Sheri Fink - NYT
Daniel Berehulak/The New York Times
Enfermeiro carrega paciente com suspeita de ter contraído ebola em Kakata, na Libéria
Por dias neste mês, as ambulâncias desta unidade de tratamento de ebola
saíram à procura de pacientes, apenas para retornar com um ou dois
casos suspeitos. E muitas vezes, essas pessoas acabavam apresentando
resultado negativo no exame da doença.
"Onde estão os
pacientes?", perguntou um trabalhador de ajuda humanitária em voz alta,
enquanto colegas estranhavam os leitos vazios na unidade de tratamento
do Corpo Médico Internacional aqui em Bong County, na Libéria, que foi
aberta em meados de setembro.Por todo o país, os centros de tratamento, técnicos de laboratório que fazem testes para ebola e autoridades de saúde nacionais e internacionais que tentam monitorar a epidemia notaram um padrão inesperado: há menos pessoas sendo tratadas por ebola do que o previsto.
Até domingo, menos da metade dos 649 leitos por todo o país estavam ocupados, uma mudança surpreendente em um país onde por muito tempo os pacientes eram rejeitados nas unidades de ebola por falta de espaço.
Agora, as entradas nos centros de tratamento estão caindo ou estabilizadas, o número de amostras submetidas aos laboratórios de ebola caiu significativamente e o número de pessoas com resultado positivo nos exames também caiu.
"Os números estão caindo, mas não sabemos o motivo", disse Malin Lager, uma porta-voz de um centro de tratamento da Médicos Sem Fronteiras nos arredores de Monróvia, a capital.
Seu vasto campo de tendas brancas, com capacidade para 253 pacientes, contava com apenas 90 no domingo.
"É cedo demais para celebrar", disse Lager.
País com maior número de doentes
A Libéria há muito é foco da epidemia de ebola, o país com mais casos e mortes pela doença, provocando uma mobilização global. Centenas de leitos foram criados nas últimas semanas, mas agora muitos estão desocupados antes mesmo de qualquer um dos 18 centros de tratamento que estão sendo construídos pelas forças armadas americanas ter sido aberto, deixando muitas autoridades daqui confusas.
Algumas estão debatendo se os alertas terríveis da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a epidemia –que haveria até 10 mil novos casos por semana no Oeste da África em dezembro, cerca de 10 vezes a taxa recentemente informada– foram altamente exagerados.
"As projeções foram baseadas em nada ser feito" para conter a epidemia, disse a embaixadora americana na Libéria, Deborah R. Malac, durante uma visita ao centro de tratamento do Corpo Médico Internacional neste mês. "Entretanto, mais coisas estão acontecendo a cada dia."
Por ora, a maioria das autoridades continua planejando para o pior, de modo a não interferir na crescente resposta internacional, que é vista como fundamental para impedir um ressurgimento. Até mesmo um único enterro não seguro, no qual os enlutados tocam um cadáver altamente contagioso, pode resultar em dezenas de casos.
Os leitos vazios na Libéria ocorrem no contexto de uma campanha intensa de saúde pública para educar a nação sobre os riscos da doença e as formas de combatê-la –de cartazes a outdoors, até mensagens ouvidas quando a população faz uma ligação telefônica.
"A Lonestar Cell se importa com sua saúde. O ebola é real", diz a gravação de uma empresa.
Leitos concentrados na capital
Alguns consideram os desdobramentos mais recentes como uma indicação de que os esforços para combater o vírus, incluindo a abertura de novas unidades de tratamento, estão começando a surtir efeito.
"Nós podemos vê-la diminuindo pouco a pouco", disse o pastor Omalley M. Segbee para sua congregação nos cultos dominicais na Igreja Batista da Graça, na cidade de Gbarnga. "Isso significa que o Senhor está do nosso lado."
Mas como os liberianos já celebraram antes –acreditando que o vírus tinha sido erradicado na primavera, apenas para vê-lo voltar com mais força no verão– há uma hesitação quase universal em considerar a epidemia sob controle. As vizinhas da Libéria, Serra Leoa e Guiné, estão passando por um aumento preocupante de casos nas últimas semanas.
Também há a probabilidade de muitas pessoas morrendo de ebola na Libéria estarem escondidas das autoridades, como ocorreu ao longo da epidemia.
Muitas partes do país não são bem monitoradas, muitos contatos com pacientes de ebola não são rastreados e as autoridades há muito reconheceram que as estatísticas de casos de ebola no Oeste da África são apenas estimativas grosseiras, na melhor das hipóteses.
Os leitos de tratamento e laboratórios na Libéria também estão concentrados na capital. Grandes trechos do país ficam a horas desses centros por estradas ruins, em áreas que carecem de sinal de celular, o motivo para os centros de tratamento que estão sendo construídos distantes de outras instalações de ebola serem considerados tão importantes.
Muitos dos especialistas em monitoramento também estão baseados na capital. Passados meses de crise, as autoridades ainda recordam a si mesmas sobre a necessidade de irem ao restante do país para testar suas suposições sobre a epidemia. Mas mesmo na capital, há suspeita de que muitos pacientes de ebola morreram em casa, deixando grandes lacunas de dados sobre a amplitude da doença.
Anna Halford, uma coordenadora de campo da organização Médicos Sem Fronteiras, disse que a caridade conta com uma ampla rede de membros da comunidade que promovem a conscientização do ebola na capital e arredores.
"Nenhum dos supervisores acredita que tenha ocorrido uma queda significativa de casos", disse.
Na semana passada, para entender melhor se falhas na detecção e rastreamento de casos podem explicar por que o número de pessoas tratadas é tão baixo, a OMS enviou especialistas a distritos distantes do país. Funcionários dos Centros para Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos também foram até as comunidades para tentar obter um melhor entendimento da situação. As conclusões deles são esperadas para os próximos dias.
Enquanto o dr. Samson Arzoaquoi, que chefia a força-tarefa de ebola em Bong County, enfrentava uma estrada de terra acidentada no fim de semana, ele confirmou que a área estava mais tranquila.
"Ainda não é hora de nos alegrarmos", alertou ao público reunido para o início de um programa de conscientização sobre o ebola. "Se começarmos a rir e celebrar, o que acontecerá? Nós voltaremos para o ponto onde estávamos."
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