Oleksander Turchinov é escolhido para substituir Viktor Yanukovich, deposto após meses de protestos nas ruas
Forças de oposição ao ex-presidente tentam formar governo de unidade até as eleições, antecipadas para maio
DIOGO BERCITO - FSP
O Parlamento ucraniano nomeou ontem Oleksander Turchinov como presidente
interino do país. Ele substitui Viktor Yanukovich, deposto um dia antes
e desde então com paradeiro desconhecido.
DIOGO BERCITO - FSP
É esperado que a nova Promotoria persiga o ex-presidente e aliados próximos devido à repressão das manifestações que levaram a sua queda. A semana passada, com ao menos 82 mortos em Kiev, foi a mais violenta na Ucrânia desde seu desmembramento da União Soviética, em 1991.
É dado início, assim, à construção de uma nova estrutura de poder, desta vez organizada pela oposição. Legisladores já reconfiguraram ministérios, anteciparam eleições e restauraram a Constituição de 2004.
Desaparecido, o ex-presidente Yanukovich afirma ter sido vítima de um golpe de Estado. Sua mansão nos arredores de Kiev está tomada por manifestantes e tornou-se o museu de sua queda.
Apesar dos avanços políticos, o centro da capital permanece tomado por um labirinto de barricadas protegidas por milícias armadas com tacos de beisebol.
Turchinov, o novo presidente, havia sido eleito na véspera como líder do Parlamento. Ele é aliado da opositora Yulia Timoshenko, ex-premiê libertada anteontem à noite após 30 meses de uma prisão considerada injusta e fruto de revanche política de Yanukovich.
O presidente interino ficará no cargo até a realização das eleições presidenciais, que foram antecipadas para 25 de maio.
É esperado que o Parlamento escolha um novo primeiro-ministro para chefiar o governo até o pleito. O nome de Timoshenko é constantemente evocado, mas ela negou ontem ter interesse.
"Sou grata, mas peço que eu não seja considerada para esse cargo", publicou em seu site oficial na internet. Na noite de sua libertação, ela disse ter a intenção de concorrer à Presidência em maio.
O governo interino da Ucrânia, ainda em vias de formação, tem se esforçado para manter a estabilidade do país, em especial diante do cenário de baixíssima confiança de investidores.
As ruas de Kiev estão tomadas por milícias, que exercem o controle de fato, já que ainda é raro ver o policiamento regular, após meses de presença ostensiva. A reportagem da Folha só encontrou policiais nos entornos da capital.
Apesar da ausência do Estado nas ruas, Kiev começou a retomar ontem o seu ritmo. Restaurantes e comércios na praça da Independência, fechados há dias, voltaram a ficar lotados de consumidores.
Será um desafio, porém, liderar a Ucrânia. A oposição no país é dividida em torno de três líderes principais, incluindo o ex-boxeador Vitali Klitschko, e não parece mobilizar a população em torno de nenhum candidato. Nas ruas, a população considera os políticos pouco confiáveis.
Não há, ainda, consenso no país a respeito do futuro político. Ontem, foram realizados protestos pró-Yanukovich em cidades mais próximas à Rússia.
Também será essencial observar a reação internacional à transição política ucraniana. Os russos têm intenso interesse no país, em especial na península da Crimeia, onde mantêm presença naval.
As manifestações foram iniciadas em novembro como repúdio à recusa de Yanukovich em assinar um acordo aproximando-se da União Europeia. Ele preferiu a aliada Rússia, desagradando a população. O ciclo repressivo ajudou a inflamar os protestos.
Reação russa preocupa líderes ocidentais
FSPEm mensagem à nação, o presidente interino da Ucrânia, Oleksander Turchinov, afirmou que "reconhece a importância das relações com a Rússia" e está "pronto para dialogar e construir laços com o país de uma nova forma, em igualdade de condições".
O discurso engrossa a preocupação de líderes ocidentais com a reação da Rússia, que viu, em poucas horas, seu aliado Viktor Yanukovich desaparecer e ser deposto pelo Parlamento anteontem.
Além disso, o novo líder ucraniano reiterou como prioridade o retorno às negociações para a integração com a Europa --e o consequente afastamento da zona de influência russa.
A preferência de Yanukovich pela aliança com Moscou foi o estopim para os protestos que levaram à sua queda.
Conselheira de Segurança Nacional do presidente americano, Barack Obama, Susan Rice manifestou receio sobre a possibilidade de Moscou enviar tropas à Ucrânia. "Isso seria um grave erro", disse. "Não é do interesse da Ucrânia, da Rússia, da Europa ou dos Estados Unidos ver um país dividido", afirmou.
A unidade ucraniana é motivo de apreensão internacional. Teme-se que se acirrem as divisões na Ucrânia entre grupos a favor e contra o país vizinho. Ontem, já foram registrados protestos contra a deposição de Yanukovich.
Em nota, o presidente francês, François Hollande, pediu que prevaleça a união e a integridade territorial no país e reforçou a necessidade de formação de um governo de transição que conduza rapidamente às eleições.
Segundo o jornal britânico "Guardian", a chanceler alemã Angela Merkel telefonou para o presidente russo, Vladimir Putin, para pressioná-lo por uma reação branda.
Putin não fez pronunciamento oficial sobre o assunto ontem, dia em que acontecia na Rússia a cerimônia de encerramento dos Jogos de Inverno de Sochi.
O país, entretanto, convocou seu embaixador em Kiev, capital da Ucrânia, para "consulta" em Moscou.
Diante da situação, a União Europeia é pressionada a assegurar recursos que evitem que a delicada economia ucraniana entre em colapso.
A Ucrânia viu suas reservas em moeda estrangeira caírem, em janeiro, para US$ 17 bilhões (o suficiente apenas para dois meses de importações), enquanto tem uma dívida externa, no curto prazo, de US$ 60 bilhões.
Desse valor, US$ 3 bilhões têm de ser pagos ao FMI (Fundo Monetário Internacional) durante o primeiro semestre.
Depois de rejeitar um acordo com a União Europeia, o país recebeu um pacote de ajuda russo de US$ 15 bilhões. Parte da remessa, porém, foi congelada, com a chance de não ser repassada.
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