base no Congresso.
Reparem: não se trata de discutir caso a caso ou se a categoria merecia ou não. Se há um problema de dinheiro, de falta de dinheiro, não se pode aumentar a despesa de pessoal, a tal despesa obrigatória. Porque aí não tem mais como cortar.
Ou tem? Há informações segundo as quais o governo está estudando uma maneira de adiar o pagamento desses reajustes no ano que vem. Seria possível um trabalho de convencimento do funcionalismo e de suas associações?
Difícil.
Considerem o exemplo (negativo) dado pelos procuradores federais: o conselho superior do Ministério Público Federal resolveu incluir no seu orçamento de 2018 um reajuste salarial de 16%. A inflação está rodando na casa dos 3,5% ao ano, e a categoria está entre as mais bem pagas do serviço federal, com salário inicial de R$ 28 mil.
E pode-se dizer que os procuradores estão desempenhando muito bem seu papel de zelar pelo cumprimento da lei e, especialmente, combater a corrupção. A Lava-Jato é seu melhor exemplo.
Mas muita gente no país, a grande maioria dos brasileiros, está cumprindo muito bem suas obrigações tanto no setor público quanto no privado. A questão não é essa. É de dinheiro e de saber quem paga a conta.
É notória a escassez de recursos da administração federal. Procuradores frequentemente advertem sobre a possibilidade de cortes de verbas prejudicarem o combate à corrupção. E ainda assim aprovam um aumento de despesa pessoal de R$ 116 milhões ao ano? No momento em que o governo está aumentando impostos, ou seja, cobrando contas dos cidadãos? Notem: foi uma decisão unânime dos conselheiros do MPF.
Há outro ponto grave. O orçamento previsto para o órgão é de R$ 3,8 bilhões para 2018. Desse total, nada menos que R$ 3 bilhões vão para pagamento de salários. Sobram apenas R$ 800 milhões para todo o funcionamento da máquina, investigações, processos etc.
Como já está valendo a regra do teto de gastos, os conselheiros, com a aprovação da futura procuradora-geral Raquel Dodge, resolveram que será formada uma comissão para verificar onde se pode economizar no custeio para financiar o aumento de salários.
A ideia, portanto, é tirar dos R$ 800 milhões os R$ 116 milhões para a folha salarial. Ora, não estavam reclamando que pode faltar verba para as investigações? E vão tirar R$ 116 milhões? E se é possível reduzir assim o custeio, não poderiam dar uma contribuição fazendo economia?
Não faz a menor lógica. Não é sensato nem razoável. Segundo o atual procurador, Rodrigo Janot, foi uma “decisão política”, que atribuiu à futura procuradora. Esta justificou a decisão. Mas o modo como argumentou foi tão vacilante, fugindo das palavras como “aumento de salários”, que mostrou um claro constrangimento. Ela não quis desagradar à categoria no início de seu mandato.
É triste. Se uma categoria tão respeitável e tão ciosa da aplicação do espírito público não consegue compreender o difícil momento por que passa o país, o que se pode esperar?
Muitos argumentam: há muitos outros gastos aumentando no setor público e o próprio presidente Temer está gastando dinheiro para comprar votos para derrubar a denúncia contra ele na Câmara dos Deputados. Mas não é exatamente contra isso que agem os procuradores federais?
Em tempo: o orçamento do MPF e, pois, o reajuste salarial precisam ser aprovados pelo Congresso Nacional. A ver.
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