Fôlego curto
Merval Pereira - O Globo
O PMDB, no entanto, ao mais uma vez ceder a seu lado
fisiológico, se coloca como avalista da continuidade do governo e
retira-se, inglório, do campo oposicionista em que parecia estar
alojado, especialmente depois daquela propaganda televisiva em que
defendia que só a verdade liberta.
Mesmo depois de constatar mais uma
vez que o PSD de Kassab pode ser acionado a qualquer momento para
tentar fragilizá-lo, o PMDB prefere o regaço governamental à aventura do
impeachment. Se o fizesse por defender a democracia, vá lá.
Mas
abandona as negociações de bastidores na ilusão de que pode usufruir do
governo mais um pouco, até que se deem as condições naturais para a
troca de guarda na presidência da República. É de seu feitio não
resistir às tentações de momento em vez de pensar no longo prazo.
Aceitando
os sete ministérios, o PMDB convalida a reforma ministerial e dá razão
aos que, na oposição, não o levam a sério para um eventual governo de
coalizão nacional num pós-Dilma.
Dando esse passo, o PMDB reforça os
laços com o PT e dá à presidente Dilma necessariamente um fôlego a mais
para essa difícil travessia, que a qualquer momento pode ser
interrompida, seja pela derrubada de um veto presidencial, seja pela não
aprovação da CPMF, ou então pelas ondas da Operação Lava-Jato que podem
engolfar de uma vez só a cúpula partidária.
Com as novas denúncias
contra Eduardo Cunha, e a confirmação pelo Procurador-Geral da
República de que ele tem, segundo a polícia, suíça, contas não
declaradas naquele país, fica impossível tê-lo no comando da Câmara,
aumentando a imprevisibilidade do quadro político em relação ao PMDB.
Seguindo
os conselhos de seu tutor Lula, a presidente Dilma livrou-se de
Mercadante no Palácio do Planalto e tenta criar um clima mais ameno com o
bom baiano Jacques Wagner. Sem dúvida, conseguiu abrir um espaço de
respiro na semana mesma em que o Tribunal de Contas da União (TCU) deve
começar a examinar o parecer do ministro Antonio Nardes que condena as
contas do último ano do governo Dilma, caminho legal para basear o
pedido de impeachment.
Muitas manobras ainda se seguirão até que o
Congresso se decida a analisar o documento, até mesmo a tentativa, até
agora inútil, de adiar o julgamento das contas no próprio Tribunal.
Revigorada
momentaneamente através de manobras políticas que acabam por
enfraquecê-la no longo prazo, Dilma tenta ganhar tempo, mas a crise
econômica não dá mostras de que arrefecerá.
A testemunha
O
advogado Sergio Mazzillo explica a situação de testemunha em que Lula
se encontrará se o ministro Teori Zavascki autorizar que seja ouvido
pela Polícia Federal, o que já foi admitido pelo Procurador-Geral da
República Rodrigo Janot: “A testemunha, no cível ou no crime, ou em
qualquer processo, ainda que administrativo, dá testemunho sobre o fato
de terceiro, alheio; não comenta, não opina, apenas relata o fato de seu
conhecimento;
- Testemunha é obrigada a dizer a verdade, sob pena de
falso testemunho (Código Penal, artigo 342; Código de Processo Civil,
artigo 415); é bem verdade que, no processo, no inquérito, o falso
testemunho raras vezes é punido, pois existe a possibilidade da
retratação;
- Testemunha é obrigada a responder o que lhe for perguntado; a recusa só se justifica se a testemunha desconhecer o fato;
-
E, lógico, testemunha que não responde à inquirição por, eventualmente,
existir a possibilidade de sua própria incriminação, deixa de ser
testemunha e pode invocar o seu direito ao silêncio, para não
incriminar-se (Constituição, artigo 5º., inciso LXIII; por interpretação
do Supremo Tribunal Federal, pois o texto constitucional refere-se ao “
preso ” ).
Portanto, o compromisso da testemunha para dizer a
verdade, implica, necessariamente, a obrigação de responder o que sabe.
Sabendo a testemunha do fato, mas reconhecendo que se responder poderá
incriminar-se, deve ficar em silêncio. E assumir as consequências de seu
ato: passar a investigado (com direito ao silêncio).
Por certo, a situação da testemunha que se cala para evitar incriminar-se é desconfortável e, certamente, lhe criará problemas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário