terça-feira, 28 de março de 2017

Contradições
Merval Pereira - O Globo
Transformou-se em uma corrida de gato e rato o processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para cassação da chapa Dilma/Temer. O relator Herman Benjamim já comunicou ao presidente do tribunal, ministro Gilmar Mendes, que está pronto seu voto, ao que tudo indica um rigoroso pedido de impugnação da chapa por abuso de poder econômico, baseado em provas irrefutáveis.
Enquanto o relator quer rapidez na decisão, o Palácio do Planalto joga com a possibilidade de o processo se prolongar até depois da primeira semana de maio, para que possa substituir dois dos ministros do TSE. Henrique Neves encerra seu mandato em 16 de abril, e Luciana Lóssio em 5 de maio.
O governo já tem até os nomes de seus substitutos, os advogados Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, o que torna as mudanças no mínimo controversas, já que os novos ministros ficarão sob a suspeita de que entrarão para ajudar o presidente Michel Temer a se livrar da condenação que pode tirá-lo do Palácio do Planalto.
Isso por que, mesmo condenado juntamente com Dilma, ele poderá recorrer ao próprio TSE, e depois ao Supremo Tribunal Federal (STF), ganhando tempo para completar seu mandato-tampão até 2018. Pelo que se sabe, a única chance de Temer se livrar da condenação é separar suas contas das de Dilma Rousseff, pois está provado o abuso de poder econômico na campanha de 2014.
Na sua defesa, o presidente Temer terá que demonstrar que se tratava realmente de um “vice decorativo”, como chegou a afirmar em uma carta chorosa que enviou para a então presidente. Vendo-se em retrospectiva, o tom daquela carta e a autodepreciação nele implícito, podem ser úteis nesse momento em que ele se empenha para se separar da presidente impedida, demonstrando que não apenas não cometeu deslizes como componente da chapa, como não tinha noção dos deslizes que estavam sendo cometidos, “decorativo” que era.
Foi o que o PSDB disse nas suas alegações finais, já que foi um dos autores da ação no TSE para cassação da chapa vencedora na eleição de 2014. A única maneira de os tucanos manterem a ação e, ao mesmo tempo, livrarem o presidente Temer de culpa, já que se tornaram a principal força de apoio político ao novo governo, é a tentativa de separação da chapa:
“Ao cabo da instrução destes processos não se constatou em nenhum momento o envolvimento do segundo representado (Michel Temer) em qualquer prática ilícita. Já em relação à primeira representada (Dilma Rousseff), há comprovação cabal de sua responsabilidade pelos abusos ocorridos”.
De fato, há provas de que o abuso do poder econômico aconteceu com o desvio de verba pública das obras da Petrobras para financiar a campanha, inclusive pagamentos no exterior do marqueteiro João Santana, e até mesmo pagamentos de propinas aos partidos que fizeram parte da coligação da chapa presidencial o PT.
O PSDB se refere especificamente neste ponto ao depoimento do ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht Alexandrino Alencar, segundo quem a empreiteira pagou um total de R$ 7 milhões em dinheiro vivo a três partidos políticos para comprar tempo de TV para a chapa de Dilma-Temer: PCdoB, PDT e PRB.
O presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, um dos mais ativos interlocutores do presidente Michel Temer, está disposto a colocar o processo em votação já na semana que vem, e o julgamento só será interrompido se algum dos ministros pedir vista para se informar melhor. Mesmo assim, os dois ministros que terminam seus mandatos (Henrique Neves e Luciana Lóssio) poderão pedir para antecipar seus votos, garantindo que seus substitutos não votarão no caso.
Fazendo isso, porém, e votando, como se prevê, pela cassação da chapa, estarão marcando uma posição ostensivamente contrária ao presidente da República. Os dois, nomeados pela ex-presidente Dilma, só a salvarão se votarem pela absolvição da chapa, o que favorece Temer.
As contradições são abundantes, e refletem bem o momento atual da política brasileira.

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