Destinos cruzados
Foram carreiras políticas montadas conjuntamente que chegam a um
desfecho trágico para todos. O problema para eles é que não há indícios
de que o sistema Judiciário caminhe para uma direção oposta à de hoje,
como ficou demonstrado no julgamento de quarta-feira do Supremo Tribunal
Federal, cujo plenário apoiou o Procurador-Geral da República, Rodrigo
Janot.
A nova denúncia da PGR contra o presidente Michel Temer aborda dois
objetos: obstrução de justiça e formação de quadrilha, esta última
baseada na investigação da Polícia Federal já apresentada, e reforçada
pela delação premiada do doleiro Lucio Funaro. É também com base nela
que é feita a denúncia de obstrução da Justiça, pois Funaro confirma que
recebeu de Joesley Batista R$ 100 milhões para manter seu silêncio.
Esse é um dos temas do áudio gravado no Jaburu, quando Joesley faz um
relato a Temer de como está tratando de controlar juízes e manter bom
relacionamento com os dois presos com potencial de uma delação premiada,
o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e o doleiro Lucio Funaro.
Nesse diálogo, Joesley ouve do presidente que “é preciso manter isso,
viu”. O empresário confirma “todo mês”, e, embora a gravação esteja
truncada, ele declarou na delação premiada que ouviu do presidente
Michel Temer que era “importante manter” pagamentos mensais a Lúcio
Funaro, apontado como operador do ex-deputado Eduardo Cunha, para
“garantir o silêncio”.
Segundo a Secretaria de Imprensa do Palácio do Planalto, “a frase foi
retirada do real contexto para dar sentido inexistente à fala do
presidente. (...) A frase que antecede a declaração do presidente,
proferida pelo empresário foi: “estou de bem com o Eduardo” – numa
referência ao ex-deputado.
Como se houvesse maneira honesta de estar de bem com um prisioneiro.
Antes, Joesley havia dito ao presidente que zerara todas as dívidas com
Cunha que, mesmo preso, cobrou com insistência. A referência a Funaro
está truncada, mas foi confirmada pela perícia da Polícia Federal. Com
relação ao áudio e às ações da Polícia Federal no episódio, houve
contestações dos advogados na sessão de quarta-feira, mas elas não
deverão ser levadas em conta para a anulação das provas, segundo
especialistas, como advogado criminal Cosmo Ferreira, ex-promotor de
Justiça do Rio.
O advogado Cézar Roberto Bittencourt, patrono de Rodrigo Rocha
Loures, o assessor de Temer flagrado correndo pelas ruas de São Paulo
com uma mala cheia de dinheiro, sustentou a existência de flagrante
preparado, confundindo-o com flagrante esperado.
O primeiro ocorre quando o agente policial leva o autor ao
cometimento do crime, tomando as cautelas para a não consumação do
ilícito. Nessa hipótese, crime não há, nos termos da súmula 145 do
STF:"Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna
impossível a sua consumação".
O caso de Loures é de flagrante esperado, isto é, o agente não foi
provocado a praticar o crime. A polícia, ciente dos preparativos, se
posta para prendê-lo em flagrante ou, numa ação controlada, passa a
acompanhar o desenrolar dos fatos no intuito de colher elementos
informativos. Foi o que se deu com o Loures.
O advogado de Temer, Antonio Mariz, por sua vez, discorreu sobre a
ilicitude da gravação, pois, segundo ele, houve uma interceptação
ambiental sem autorização judicial, e tolhimento do direito
constitucional ao silêncio.
O que ocorreu, no entanto, foi uma gravação clandestina por um dos
interlocutores, interceptação ambiental haveria se a conversa fosse
captada por terceiros, não interlocutores, sendo necessária, neste caso,
autorização judicial para valer como prova.
Não há impedimento legal de gravar-se a própria conversa. Joesley
gravou Temer na busca de um acordo com o Ministério Público Federal,
perseguindo um fim legítimo. O direito constitucional à privacidade não
colhe a conversa entre comparsas sobre a empreitada criminosa.
Nesta hipótese, não incide o direito a não produzir provas contra si.
Situação diversa seria se a gravação fosse obtida por um agente público
no curso de uma investigação. Ao contrário do afirmado por um dos
advogados, Joesley não era agente infiltrado, por não ostentar a
condição de agente policial ou administrativo.
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