Reinaldo Azevedo - VEJA
Abílio
Diniz é, sem dúvida, um empresário admirável e não se cansa de dar
mostras disso. Antes que se espalhasse a versão de que perdeu o Pão de
Açúcar, ele já presidia o conselho da BRF e era sócio do Carrefour. Tem o
seu jeito de fazer as coisas, uma crença inabalável no país e
parâmetros gerenciais de altíssima exigência. Mas governar um país, para
o bem e para o mal, é diferente de administrar uma organização
empresarial. E é claro que ele sabe disso. Se fosse fácil tornar o
Brasil tão eficiente como as empresas que ficam sob seu comando, tudo
estaria resolvido: bastaria chamar Diniz. Mas não basta.
Nesta
segunda, o empresário foi um dos palestrantes do Fórum Exame 2015.
Disparou uma frase que dá o que pensar. Afirmou: “Está na hora de os
políticos se entenderem. Tem de jogar em uma sala todos os maiores
políticos desse país, Lula, Michel Temer e Fernando Henrique Cardoso,
trancá-la e não deixar que eles saiam de lá sem um acordo”.
Pois é… A
questão é quem vai conseguir reuni-los nesta cela benigna. Infelizmente,
as coisas não são bem assim. Noto, de saída, que Diniz — que sabe quem é
quem na política — não incluiu Dilma no grupo. FHC estaria lá
representando a oposição; Lula, o PT, e Temer, o PMDB. Ocorre que as
faculdades e licenças da Presidência, neste momento, estão com Dilma
Rousseff.
Os presentes
o aplaudiram quando disse tal frase porque é evidente que a crise
política a todos angustia. Mas sabem também que isso nem sempre é tão
fácil até no mundo empresarial. Como se sabe, caso se prendessem Diniz e
Jean-Charles Naouri, presidente do grupo Casino, numa sala, só abrindo
quando chegassem a um acordo, não morreriam de fome porque a sede mata
primeiro, não é? Também entre empreendedores, há divergências
inconciliáveis. Por que seria diferente na política?
É bem
verdade que, a exemplo do que aconteceu com o Pão de Açúcar, uma
divergência comercial pode ser resolvida com a venda das ações, e cada
um vai procurar o que o faz feliz, como fizeram Diniz e Naouri. Com os
países, não é assim que se dão as coisas.
Chegou a
hora de o empresariado brasileiro perceber que a crise de agora não vai
se resolver com um pacto dos senhores da guerra. Não haverá consenso, e
Diniz e os demais precisam saber disto, que possa unir FHC, Lula e
Temer, que passe pela goela da sociedade.
A crise
fiscal que o país vive é a crise de um modelo; é a crise de uma forma de
entender o papel do estado; é a crise de uma escolha política que
privilegiou os mecanismos de caçar votos e abandonou as exigências
técnicas para que o sistema fosse sustentável.
Com todo o
respeito que tenho ao empresário Abílio Diniz, muitas vezes bem-
sucedido em sua notável trajetória, a sua sugestão é estranha à política
e, se me permite, a um valor essencial: o mérito. Lula não merece
figurar na plêiade de notáveis porque as dificuldades que estão aí dadas
foram paridas em sua mente divinal — Dilma apenas extremou o que já era
ruim e estava condenado ao insucesso.
Não só isso:
Lula foi e é o líder inconteste de um partido político que erigiu um
sistema de administração do estado que não é estranho ao roubo, ao
achaque, à propina, à bandalheira, ao compadrio, aos acertos nada
republicanos. Se a legenda não tivesse feito dessas práticas um método,
teria se corrigido quando o escândalo do mensalão veio à tona.
Ora, não só
não se corrigiu como sabemos que os esquemas coexistiram. Pior: há
personagens que foram protagonistas das duas lambanças. Lula não tem
lições a dar num grupo de notáveis. E a razão é simples: falta a essa
reunião imaginada por Diniz uma personagem essencial, que inexiste nas
empresas: o povo. Elas têm clientes, que são outra coisa. Estes podem
mudar de marca, de supermercado, de serviço quando se desagradam. Mas um
povo não pode — e a esmagadora maioria nem quereria — mudar de país.
A forma que a
democracia inventou para que isso aconteça é a mudança de governo.
Parte da crise que vivemos, Diniz, decorre do fato de que o PT se
preparou, no poder, para impedir a alternância. Ainda hoje, quando Lula
bravateia a sua volta, ele a anuncia como instrumento para impedir que a
oposição vença a eleição. Ora, é claro que é normal um líder partidário
querer ganhar uma disputa, torcendo para que seu adversário seja
derrotado. O que não é normal é esse líder tratar a eventual vitória do
oponente como um retrocesso da democracia.
A reunião
imaginada por Diniz não vai acontecer. Antes que algo assim pudesse se
dar, seria preciso que Dilma e Lula se reunissem e só abandonassem a
sala quando chegassem a um consenso. Afinal, os primeiros sabotadores do
ajuste fiscal e os que verdadeiramente pedem a cabeça de Joaquim Levy
estão no PT e na CUT.
Tenho
tratado amiúde desta questão e quero uma vez mais chamar atenção para
ela: existem atores novos na parada. Existe uma nova consciência se
formando. O PT passou 12 anos atendendo lobbies os mais diversos, desde
que fossem dóceis aos interesses do partido, e instrumentalizando os
movimentos sociais, que chamou de “povo”.
Agora, o
povo de verdade acordou. Aquele que paga a conta. E esse povo quer o PT
fora do poder. Para Lula, na hipótese mais benevolente, sugere a
aposentadoria. Na menos, que fale o Pixuleko.
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