O Bradesco seria uma espécie de banco do povão. Já o Itaú Unibanco, de “dona Neca”, o das elites. Isso passa no marketing?
Carlos Alberto Sardenberg - O Globo
Os líderes chineses têm uma habilidade especial para adotar políticas pró-mercado com uma retórica de esquerda para agradar esse lado do Partido. Vire à direita, dê sinal à esquerda — tal é o ensinamento.
Pois parece que a presidente Dilma está com o mesmo dilema, invertido: como seguir pela esquerda, mas dando sinal à direita?
A campanha foi claramente pela esquerda. Atacou as elites e os ricos, incluídos os empresários que só pensam no lucro, e especialmente os banqueiros, acusados de tirar comida da mesa dos pobres. Demonizou o mercado financeiro.
Também disse que tentar reduzir a inflação para algo como 3% ao ano, ou mesmo para a meta oficial de 4,5%, geraria um desemprego enorme. Ou seja, para ela, quanto menos inflação, mais desemprego.
Também atacou a proposta de controle dos gastos públicos, dizendo que isso também é tirar comida dos pobres, pois comprometeria os programas sociais.
Reeleita, a presidente prometeu diálogo com todos os setores, incluídos empresários, bancos e mercado. Acenou com mudanças na política econômica e confirmou que terá um novo ministro da Fazenda. Entre os nomes citados, que teriam sido até indicados por Lula, há nada menos que dois banqueiros, Henrique Meirelles e Luiz Trabuco.
Meirelles foi presidente mundial do Bank Boston, presidente do Banco Central nos oito anos de governo Lula, com uma gestão claramente ortodoxa e independente, e hoje dirige e participa de conselhos de grandes companhias privadas. É um quadro do capital.
Trabuco é simplesmente o presidente do Bradesco, o segundo maior banco privado nacional, um dos maiores da América Latina.
Nomear qualquer um deles seria para Dilma o dilema chinês: virar à direita, precisando então dar um sinal à esquerda militante que a carregou na campanha. Como nomear um banqueiro e/ou grande executivo privado depois de ter dito que um dos problemas do baixo crescimento do país estava na pouca disposição dos bancos privados de conceder empréstimos e das empresas de investir?
Nunca se pode menosprezar o marketing. Já tem gente dizendo, nos círculos governistas, que Trabuco, por exemplo, não é um banqueiro, mas um bancário — um simples funcionário que fez carreira dentro da instituição. Quem sabe ele tem uma carteirinha de filiado ao sindicato dos bancários?
Ou seja, o Bradesco, embora privado e com o capital em bolsa, seria uma espécie de banco do povão. Já o Itaú Unibanco, de “dona Neca”, assessora de Marina, seria o banco das elites.
Que tal? Passa? Temos alguma chance no marketing?
O problema é que seria preciso mostrar que o Bradesco age no mercado — emprestando, aplicando — pensando no povo, enquanto os outros bancos privados pensariam só em espoliar os clientes.
E aí não dá. O Bradesco age na praça exatamente como o Itaú e como qualquer outro banco privado. Igualzinho. Quer saber de lucro e de valorização de suas ações na Bolsa. Zela pelo seu dinheiro. Para isso Trabuco foi eleito presidente.
E, por falar nisso, Meirelles também caberia na categoria bancário. Afinal, ele entrou no Boston como trainee e lá foi subindo. Mas a esquerda petista nunca acreditou nisso. Passou o tempo do governo Lula tentando derrubar Meirelles. O próprio Mantega tentou mais de uma vez e quase conseguiu emplacar Luiz Gonzaga Belluzo na presidência do BC.
Tudo considerado, Dilma cai no dilema oposto: seguir na esquerda, manter as palavras da campanha, nomear um ministro da Fazenda desse lado, Mercadante, por exemplo, mas com um sinal à direita.
O que querem o mercado, os industriais, os comerciantes, os banqueiros, os investidores, os empresários do setor de serviços e da infraestrutura, mais boa parte da classe média que votou em Aécio? Querem menos inflação, menos juros e mais investimento privado, ou seja, mais crescimento.
Isso exige ajuste fiscal, ou seja, economia no Orçamento, superávit primário maior, gastos contidos. Essa austeridade é condição para segurar a inflação. Quanto maior a austeridade das contas públicas, menor a taxa de juros necessária para derrubar a inflação.
De todo modo, não há como escapar de juros altos por um tempo, mesmo porque muitos preços, represados, precisarão ser elevados (gasolina, diesel, energia elétrica, tarifas de transporte urbano etc.).
Em economia, confiança é essencial. As pessoas precisam acreditar que o governo fará o que diz que vai fazer.
Ora, um ministro da Fazenda vindo da esquerda, um novo Mantega, um Mantega mais esperto, conseguiria dar os sinais à direita?
