A reeleição faz a reforma
O Estado de S.Paulo
Assim como não há chuva que não molhe, não há candidato
que não tenha o seu comitê eleitoral - desde a meia dúzia de
gatos-pingados, ajudando o amigo de olho numa cadeira de vereador em
Cabrobó dos Anzóis, às formidáveis estruturas das campanhas
presidenciais, com os melhores quadros que as afinidades ou o dinheiro
podem comprar. Nem o mais conhecido dos políticos nem a mais popular das
chamadas personalidades da sociedade do entretenimento podem dispensar
um aparato que lhes assegure o voto em escala compatível com as suas
ambições.
Nada mais natural, portanto, que a presidente Dilma Rousseff, não
obstante os recursos de poder inerentes ao mandato - como o acesso
privilegiado à mídia de massa -, dependa, também ela, de uma estrutura
que em última análise faça com que se confirme, na hora da verdade, o
favoritismo que lhe atribuem as pesquisas de opinião. O que não tem nada
de natural e tudo de indecente, porém, é a ostensiva transformação do
governo em comitê de apoio ao comitê eleitoral propriamente dito da
presidente. Pior ainda: a sujeição daquele a este, para maximizar, como
diria ela, as suas chances de vitória já no primeiro turno.
O nome oficial dessa apropriação patrimonialista - uma das tantas
enormidades que o PT aprendeu com o que há de mais retrógrado na
política nacional - é reforma ministerial. Ela decorre de um fato da
vida: por força de lei, ministros que pretendam se candidatar a cargos
eletivos devem deixar os seus postos a até seis meses da eleição. Seria,
em tese, uma oportunidade para a sua chefe substituí-los por nomes
capazes, quem sabe, de melhorar o pífio desempenho administrativo do
Executivo. Ou, com mais modéstia, promover os servidores de carreira que
conhecem a máquina por dentro, apenas para mantê-la rodando.
Com uma aparente exceção - a ida do secretário executivo da pasta da
Educação, José Henrique Paim, para o lugar do ministro Aloizio
Mercadante -, não é uma coisa nem outra. A começar do próprio
Mercadante, transferido para a Casa Civil, com a saída da ministra
Gleisi Hoffmann, que deverá disputar o governo do Paraná, as mudanças
obedecem exclusivamente ao projeto reeleitoral de Dilma. Na Casa Civil, o
ex-senador, muito além de coordenar as ações administrativas do
Planalto, terá a incumbência de manter as recalcitrantes lideranças dos
partidos governistas na coligação eleitoral. Missão talvez grande demais
para a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, incumbida
do meio-campo com a base aliada.
Assim, com o salário e as mordomias pagas pelo contribuinte, ele
integrará - ao lado de Lula; do presidente do PT, Rui Falcão; do
ex-ministro da Comunicação Franklin Martins; e do marqueteiro João
Santana - o politburo do comitê Dilma-14. Já o novo ministro da Saúde,
ex-secretário do setor em São Bernardo do Campo, Arthur Chioro, foi
escolhido para pôr a pasta a serviço não só da presidente, mas,
sobretudo, do antecessor Alexandre Padilha, candidato ao governo
paulista. Para o PT essa disputa é quase tão crucial quanto a da
Presidência. Na campanha, quando Lula não estiver desfilando com a
afilhada, estará cabalando votos para o "poste" da atual temporada.
Das mudanças já anunciadas no Gabinete, nenhuma deixa tão escancarada
a decisão de degradá-lo em Ministério da Reeleição como a troca, na
Secretaria de Comunicação Social (Secom), da titular Helena Chagas pelo
também jornalista Thomas Traumann, porta-voz de Dilma desde 2012 e chefe
do chamado "gabinete digital" do Planalto, responsável pelo blog da
presidente e suas manifestações no Twitter e Facebook. Ele caiu nas boas
graças de Dilma quando acionou as redes sociais para o governo
responder às jornadas de junho. À parte seus presumíveis méritos, ele
foi escolhido para subordinar a comunicação da Presidência às exigências
da campanha.
Quem o indicou, sintomaticamente, foi o já citado Franklin Martins.
Ministro de Estado, Traumann deverá, portanto, abastecer a mídia com as
versões mais convenientes para a vitória de Dilma. Sem esquecer de que a
Secom administra a publicidade do Executivo e das estatais, ao custo
aproximado de R$ 1,9 bilhão.
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