Troca de diretores, mudança no modelo de gestão e fim do fisiologismo: saiba o que os candidatos prometem fazer com a maior estatal do país caso vençam
Naiara Infante Bertão - VEJA
Lula e Dilma: depois da descoberta do pré-sal, em 2007, estatal sofreu baques financeiros e de credibilidade
(Ricardo Stuckert/Instituto Lula/VEJA)
Endividada e aparelhada, a empresa deixou de ser a joia da coroa petista e virou a estatal dos panos quentes
VEJA
É com esse pano de fundo pouco animador que o governo que assumir em
2015 terá de trabalhar. O site de VEJA conversou com mais de
vinte empresários, especialistas, políticos do alto escalão dos partidos
e ex-diretores. A expectativa é unânime: não importa quem ganhe nas
urnas, tudo mudará na liderança da estatal. Seja por convicção do novo
presidente ou por pressão pública sobre Dilma, se reeleita. No seio do
PT, a estratégia é executar uma “faxina” na diretoria da estatal, como
forma de apresentar à sociedade alguns bodes expiatórios. Uma das
primeiras baixas deve ser a própria Graça Foster. Se sua saída é dada
como certa caso vençam Marina Silva ou Aécio Neves, a executiva já
afirmou a pessoas próximas que não ficará na Petrobras nem mesmo se
Dilma Rousseff se reeleger. “Está cansada e sob intensa pressão. Só está
esperando as eleições terminarem para sair”, afirmou um político da
alta cúpula petista a quem Graça fez confidências. Os laços — Escolher os diretores da estatal é uma decisão tão política quanto técnica. A par dessa dinâmica, os engenheiros de carreira da empresa que querem chegar à cúpula se apressam em buscar apadrinhamento político. Os senadores Renan Calheiros e Fernando Collor e o ministro Edison Lobão estão entre os padrinhos mais prestimosos. A área de Exploração e Produção é a mais visada, já que representa cerca de 70% do orçamento da companhia. Durante a gestão de José Sergio Gabrielli, a cadeira foi ocupada pelo geólogo petista Guilherme Estrella. Com Graça, o cargo, que era cobiçado pelo PMDB, passou para José Miranda Formigli Filho, homem de confiança da executiva. Também desperta a cobiça das legendas a área de Abastecimento, que até 2012 foi latifúndio de Paulo Roberto Costa, preso no âmbito da Operação Lava Jato. Para seu lugar, Graça nomeou José Carlos Cosenza, cuja indicação foi uma exigência do PMDB. “Tenho mais de 28 anos de Petrobras e nunca vi diretor do alto escalão que não seja ligado politicamente a partidos aliados”, afirma o engenheiro Silvio Sinedino, que representa os funcionários no Conselho de Administração da estatal.
As promessas — A equipe de Aécio aponta que o fisiologismo de praxe estaria com os dias contados na Petrobras, em caso de vitória. “Queremos isolar as indicações políticas e escolher por mérito. Daremos preferência a funcionários da estatal. Mas, se tivermos que contratar um presidente do mercado, faremos isso”, afirma Adriano Pires, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e responsável pela área de petróleo da campanha do candidato tucano. A mesma ideia é defendida pela equipe de Marina Silva, que pretende criar um comitê composto por acadêmicos e especialistas para renovar os quadros de todas as estatais e agências reguladoras. Segundo o tesoureiro da campanha, Bazileu Margarido, os peessebistas preveem um novo modelo de gestão para as estatais baseado em diretrizes de mercado, como meritocracia e eficiência, mas também compromisso ético com o projeto de governo, e não com um grupo político específico. “Permanecerão os que estiverem alinhados”, afirmou, deixando claro que as mudanças seriam implementadas nos primeiros 100 dias de governo.
Em seu programa de governo, Marina não dedicou muitas linhas ao pré-sal, o que foi suficiente para que a artilharia petista disparasse que a ex-senadora deixaria a Petrobras de escanteio. De fato, o programa prevê priorização de investimentos em energias renováveis e diminuição do uso das termelétricas. A palavra pré-sal é citada uma única vez para se referir à transferência dos royalties do petróleo à educação. Marina, contudo, rebateu as críticas afirmando que manterá a estratégia vigente, ao mesmo tempo em que estimulará a geração de energia limpa. "Enquanto essa mentira é alardeada por todos os meios, a Petrobras é destruída pelo seu uso político, apadrinhamento e corrupção”, disse a candidata.
