sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Corda em casa de enforcado
O Estado de S.Paulo
Durante muitos anos, até 1996 em São Paulo, os campeonatos estaduais de futebol eram precedidos pelo chamado "torneio início", em que os times jogavam todos contra todos em um único dia. As partidas duravam 20 minutos, em dois tempos iguais, menos a finalíssima, que durava uma hora, com um breve intervalo. Se as partidas terminassem sem gols, ganhava quem tivesse conseguido mais escanteios ou levasse a melhor nas cobranças de pênaltis. Desse tira-gosto pouco se podia concluir sobre as chances dos principais contendores na competição que se seguiria. Mas os torcedores saíam satisfeitos com a sequência de micropartidas disputadas com garra.
No que a equiparação tem de válido, não parece ter sido essa a reação predominante do público que se instalou na manhã de anteontem no auditório da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em Brasília, para sabatinar, separadamente, os candidatos efetivos ao governo do País nas eleições deste ano - a presidente Dilma Rousseff, do PT, o senador Aécio Neves, do PSDB, e o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, do PSB. A julgar pelas avaliações transmitidas à imprensa, sob anonimato, cada um dos adversários frustrou a plateia à sua maneira. E de quem mais se esperava - por estar a incumbente em busca de um novo mandato e liderar as pesquisas eleitorais - menos se obteve.
Excedendo-se no tempo de que dispunha, ao longo de 30 minutos de exposição e sabatina propriamente dita, a presidente falou muito - dessa vez não só com a ênfase costumeira, mas com incomum clareza - sobre o que ela considera terem sido as suas realizações, guardando-se de reconhecer pelo menos alguns dos erros pelos quais o empresariado não cessa de criticá-la, e disse quase nada do que de fato interessava aos capitães da indústria: o que mudará no seu presumível segundo período? Prometeu empenhar-se na aprovação do projeto de reforma tributária fatiada, com "forte desoneração", que tramita no Congresso, anunciou genericamente mais investimentos de grande porte e o ingresso da economia em um "ciclo de competitividade produtiva".
Mas foi ao negar que, se vencer em outubro, baixaria um tarifaço para compensar o represamento eleitoreiro dos preços da gasolina e da energia elétrica que ela se deu por inteira, pela enésima vez, à obsessiva e aparentemente fútil tarefa de convencer os ouvintes de que a sua gestão é vítima de um pessimismo orquestrado para sabotar a sua permanência no Planalto. "O que justifica essa hipótese de tarifaço?", perguntou retoricamente. "Significa a determinação de criar expectativas negativas no momento pré-eleitoral (…) para assustar as pessoas e as empresas." Como se fosse a autora de uma Teoria Geral do Pessimismo, culpou esse estado de espírito por "bloquear as realizações" dos agentes econômicos e, como de costume, se dedicou a exorcizá-lo.
Investiu contra as previsões negativas sobre a economia nacional - a "tempestade perfeita" que se abateria sobre o sistema produtivo, o nível de emprego, o custo de vida e o poder aquisitivo da população -, comparando-as aos maus presságios sobre a Copa e às expectativas de racionamento de eletricidade. É de pasmar que ela ou não se deu conta de quem eram os seus ouvintes ou resolveu ir para cima deles e depois afagá-los, numa patética operação de morde e assopra. Pois o pessimismo - mais do que justificado, o que a candidata se recusa a ver, ainda que tenha de enfiar a cabeça na areia - é o sentimento dominante dos condenados a pagar, em lucros cessantes, pelos erros do governo nas diversas esferas da atividade.
Em outras palavras, Dilma não apenas falou, com abandono, de corda em casa de enforcado, mas ainda deixou patente a sua mensagem de que a corda é da melhor qualidade, pronta a suportar qualquer peso. Para compensar, tentou canhestramente perdoar os pecadores do pessimismo: "Não se iludam: nós nos gostamos". Dupla inverdade.
O público não gostou do desempenho geralmente apático de Aécio e desconfia de que Campos - o mais bem avaliado do trio, aplaudido 13 vezes - ou não se elegerá ou não conseguirá cumprir o muito que prometeu. Mas gostou menos ainda de sair convencido de que um novo mandato de Dilma será igual a isso que está aí.

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