Reinaldo Azevedo - VEJA
Nesta
segunda-feira, algumas verdades vieram à luz apenas porque o governo já
não consegue escondê-las nas dobras da impostura. O Orçamento de 2016
foi enviado ao Congresso. Nele se prevê um déficit de 0,34% do PIB — ou
R$ 30,5 bilhões. É a confissão de um desastre. Mas não só isso. Nelson
Barbosa, ministro do Planejamento, teve de desmentir a presidente Dilma
Rousseff, com todas as letras e sem subterfúgios. Afirmou: “Não é uma
questão externa, e sim uma questão fiscal que atinge o Brasil hoje”. Ah,
bom!!! A professora Dilma havia nos ensinado que isso tudo era culpa da
crise internacional. Aí as pessoas procuravam a tal crise e não a
encontravam. Mais: perguntavam-se por que a dita-cuja não atinge a
maioria dos países da América Latina.
Enquanto o
governo beijava a lona em Brasília, Michel Temer falava em São Paulo no
Fórum Exame 2015. Disse que é importante que um governo reconheça seus
erros — Dilma ainda não se ajoelhou no milho; ainda está na fase do
talvez… Sabem como é difícil a um esquerdista a genuflexão no altar da
realidade. Admitiu as dificuldades de criar um novo imposto — tese na
qual ele próprio não embarcou — e disse com todas as letras que o país
precisa cortar gastos. Foi aplaudido.
Foi
aplaudido porque, com efeito, é necessário fazer esse corte. Mas por
onde começar? O governo consome nada menos de 75% de sua receita com
programas sociais, aposentadoria e funcionalismo. Boa parte desse
dinheiro se transformou verba carimbada, desembolso obrigatório. Nos 12
anos em que o PT foi hipertrofiando o estado-pai-patrão, não parou um só
minuto para pensar na entrada de receita. O mundo parecia ser uma
festa, e Dilma se atrevia a dar lições de responsabilidade social aos
europeus, como fez em 2012, em seminário realizado na França. Sabem como
é… Da crise Irã-EUA à formulação de um novo e exitoso modelo de
capitalismo social, nada escapou da ambição de Luiz Inácio Lula da
Silva. E aqui chegamos.
Assim, o
país vai fabricar déficit primário por pelo menos três anos seguidos: em
2014, a contabilidade foi maquiada pelas pedaladas criminosas; neste
ano, o buraco já é da ordem de R$ 9 bilhões, e outro de pelo menos R$
30,5 bilhões já está contratado para 2016. Em razão da recessão, que
deve se prolongar no ano que vem — embora o governo preveja um discreto
crescimento de 0,2% —, a arrecadação continuará sofrível.
Ora, sendo
assim, o país tem apenas dois caminhos: ou faz um corte drástico de
gastos, o que até agora não aconteceu, ou aumenta a receita. E essa
segunda alternativa só vira realidade com elevação de impostos, o que
ninguém quer. Mas, vá lá, às vezes, governos precisam fazer o que a
sociedade rejeita em razão de dificuldades objetivas, independentemente
das culpas.
E qual é a
arena em que isso pode ser discutido e pactuado? É a da política. Não se
elevam impostos ou se criam novos sem a anuência do Congresso. Vamos
falar com clareza: Dilma tem condições de ser a líder a convencer as
forças políticas a lhe dar essa licença, ainda que por algum tempo? Ora,
por que o fariam?
Sim, o
governo admitir o déficit não deixa de ter a sua valentia. O ministro do
Planejamento reconhecer que a presidente faltava com a verdade até
anteontem, quando atribuía as dificuldades do país ao cenário
internacional, idem — embora a gente aguarde o “menti, sim” em boca
própria, não é? Mas aonde isso nos leva além de a lugar nenhum?
Dilma
deveria ter a grandeza de reconhecer que seu tempo à frente da
Presidência acabou. As fantasias todas naufragaram. A crise econômica se
casou à crise política, e ambos deram como fruto a mais indesejada das
filhas: a crise de confiança. E a retomada da confiança virou o primeiro
e necessário passo para que a gente saia do buraco.
Nesta
segunda, Nelson Barbosa admitiu que o país começa a se recuperar só em
2017. É muito tempo para a Presidência da República ser ocupada pelo
vazio.
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