Apesar de não ter publicado um plano de governo detalhado, o PSDB deu algumas sinalizações: o presidente do Conselho não será mais o ministro da Fazenda, e o modelo de partilha do pré-sal terá de ser revisto. Atualmente, a Petrobras tem uma participação de 30% em todos os blocos de exploração. Isso significa que seus investimentos devem ser proporcionais à sua fatia nos consórcios. O problema é que o endividamento de 307 bilhões de reais que a estatal acumula coloca dúvidas sobre sua capacidade financeira de investir. Segundo o presidente do DEM, o senador Agripino Maia, não há como a Petrobras garantir tais aportes se seu caixa estiver sangrando. Por isso, a oposição defende o modelo de concessão. “Esse modelo propiciou autossuficiência à empresa. Já o de partilha pode até ter coisas positivas, mas obriga a Petrobras dispor de um capital que ela não pode garantir que terá”, afirma Maia. Segundo o senador e candidato a vice de Aécio, Aloysio Nunes, tanto a troca de cadeiras quanto a revisão das políticas não seria tarefa demorada, caso os tucanos vencessem. “A empresa tem um quadro muito qualificado, composto por gente que dedica a sua vida a isso. Não teríamos descoberto pré-sal se não fosse por elas. E justamente por isso, quanto antes as mudanças forem feitas, mais rápido a empresa volta a ter resultado”, afirma.
Ficou no ar — Não foram aprofundadas, contudo, discussões sobre a política de conteúdo nacional implementada por Dilma, que prevê que a estatal compre da indústria brasileira mais de 60% de seus insumos. Desde 2011, a Petrobras é submetida à regra. Como a indústria local não tem sido capaz de suprir a demanda, projetos estão em atraso constante, como é o caso da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. “As descobertas dos últimos anos, em especial do pré-sal, elevaram em cinco vezes a demanda da indústria. É muito difícil acompanhar esse ritmo em tão pouco tempo. O que aconteceu foi que a oferta de serviços, produtos e mão de obra nacional não conseguiu acompanhar e as empresas estão com dificuldade de cumprir suas metas”, diz Antônio Guimarães, secretário-executivo do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP). Dilma já afirmou que a política “é uma conquista de seu governo” e que não pretende mudar nada. Aécio e Marina não discorreram sobre o tema.
O debate também ocorre de maneira superficial no âmbito do reajuste do preço da gasolina. Desde 2012 os aumentos do valor do barril no mercado internacional não são integralmente repassados pela Petrobras aos consumidores, num intento do governo de frear o avanço da inflação. Apenas em 2014, o prejuízo da área de Abastecimento, que controla as importações de gasolina, chega a 3 bilhões de reais. A estatal deixou de ganhar 45 bilhões de dólares desde 2012 devido ao congelamento de preços da gasolina, segundo levantamento do CBIE. Os candidatos falam de forma genérica em equiparação com os valores que são praticados lá fora. Mas não detalham se os reajustes seriam feitos de uma só vez ou paulatinamente.
Constrangimento — O clima na empresa tem sido fúnebre desde a prisão de Paulo Roberto Costa. Piorou com a instauração da CPI sobre a compra da refinaria de Pasadena, no Texas. Desde que a reportagem de VEJA revelou o esquema de fraude nos depoimentos da CPI, a atmosfera beira o insuportável. Engenheiros que visitavam a feira Rio Oil & Gas, há duas semanas, no Rio de Janeiro, afirmaram que a constante presença da estatal no noticiário policial transformou seus funcionários em motivo de chacota no setor. O constrangimento é geral e não poupa nenhum escalão.
Em Brasília, contudo, há mais nomes temerosos do que constrangidos. Se os apadrinhados da diretoria estão na corda bamba, os padrinhos também temem possíveis mudanças. Isso não significa que acreditem que qualquer um dos três candidatos tenham cacife para livrar a Petrobras do loteamento. Aliás, olham com certo ceticismo para os discursos de tucanos e 'marineiros' sobre implementar políticas de meritocracia na cúpula da estatal. O que aliados temem é que, diante dos holofotes que se armaram sobre a empresa, a troca de favores fique ainda mais evidente.
Exemplo do fisiologismo comum na capital federal é que se condicione o apoio à votação de projetos no Senado a cargos estratégicos. No ano passado, o presidente do Senado, Renan Calheiros, colocou na pauta o projeto de independência do Banco Central, que o PT é sistematicamente contra. O texto foi engavetado quando o senador conseguiu emplacar um aliado na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Em 2012, quando Paulo Roberto Costa foi demitido por Graça da Petrobras, o PP protagonizou uma mini-rebelião contra o governo na Câmara. Não queria que seu protegido abandonasse a galinha dos ovos de ouro.
Na hipótese de vitória de Dilma, a bancada do PT deve diminuir no ano que vem, de acordo com as mais diversas projeções. Com o PSB na oposição, além do próprio PSDB, o bloco governista vai ser menor. E, inevitavelmente, o preço do apoio de PMDB, PP e PTB vai sair mais caro. O mesmo vale se Aécio ou Marina vencerem. Ou seja: quem entrar terá de inventar algo muito ardiloso para conseguir banir as castas que se alimentam da estatal.
Com reportagem de Gabriel Castro, Luís Lima e Talita Fernandes
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