Dilemas difíceis levam à paralisia. No caso da presidente Dilma, isso seria apenas trocar o ministro e manter tudo como está, dobrando aposta na “nova matriz”, essa de hoje, como disse na campanha.
A campanha foi claramente pela esquerda. Atacou as elites e os ricos, incluídos os empresários que só pensam no lucro, e especialmente os banqueiros, acusados de tirar comida da mesa dos pobres. Demonizou o mercado financeiro.
Também disse que tentar reduzir a inflação para algo como 3% ao ano, ou mesmo para a meta oficial de 4,5%, geraria um desemprego enorme. Ou seja, para ela, quanto menos inflação, mais desemprego.
Também atacou a proposta de controle dos gastos públicos, dizendo que isso também é tirar comida dos pobres, pois comprometeria os programas sociais.
Reeleita, a presidente prometeu diálogo com todos os setores, incluídos empresários, bancos e mercado. Acenou com mudanças na política econômica e confirmou que terá um novo ministro da Fazenda. Entre os nomes citados, que teriam sido até indicados por Lula, há nada menos que dois banqueiros, Henrique Meirelles e Luiz Trabuco.
Meirelles foi presidente mundial do Bank Boston, presidente do Banco Central nos oito anos de governo Lula, com uma gestão claramente ortodoxa e independente, e hoje dirige e participa de conselhos de grandes companhias privadas. É um quadro do capital.
Trabuco é simplesmente o presidente do Bradesco, o segundo maior banco privado nacional, um dos maiores da América Latina.
Nomear qualquer um deles seria para Dilma o dilema chinês: virar à direita, precisando então dar um sinal à esquerda militante que a carregou na campanha. Como nomear um banqueiro e/ou grande executivo privado depois de ter dito que um dos problemas do baixo crescimento do país estava na pouca disposição dos bancos privados de conceder empréstimos e das empresas de investir?
Nunca se pode menosprezar o marketing. Já tem gente dizendo, nos círculos governistas, que Trabuco, por exemplo, não é um banqueiro, mas um bancário — um simples funcionário que fez carreira dentro da instituição. Quem sabe ele tem uma carteirinha de filiado ao sindicato dos bancários?
Ou seja, o Bradesco, embora privado e com o capital em bolsa, seria uma espécie de banco do povão. Já o Itaú Unibanco, de “dona Neca”, assessora de Marina, seria o banco das elites.
Que tal? Passa? Temos alguma chance no marketing?
O problema é que seria preciso mostrar que o Bradesco age no mercado — emprestando, aplicando — pensando no povo, enquanto os outros bancos privados pensariam só em espoliar os clientes.
E aí não dá. O Bradesco age na praça exatamente como o Itaú e como qualquer outro banco privado. Igualzinho. Quer saber de lucro e de valorização de suas ações na Bolsa. Zela pelo seu dinheiro. Para isso Trabuco foi eleito presidente.
E, por falar nisso, Meirelles também caberia na categoria bancário. Afinal, ele entrou no Boston como trainee e lá foi subindo. Mas a esquerda petista nunca acreditou nisso. Passou o tempo do governo Lula tentando derrubar Meirelles. O próprio Mantega tentou mais de uma vez e quase conseguiu emplacar Luiz Gonzaga Belluzo na presidência do BC.
Tudo considerado, Dilma cai no dilema oposto: seguir na esquerda, manter as palavras da campanha, nomear um ministro da Fazenda desse lado, Mercadante, por exemplo, mas com um sinal à direita.
O que querem o mercado, os industriais, os comerciantes, os banqueiros, os investidores, os empresários do setor de serviços e da infraestrutura, mais boa parte da classe média que votou em Aécio? Querem menos inflação, menos juros e mais investimento privado, ou seja, mais crescimento.
Isso exige ajuste fiscal, ou seja, economia no Orçamento, superávit primário maior, gastos contidos. Essa austeridade é condição para segurar a inflação. Quanto maior a austeridade das contas públicas, menor a taxa de juros necessária para derrubar a inflação.
De todo modo, não há como escapar de juros altos por um tempo, mesmo porque muitos preços, represados, precisarão ser elevados (gasolina, diesel, energia elétrica, tarifas de transporte urbano etc.).
Em economia, confiança é essencial. As pessoas precisam acreditar que o governo fará o que diz que vai fazer.
Ora, um ministro da Fazenda vindo da esquerda, um novo Mantega, um Mantega mais esperto, conseguiria dar os sinais à direita?
Dilemas difíceis levam à paralisia. No caso da presidente Dilma, isso seria apenas trocar o ministro e manter tudo como está, dobrando aposta na “nova matriz”, essa de hoje, como disse na campanha.
Nenhum comentário:
Postar um comentário